13 dezembro 2017 às 00h20

Saldo negativo superior a 700 milhões nos Estaleiros Navais de Viana

Resultados do leilão do aço para dois navios asfalteiros sem impacto nos prejuízos acumulados durante anos na empresa pública

Manuel Carlos Freire

Os Estaleiros Navais de Viana do Castelo (ENVC) vão apresentar resultados líquidos negativos superiores a 700 milhões de euros, quando essa empresa pública estiver formalmente extinta, revelou ao DN o presidente da holding das indústrias de Defesa. João Pedro Martins adiantou que aquele montante traduz os valores acumulados ao longo de vários anos e já não terá impacto no défice.

Responsável também pela liquidação da holding Empordef, João Pedro Martins precisou que as contas finais daquela empresa pública - onde sobressai a dívida de quase 208 milhões de euros à empresa-mãe - em 31 de dezembro ainda estão dependentes da conclusão de alguns dossiês, como o do leilão do aço adquirido para a construção de dois navios asfalteiros destinados à Venezuela.

A extinção propriamente dita dos estaleiros já só deve ocorrer nas primeiras semanas do próximo ano, dado existirem ainda vários dossiês (nomeadamente judiciais) por fechar, referiu o presidente da Empordef, quase a concluir os chamados cem dias de graça que marcam o princípio do mandato.

Na próxima segunda-feira, realiza-se o leilão do aço e existe a expectativa de obter uma verba superior a cinco milhões de euros pela dezena e meia de toneladas de aço, o que constitui um valor residual no saldo da atividade daquela empresa fundada em 1944 e nacionalizada em 1975.

O leilão, a realizar desta vez em Lisboa (nas instalações da Polícia Municipal) e não em Viana do Castelo, envolve 15 700 toneladas de aço que já foram à praça há algumas semanas e sem sucesso, até porque os valores propostos pelos potenciais compradores eram abaixo do valor inicial indicado.

Ao contrário desse primeiro leilão, em que as 15 700 toneladas estavam divididas em 31 lotes e foram objeto de apenas quatro propostas, "as indicações agora são boas", referiu João Pedro Martins, de quem o ministro da Defesa disse há dias no Parlamento que estava a fazer algo inédito num processo que se arrasta há muito: "Pela primeira vez está a ser feito o trabalho de desagregar as diferentes folhas de aço para ver qual é a sua qualidade e qual é o seu valor de mercado", evitando alienar esse material pelo preço de sucata e que justificou a suspensão do processo de alienação desse material.

"Estamos em liquidação mas não em saldos", declarou ao DN o presidente da Empordef, a holding das indústrias de Defesa cuja extinção já ultrapassou os prazos legais e deverá ficar concluída até julho de 2018 (quando termina o prazo máximo de mais um ano que a lei permite após os primeiros 24 meses). "Não vai ser fácil extingui-la até ao fim do ano", reconheceu o seu responsável, que já pediu uma nova prorrogação do prazo para esse efeito.

A verdade é que continua por conhecer a solução jurídica - uma nova resolução do Conselho de Ministros? - que o governo vai apresentar para prolongar novamente o prazo de extinção da Empordef.

João Pedro Martins explicou que o trabalho de desagregação das folhas de aço correspondeu a uma "nova organização" dos lotes a leiloar. Isso "permite ter novos compradores" oriundos de setores que não apenas a construção naval, pois os 31 lotes iniciais daquele aço vão agora ao mercado subdivididos em 140 (129 de placas e 11 em perfis) e em função da sua qualidade e respetiva espessura (entre os 5 e os 50 milímetros).

Acresce que os lotes correspondentes às várias espessuras definidas (5 a 12 mm, 13 a 18 e 19 a 50) vão ter diferentes preços-base de referência para licitação, todos abaixo dos 400 euros por tonelada e do que é atualmente o valor do aço à venda a retalho (mais de 500 euros), assinalou.

Além daqueles dois indicadores, o Estado baseia também as suas expectativas sobre um bom resultado no leilão da próxima segunda-feira no facto de uma empresa de um mercado emergente - que o líder da Empordef se escusou a identificar quando questionado sobre isso - ter querido adquirir o aço todo e pagando à vista. A recusa dessa oferta decorreu do quadro legal vigente, observou João Pedro Martins.

A garantia dada pelos testes realizados pela Lloyds à qualidade do aço disponível (que detetou níveis de oxidação reduzida à superfície das folhas), a certificação feita por duas empresas independentes e a subida do preço desse material nos mercados internacionais são outros dados em que assenta a expectativa positiva num bom resultado do leilão, admitiu ainda o presidente da Empordef.

Em termos de indústria de construção, manutenção e reparação naval, o Estado vai ficar reduzido às participações na Arsenal do Alfeite (100%) e na Naval Rocha (45%), ambas localizadas no rio Tejo (uma no Alfeite e a segunda em Alcântara). No primeiro caso, a atividade de construção está a ser retomada através do contrato de duas lanchas salva-vidas para a Autoridade Marítima.

Quanto à Naval Rocha, recorde-se que a Empordef começou em 2004 a tentar adquirir a totalidade da empresa mas os acionistas privados - o grupo ETE (35%) e a Lisnave (20%) - não quiseram vender as respetivas participações. O objetivo era complementar a atividade dos dois estaleiros e destes com o de Viana.

Notícia corrigida às 10:20, no penúltimo parágrafo, pois as lanchas salva-vidas destinam-se à Autoridade Marítima e não à Marinha