Sociedade
06 dezembro 2022 às 11h39

Três altos quadros do Ministério da Defesa detidos pela PJ

O ex-diretor de Recursos da Defesa Nacional, Alberto Coelho é o principal visado da investigação titulada pela 1ª secção do DIAP de Lisboa, mas há outros altos quadros envolvidos. Há cinco detidos e foram feitas buscas no Ministério da Defesa. Em causa estão vários ajustes diretos.

Corrupção ativa e passiva, abuso de poder, peculato e participação económica em negócio são imputados pelo Ministério Público a antigos e atuais dirigentes do Ministério da Defesa Nacional (MDN), num investigação que começou há cinco anos e levou esta terça-feira a uma operação da PJ designada "Tempestade Perfeita", que envolveu 200 inspetores.

Segundo o comunicado da PJ, há cinco detidos, 19 arguidos e foram executados 59 mandados de busca, dos quais 29 buscas domiciliárias e 30 buscas não domiciliárias, visando a recolha de elementos probatórios complementares e relacionados com suspeitas de práticas criminosas no exercício de funções públicas, sob investigação.

Os cinco detidos são três dirigentes e ex-dirigentes e dois empresários.

Foram feitas buscas em diversos departamentos do Ministério da Defesa.

Em causa estão ajustes diretos a empresas que, alegadamente, não cumpriram as regras da contratação pública, entre os quais o da empreitada do antigo Hospital Militar de Belém.

O ex-diretor de Recursos da Defesa Nacional, Alberto Coelho, é o principal visado da investigação titulada pela 1ª secção do DIAP de Lisboa e comandada pela procuradora Celestina Morgado.

O inquérito foi instaurado em 2018, mas a suspeita derrapagem da empreitada de requalificação do antigo Hospital Militar de Belém, em 2020, reforçou o processo.

Para transformar o HMB em Centro de Apoio Militar (CAM) para doentes com covid-19 foram gastos 3,2 milhões em ajustes diretos em vez dos 750 mil autorizados.

Este ex-dirigente já tinha sido condenado pelo Tribunal de Contas a pagar uma multa de 15 mil euros por infrações financeiras negligentes neste caso.

Em abril passado, a revista Visão noticiava que Alberto Coelho estava sob investigação, num inquérito que tinha partido de uma denúncia no âmbito do processo de Tancos, sob suspeita de crimes de peculato, participação económica em negócio e corrupção.

A este processo juntou-se o do HMB e ainda, conforme já noticiou o DN, uma terceira denúncia que chegou à Unidade Nacional de Combate à Corrupção (UNCC) da PJ em 2021. Estará fortemente documentada e tem também Alberto Coelho como principal alvo, visando alegados favorecimentos, contratações e compras que levantavam dúvidas. A UNCC partilhou o dossiê com o DIAP que o terá juntado ao inquérito de 2018.

Alberto Coelho, um dos mais antigos quadros do MDN, foi nomeado para as funções na Diretor-Geral de Recursos da Defesa Nacional (DGRDN) - a mais relevante estrutura do Ministério por onde passam todos os contratos de aquisição de bens e serviços - durante o mandato do ministro Aguiar-Branco (Governo PSD/CDS-PP), em janeiro de 2015, cargo que ocupou até fevereiro de 2021, quando já estava sob suspeita.

Este antigo diretor-geral é um conhecido militante do CDS-PP, presidiu ao Conselho de Jurisdição do CDS, cargo que ocupou durante seis anos (até 2021) e fez parte. Em 1980, servira no Estado-Maior General das Forças Armadas (EMGFA) e, em 1992, fora transferido para a Direção-Geral de Pessoal e Infraestruturas do Ministério da Defesa.

Sob pressão do parlamento por causa da controversa derrapagem, o ex-ministro da Defesa João Gomes Cravinho não deixou de defender o seu diretor-geral, destacando que "prestou enormes contributos ao Ministério, que lhe estará sempre grato", classificando-o como "pessoa extremamente qualificada e capaz".

Recorde-se que nessa altura uma auditoria interna do MDN atribuía a Alberto Coelho responsabilidade pela volumosa derrapagem.

Como prova de confiança, Gomes Cravinho validou a nomeação de Alberto Coelho para Presidente do Conselho de Administração da ETI (EMPORDEF - Tecnologias de Informação, S.A), uma empresa do universo da holding IdD Portugal Defence (Indústrias de Defesa), detidas pelo Estado, cargo que ainda ocupou até há poucos meses.

A auditoria do MDN já tinha sido enviada, no início de março de 2021, para o Tribunal de Contas (TdC), mas Cravinho não esperou pela decisão. Aliás, no despacho de envio do relatório fez questão em destacar "a utilidade e valia desta obra (...) evidente e incontestável quer nos serviços de saúde prestado neste quadro de emergência, quer na valorização futura do património da Defesa Nacional".

O CAM-Covid foi desativado passado um ano, mas em dezembro do ano passado foi transformado num centro de acolhimento para 133 refugiados do Afeganistão.

O TdC seguiu a mesma linha de acusação da auditoria do MDN e já este ano condenou Alberto Coelho a pagar uma multa de 15.300 euros por seis infrações financeiras e a responsabilidade pelos os ajustes diretos feitos a três empresas, que o MP junto ao TdC entendeu terem violado as regras da contratação pública, entre outros, por não terem tido autorização hierárquica superior (do Ministro, na altura João Gomes Cravinho), por não estarem documentadas e por extravasarem as competências delegadas no então Diretor-Geral. A pedido do ex-DGRDN a multa está a ser paga em quatro prestações trimestrais até fevereiro de 2023.

O relatório da auditoria da IGDN à empreitada foi integrado, em fevereiro de 2021, no inquérito do MP, a pedido da procuradora Celestina Morgado.

No seu comunicado, a PJ detalha que a ação desenvolveu-se em Lisboa, Porto, Alter do Chão, Almada e Comporta. Designada «Tempestade Perfeita», contou com a colaboração de diversas Unidades Nacionais, Diretorias, Departamentos de Investigação Criminal e Unidade de Informação Financeira, para além do apoio da Unidade de Perícia Tecnológica Informática e da Unidade de Perícia Financeira e Contabilística, da Polícia Judiciária, tendo participado cerca de duzentos (200) investigadores e peritos, para além de um Magistrado Judicial e dois Procuradores da República.