Bernardo Pires de LimaCoragem, Svetlana TikhanovskayaNão sei se vos tem acontecido o mesmo, mas tenho acompanhado a visita a Portugal de Svetlana Tikhanovskaya, líder da oposição bielorrussa, com uma tremenda admiração. O país vive um endurecimento pós-eleitoral que levou à cadeia mais de trinta mil pessoas, há centenas de presos políticos, tortura prisional, violação de direitos humanos, um aparelho de segurança interna implacável e que condiciona a luta pacífica dos milhares que marcham há meses nas ruas das principais cidades, sob nevões se for preciso.
Bernardo Pires de Lima"Não há soberania no isolamento"Mergulhados no pessimismo, desvalorizamos algumas dinâmicas aceleradas pela pandemia. Uma das mais importantes está no aprofundamento da integração económica e política regional, capaz de funcionar como contraponto às desgarradas aventuras do soberanismo revivalista. Além disto, a pandemia tem consolidado, até ver, importantes dinâmicas que a precederam. Uma delas é a transformação das economias pela via da transição energética mais consentânea com as metas ambientais. Apesar da inflexão dos EUA de Trump, entretanto corrigida por Biden, ninguém com peso nesta discussão abandonou a prioridade climática. Pelo contrário, a pandemia veio expor a urgência da colocação do bem-estar no centro das decisões políticas e da credibilidade das negociações multilaterais. De certa forma, ganhámos espaço para calibrar uma proposta social alargada em detrimento da sofreguidão clássica pelos resultados económicos. É também este ajustamento que está na base dos planos expansionistas de recuperação nos EUA e na União Europeia, isto se alocados no tempo e no modo de forma certeira ao longo desta década. Os empedernidos espíritos soberanistas têm que lidar com isto: foram os passos conjuntos da integração regional que criaram as condições para responder a estes dilemas estruturais.
Bernardo Pires de LimaO debate vital É bom que comecemos a alinhar expectativas. O desanuviamento diplomático proposto por Joe Biden é bem acolhido na Europa, mas ninguém está disponível para agir como se os últimos quatro anos não tivessem existido. Alemanha à cabeça. A recente sondagem do ECFR, feita a 15 mil europeus em 11 Estados, Portugal inclusive, coloca os alemães com a sensibilidade à flor da pele: a desconfiança com os EUA aumentou, será inevitável a predominância da China, o sistema político americano partiu-se, cresceu a vontade em autonomizar estratégias. Ou, como é mais comum dizer-se no léxico da comunidade alemã que faz e conduz a política externa, reforçou-se a ideia da "soberania europeia".
Bernardo Pires de LimaIlusão e realismoA administração Biden tem sido arrumada sem sobressaltos, casos ou atropelos, recorrendo à experiência e à determinação de muitos que serviram presidentes democratas no passado recente. Só esta normalidade já é um feito político, no meio do caos administrativo deixado por Trump e do cerco democrático exposto pela invasão ao Capitólio. Tal como um presidente divisionista arrasta propositadamente multidões para a irreversibilidade da trincheira, também um presidente de perfil oposto tem mais capacidade para pacificar a sociedade, negociar legislação bipartidária, ser um promotor mais construtivo de soluções na frente externa. Se liderar pelo exemplo não é premissa oca, também a liturgia política precisa de dignidade restaurada.
Bernardo Pires de LimaAutonomia estratégica europeiaFoi um semestre pleno de desafios e intensidade política aquele que teve a Alemanha na presidência do Conselho da União Europeia. A pandemia acabou por dramatizar de tal forma o momento europeu que aproximou Berlim e Paris numa ação musculada de retaguarda à Comissão e ao Conselho para fecharem o histórico dispositivo financeiro ao dispor da recuperação económica dos Estados, num misto de dívida contraída pela UE e ajudas a fundo perdido. O investimento e a compra antecipada da vacina alinharam a passada da União na frente sanitária e económica em tempo recorde e com amplitude histórica. O final do ano trouxe a capacidade alemã para a aprovação do orçamento dos próximos sete anos, ultrapassando ameaças de veto, e no movimento compensatório ao esvaziamento da cimeira com a China, através da aprovação de um acordo de princípio com Pequim, centrado na reciprocidade de investimento, após sete anos e 34 rondas de negociação.
ExclusivoJogos sem fronteirasA China na equação transatlânticaA China pode ser o fator imediato de entendimento entre Biden e os republicanos. Mas há sinais de mudanças importantes passada a etapa inicial do mandato. Washington e Bruxelas estão a desenhar uma agenda ambiciosa, com a China no epicentro estratégico. Mais um debate fundamental para Portugal.
Bernardo Pires de LimaA equipa BidenAs recentes nomeações para o núcleo duro de Joe Biden não causam surpresa. São experientes, competentes e representativos das tendências que estão a marcar a política externa americana. Mas é preciso ir um pouco mais fundo e tentar perceber que condições existem para transformar qualidade em eficácia.
Bernardo Pires de LimaA corrida mais louca do mundoCinco grandes fatores distinguem os contextos eleitorais de 2016 e 2020. Apesar de todos favorecerem Joe Biden, a verdade é que, a três dias de uma eleição existencial para a América, a competitividade está ao rubro. Há razões para isso.
Bernardo Pires de LimaO decisivo voto evangélicoAtingidos os 200 mil mortos por covid e com uma ameaça de caos pós-eleitoral, Trump entra nas semanas decisivas da campanha consciente da importância do voto evangélico, sem o qual não será reeleito. O Supremo, Israel e a "educação patriótica" são fundamentais para mobilizá-lo.
ExclusivoBernardo Pires de Lima"Mais 4 anos de Trump podem ser fatais para a Constituição americana"Colunista do DN e comentador na RTP e Antena1, investigador no Instituto Português de Relações Internacionais da Universidade Nova de Lisboa, Bernardo Pires de Lima aproveitou o confinamento para escrever um ensaio em tom otimista contra a ameaça do autoritarismo.
Bernardo Pires de LimaBiden, o federalizador circunstancial Foi uma convenção atípica, mas nem por isso desprovida de foco. Ele não passa nem por políticas públicas que dividam os democratas ou por ressuscitar traumas de primárias passadas. Isso ficará para depois. O que importa é fazer tudo para tirar Trump da Casa Branca. E Joe Biden é, sem entusiasmos de maior, quem conseguiu pragmaticamente coser as várias alas democratas.
Jogos sem fronteirasReencontros europeusA expectativa é tremenda sobre o desfecho deste Conselho Europeu. Permanecem as distâncias políticas, as táticas para consumo interno e os erros estratégicos. Mas há factores que podem contribuir para um entendimento pragmático, sem o qual dificilmente as economias mais frágeis conseguirão aguentar. É o caso de Portugal.
Jogos sem fronteirasPutin no regime das ilusõesVladimir Putin não precisava do referendo, mas quis ser plebiscitado. É de ciclos de legitimidade que procura. Entrámos no terceiro desde 2000, mas a ilusão de poder absoluto é hoje mais clara e os desafios fora de portas muito mais exigentes. E o maior nem se chama Ocidente, mas China.