19 ABR 2021
18 abril 2021 às 22h16

Rio impôs candidatos a Castelo Branco e Leiria. Bases descontentes

Nas duas capitais de distrito o líder do PSD não respeitou as escolhas das estruturas locais. Os resultados que o partido conseguir nas urnas serão imputados à direção nacional.

Em duas capitais de distrito, Leiria e Castelo Branco, as estruturas locais do PSD deram claros sinais de desconforto com as escolhas de Rui Rio para a corrida às autárquicas e imputam os resultados de outubro à direção nacional do partido.

"Saber estar e romper a tempo, correr os riscos da adesão e da renúncia, pôr a sinceridade das posições acima dos jogos pessoais, isso é política que vale a pena". A frase de Francisco Sá Carneiro é de junho de 1974, retirada de uma entrevista ao DN, mas para mais de 130 militantes e simpatizantes do PSD de Leiria mantém-se atual. E sintetiza o que pensam da candidatura de Álvaro Madureira à Câmara daquela cidade, aprovada pela comissão nacional ao cabo de um processo conturbado.

No início do ano, Rui Rio fez saber que chamara a si o processo, à semelhança do que aconteceu com outros municípios do país que o PSD identificara como pontos-chave para recuperar. O DN sabe que foram convidadas várias figuras (do partido e de fora dele), de âmbito nacional, mas nenhuma delas aceitou encabeçar a lista. Entretanto, chegou a ser dado como certo o médico Hélder Roque, ex-administrador do Centro Hospitalar de Leiria, que nos anos 90 foi vereador pelo PSD, e mais tarde candidato à Câmara como independente. Mas também esse acabou por recusar liderar a candidatura.

Em fevereiro, à medida que o tempo corria sem que fosse conhecido o candidato, e temendo este desfecho, um grupo de meia centena de militantes dirigiu uma carta aberta ao presidente do partido, sublinhando a "irrelevância social e eleitoral do presidente da Comissão Política e a forma como, ao longo do tempo, garantiu o exercício dos cargos de vereador e de presidente da Comissão Política". Os sociais-democratas acrescentavam que Álvaro Madureira "jamais colocou no centro da sua atividade quer os interesses da população do concelho quer os interesses do PSD", lembrando que "em três eleições autárquicas sucessivas o PSD registou em Leiria os seus piores resultados de sempre ao mesmo tempo que ele garantiu "expressivas" vitórias internas..."

Rui Rio terá recebido a carta, enviada por e-mail, mas nunca respondeu aos militantes em causa. Muitos deles subscrevem agora a "carta à comunidade" enviada à imprensa, subscrita por 132 pessoas.

Também a comissão política distrital contesta a escolha de Álvaro Madureira para candidato à Câmara de Leiria. O presidente sustenta que "não acompanha esta decisão da direção nacional porque não revê no Álvaro Madureira uma candidatura ganhadora à Câmara Municipal de Leiria e isto deriva apenas da análise política que fazemos dos últimos processos autárquicos, em 2013 e 2017, liderados por ele".

Em 2013 Madureira foi o cabeça de lista, e em 2017 "quando a direção nacional vetou o nome dele, a solução encontrada foi ir à procura de alguém que fosse candidato - na altura Fernando Costa - para ele ir em número 2". Rui Rocha recorda que "desde 2013 o PSD tem vindo a perder mandatos, quer na Câmara, quer nas freguesias. Não nos parece que depois dos últimos atos eleitorais o eleitorado do concelho de Leiria se reveja numa proposta liderada pelo presidente da concelhia". Contactado pelo DN, Álvaro Madureira escusou-se a falar sobre a candidatura, remetendo declarações para mais tarde "depois de a apresentar publicamente".

O PSD - que tradicionalmente é o partido mais votado no distrito de Leiria, nomeadamente em eleições legislativas - perdeu a Câmara de Leiria em 2009, para o PS, numa candidatura então encabeçada por Raul Castro, derrotando Isabel Damasceno, a atual presidente da Comissão de Coordenação da Região Centro. Castro acabou por deixar a Câmara há pouco mais de um ano, para assumir o lugar de deputado na Assembleia da República, e nestas autárquicas vai encabeçar um movimento independente à Câmara da Batalha, onde chegou a ser presidente, pelo CDS. De modo que em Leiria o candidato do PS será Gonçalo Lopes, que assumiu a presidência em sua substituição. Além destes dois candidatos está também anunciado o cabeça de lista do Chega: Luís Paulo Fernandes, presidente da distrital, que em 2017 foi eleito como independente nas listas do PSD para a Assembleia Municipal de... Pedrógão Grande.

A Câmara de Castelo Branco está nas mãos do PS, mas também aqui o PSD quer ganhar terreno. Mas ao contrário da vontade das estruturas locais, que queriam avançar com Carlos Almeida, candidato nas autárquicas de 2017 e vereador, Rio impôs o nome de João Belém, antigo deputado e professor aposentado que foi durante anos membro da distrital e concelhia locais do partido.

"Não tive qualquer tipo de justificação para a escolha", diz ao DN o presidente da Distrital de Castelo Branco do PSD, Luís Santos, que lembra que dos nove nomes propostos para as autarquias do distrito, só o de Carlos Almeida não foi homologado. Assume que "a partir do momento em que o candidato está escolhido, o processo está terminado". Mas adverte: "O resultado de Castelo Branco será assumido pela direção nacional".

Uma cisão dos órgãos locais do partido com a comissão política nacional está a agigantar o processo eleitoral num dos concelhos mais pequenos do país. Castanheira de Pêra voltou ao mapa pelas piores razões, em 2017, quando foi atingida pelo violento incêndio do vizinho Pedrógão Grande. Meses depois, a independente Alda Correia recuperava para o PSD uma Câmara que ao longo dos tempos tem trocado de mãos sistematicamente, sem ser preciso recorrer à limitação de mandatos.

Mas a experiência não correu bem. As relações entre a autarca (eleita com 47% da votação, mesmo que isso signifique apenas 937 votos) e a concelhia do PSD azedaram há muito. De modo que, no mês passado, o partido votou por unanimidade o nome de Luís Oliva para encabeçar a lista à Câmara. Mas na semana passada foi surpreendido com o anúncio, por parte do PSD nacional, do nome de Alda Correia.

"Foi nessa altura que nos demitimos em bloco. Não podemos aceitar isso", diz ao DN João Graça, o presidente demissionário da comissão política concelhia, ao mesmo tempo que justifica as razões da cisão com a autarca: "ela tem tido um afastamento do projeto político que foi apresentado e sufragado".

João Graça dá conta de vários contactos que a concelhia ainda fez com o secretário-geral do partido, José Silvano, mas sem sucesso. Afinal, vingou "a diretiva que o dr. Rui Rio instituiu, dando primazia a todos os presidentes de Câmara que quisessem recandidatar-se". E perante esta "desconsideração" - que de resto é acompanhada pela comissão política distrital de Leiria - os membros da concelhia podem bem fazer parte de uma candidatura independente, que já está a desenhar-se. "A população exige uma alternativa. Posso dizer-lhe que é uma forte possibilidade, até com pessoas de outros espetros políticos", adianta.

paulasa@dn.pt