Semana de Quatro Dias. E se a sexta-feira fosse o novo sábado?

Iniciado no final de 2022, o projeto-piloto Semana de Quatro Dias chegou à segunda fase. Na primeira aderiram 99 empresas de diversos setores. Destas 46 vão avançar para a próxima etapa.

Menos carga horária e novas formas de racionalizar a jornada de trabalho são os desafios colocado pelo projeto-piloto Semana de Quatro Dias, desenvolvido pelo Instituto do Emprego e Formação Profissional, agora prestes a entrar na segunda fase: a de preparação, que decorrerá até maio. A primeira, dedicada à reflexão e esclarecimento das 99 empresas nacionais que se voluntariaram para o efeito, terminou em fevereiro e o primeiro balanço foi apresentado ontem pelo grupo de trabalho dirigido pelo economista Pedro Gomes e pela especialista em Recursos Humanos, Rita Fontinha.

Partindo de três pressupostos fundamentais (ausência de corte de salário, reversibilidade do processo a qualquer momento, caso a empresa o deseje, e prestação de apoio técnico pelo Estado), o programa avançou "num ambiente de ceticismo junto dos parceiros sociais", como recordou Pedro Gomes, já que "em sede de concertação social, nem os sindicatos nem as organizações patronais se mostraram entusiasmados com a ideia". Ainda assim, inscreveram-se 99 empresas de todo o país (metade das quais da grande Lisboa e grande Porto), tendo 46 delas decidido avançar também para as fases seguintes, de preparação e, finalmente, de teste. Esta última realizar-se-á entre junho e novembro e incluirá sessões de resolução de problemas, otimização de processos, inquéritos de avaliação e naturalmente envolvimento dos trabalhadores. "Temos de admitir que este é um projeto disruptivo, o que acarreta sempre muitos problemas e perplexidades", afirmou a propósito Pedro Gomes, que, no entanto, se mostra otimista com a perspetiva de mudar mentalidades.

Em termos de setores de atividade participaram, nesta primeira fase, empresas dedicadas, na sua maioria, à consultoria e à informática, mas também se associaram empresas ligadas à indústria, comércio, construção, educação, saúde e atividades ligadas ao apoio social. Relativamente à dimensão, o tecido empresarial português, constituído na maioria por pequenas e médias empresas, está bem representado: metade das empresas que aderiram ao programa têm menos de 20 trabalhadores. Não obstante, participaram ainda 11 grandes empresas, com mais de 1000 funcionários.

O que este relatório também revela são as motivações de quem se inscreveu no programa: "Quando perguntámos às empresas quais os motivos do interesse na semana de quatro dias, a grande maioria das empresas revelou uma preocupação com os recursos humanos, nomeadamente procurar diminuir o nível de stress entre os trabalhadores (...)". Recorde-se a este propósito que, em fevereiro passado, a Ordem dos Psicólogos divulgou o Relatório do Custo do Stress e dos Problemas de Saúde Psicológica no Trabalho, em Portugal, com dados alarmantes quanto aos elevados custos sociais e individuais dos níveis de burnout entre a população ativa.

Na apresentação do relatório, Miguel Fontes, secretário de Estado do Trabalho, associou a iniciativa à necessidade mais genérica "de colocarmos as pessoas no centro das nossas preocupações, não de uma forma cosmética, mas real, nascida do estabelecimento de uma relação de confiança entre empregados e empregadores." Uma questão que considera fundamental até do ponto de vista económico, já que "Portugal precisa de saber captar talentos nacionais e estrangeiros e isso passa também por proporcionar boas condições de trabalho". Miguel Fontes sublinhou ainda o caráter voluntário de todo este processo. "É um desafio que lançamos à sociedade, sem qualquer caráter impositivo", disse.

Refira-se a título de curiosidade que, das pessoas que iniciaram o contacto com o programa (diretores executivos, administradores, gerentes ou diretores de recursos humanos) 60% eram mulheres, quando se sabe que, no tecido empresarial português, apenas 27% das lideranças são assumidas por mulheres. Esta demonstração de interesse por mais tempo livre não surpreende os responsáveis por este relatório, onde se pode ler: "Isto acontece porque as mulheres sentem muito mais a pressão do tempo. Num inquérito ao uso do tempo em Portugal, 55% das mulheres entre os 25 e os 44 anos consideravam não ter tempo suficiente para fazer tudo o que queriam no dia-a-dia, enquanto apenas 44% dos homens com a mesma idade declarava o mesmo. "

Para além de Portugal já foram desenvolvidos testes similares em países como Irlanda, Espanha, Bélgica e Reino Unido. Neste último caso, findo o período de testes, 92% das empresas envolvidas decidiram adotar a semana de quatro dias como prática corrente.

dnot@dn.pt

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