"DÓi tudo quando se assiste.".Na mesa-de-cabeceira, a par da medicação do filho, jazem os comprimidos que ajudam Lúcia a aparentar a calma que não tem.O rótulo surgiu só há três anos, mas desde há muito que ela temia que algo de estranho se passava com o filho. "Ele sempre quis tudo bem-feitinho, ao ponto de atrapalhar", conta. Pior "Ou ficava perfeito, ou não o fazia." A obsessão pela perfeição degenerou no insucesso escolar e, depois, na incapacidade de se adaptar ao emprego. "Isso traumatizou-o." E afastou-o dos poucos amigos que tinha. Em casa, "é o tormento". Demora cinco horas a tomar banho. "Dói tudo, quando se assiste", desabafa a mãe, o olhar turvo, recordando os dias em que Luís jazia no escuro, com receio de se chegar à janela.."Tenho medo do futuro." Carlos - "não se engane no nome, ninguém pode saber" - conta sem receio a história da sua vida. Dos colegas que o gozavam aos dias que passava deitado, desenhando com o olhar asteriscos no tecto. "Aluno brilhante", não conseguiu mais do que entrar e sair de alguns empregos. "Não gostava do ambiente, não conseguia adaptar-me." Hoje, pensionista na casa dos 30, a terapia ajuda está a estudar inglês e já se sente "melhor". Mas lembra-se ainda de outros tempos: da fase agressiva que passou em casa, das persianas fechadas, do "aí vai o maluquinho" que escutava quando ganhava coragem para sair à rua. Na história que conta, sorrindo, entra um pai que nunca o percebeu e com quem vive paredes meias, sem trocar uma palavra. E entra a mãe, que é tudo. "Tenho medo do futuro. Quando ela morrer, que será de mim? Não quero ficar só neste mundo cão..." E o sorriso esmorece.."os médicos não percebiam." A ansiedade valeu-lhe meses em tratamentos vãos para o estômago. "Os médicos não percebiam." Um dia, "sem saber porquê", apareceu a voz. "A que não vem de fora mas de dentro, sabe?" A toda a hora murmurava-lhe "Mata-a." Sabia que era irreal, chegou a temer ser sobrenatural, mas não podia afastá-la. Lia os jornais e temia "passar-se" e obedecer-lhe. Perdeu o emprego, pensou matar-se. Ao fim de meses de "tormento", ganhou coragem e contou a quem lhe disse tudo: "Estás doente." Hoje, não há voz. Tem obsessões, mas a terapia ajuda-o. Recuperou a auto-estima e o emprego. Se chora é por pensar no que poderia ter sido e não foi. A mensagem, diz, é de esperança: "Se eu consegui, outros o farão.".grandes interesses. Maria tinha cinco a tudo. Se não tivesse 100% nos testes, entrava em depressão. Com o tempo, a obsessão pelas boas notas transformou-se no medo de falhar. Ana, a mãe, conta como "os grandes interesses da filha" contrastam com a dificuldade na vida prática "Só consegue fazer um bife se for dentro de um tacho." Há uns meses, a situação agravou-se, com a entrada na Faculdade de Medicina. O 17 a Estatística fê-la querer desistir de tudo. Passou a "lavar as mãos por tudo e por nada", a limpar tudo onde tocava, a fechar portas com o pé. Rituais que levaram os pais ao desespero e a um pedido de ajuda. Hoje, no início da terapia, Maria já sonha com a car-reira: " Talvez neurociências..."