A magia do top of mind

"Porque é que está toda a gente a querer ir a Portugal?", perguntou-me um velho amigo, presidente de uma das maiores agências de publicidade do mundo, durante um pequeno-almoço no Michael's, na rua 55, em Nova Iorque; um restaurante frequentado por <i>movers</i>, <i>shakers </i>e <i>media celebrities</i>, em Manhattan. "Conheço imensa gente que me diz que foi a Portugal, que fala disso e que contamina outros que estão a planear ir lá", continuou o meu amigo. "Porquê este interesse súbito?"
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Não fazia ideia que havia um interesse súbito por Portugal. Por cá, os ministros e a malta dos negócios, que viaja, gosta de dizer que sim, que a reputação de Portugal mudou e que toda a gente fala. Aqui e ali aparecem rankings de hotéis e cidades, que o pequeno português, complexadamente, dissemina pelas redes sociais. Eu desconfio destes indicadores muito pessoais e pouco científicos, mas a verdade é que, de acordo com o meu amigo, fala-se de Portugal.

Ainda uma semana antes, durante o programa "Expresso da Meia-Noite", a reputação de Portugal tinha sido assunto e eu tinha ensaiado uma explicação, a mesma explicação que dei ao meu amigo. Disse-lhe que era o top of mind, a mais mágica de todas as qualidades comunicacionais. Explico-me:

O top of mind é o indicador da posição de uma marca, ou de um assunto (as marcas são assuntos) na cabeça dos consumidores. É um ranking. Um ranking de notoriedade espontânea. De que marcas de automóveis se lembra? De que países europeus se lembra? De que candidatos às eleições europeias se lembra?

A resposta fornece um ranking. Mais tarde os marketers podem, e devem, investigar as razões pelas quais os assuntos são mais lembrados, mas isso é outro estudo, um estudo dos atributos das marcas. O top of mind é apenas o ranking dos que primeiro vêm à cabeça, dos que são mais vezes lembrados em primeiro lugar. Ora isto consegue-se só por aparecer, só por ser falado.

Durante os últimos três anos a notoriedade de Portugal aumentou de certeza absoluta. Quando, no passado, estudava os atributos da imagem de Portugal, o dado mais relevante era a sua falta de notoriedade. A reputação podia ser isto ou aquilo, mas o principal dado sempre foi a ausência completa de notoriedade e, assim, de qualquer reputação.

Com estes três anos de uma presença mais assídua nos media internacionais, sobretudo por causa da crise da dívida, o nome de Portugal apareceu mais vezes do que era normal. Não admira que os amigos chiques do meu amigo, que vivem em Upstate New York e que leem o FT, o NYT, a Monocle e cia, tenham ficado curiosos. Quando se fala muito de uma coisa, sem se saber bem o que se passa com ela, fica-se curioso, imagina-se. Há mistério naquilo que é mais falado. Portugal foi mais falado. Os jornalistas vieram cá, andaram no 28, foram à rua cor-de-rosa e às tascas. E gostaram. O Obama disse que a América não era Portugal, o que até pode parecer um elogio.

O Tyler Brûlé da Monocle, aquele sr. que escreve uma coluna no FT Weekend sobre os aeroportos que frequenta, depois de ter vindo a Portugal derramar charme perante uma assembleia de adoradores babados, escreveu que muitos dos seus amigos falam e vêm a Portugal e que ele tinha ficado com a sensação de que estava a perder uma grande festa. É uma boa imagem que ilustra o poder do top of mind.

Não se passa aqui nada de verdadeiramente novo ou diferente. A nossa reputação não disparou de repente nas dimensões geradoras de respeito, como a malta governamental apregoa (não houve tempo para isso); nem nos tornámos mais notórios como país de contestatários queimadores de pneus e apedrejadores de montras como as esquerdas da rua sonharam.

Não, apenas fomos mais falados e aparecemos mais vezes nestes últimos três anos: por causa da dívida, por causa do Ronaldo, por causa das ondas gigantes da Nazaré. Pouco mais. E já chega para dar nas vistas.

Não importa se falam bem ou mal, é preciso é que falem. É essa a magia do top of mind.

Publicitário, psicossociólogo e autor

Escreve à sexta-feira

Escreve de acordo com a antiga ortografia

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