Crianças queimadas saem dos cuidados intensivos

Pais apresentam queixa- -crime por troca de medicamento. Hospital   diz que o ácido usado estava no sítio errado.

As duas crianças que ficaram queimadas na sequência de uma troca de medicamentos no Hospital Garcia de Orta abandonaram ontem a unidade de cuidados intensivos, tendo sido transferidas para a enfermaria do serviço de pediatria. A transferência foi confirmada ao DN ontem ao final do dia por fonte da unidade. "O pediatra entendeu que já não fazia sentido mantê-los lá, porque estão a recuperar muito bem". Os pais, no entanto, garantem que vão apresentar uma queixa-crime devido à negligência.

Na quinta-feira, uma médica do serviço de otorrinolaringologia estava a realizar um exame auditivo quase em simultâneo às duas crianças. No entanto, em vez de administrar um tranquilizante de forma a fazer o exames, trocou a embalagem e usou um medicamento com ácido tricloroacético, que é usado para estancar hemorragias nasais, queimando as veias.

As duas crianças, de 18 meses e três anos, ficaram com queimaduras nos intestinos, mas Simão - o mais velho - ficou ainda com lesões na traqueia, esófago e estômago porque lhe foi administrada parte do remédio por via oral.

Samuel Lima esperava ontem à tarde que o filho saísse dos cuidados intensivos. Disse ao DN que, de acordo com informações dos médicos, "as lesões dos intestinos até estão a evoluir bem, apesar de terem sido semelhantes à da criança de 18 meses. A preocupação agora é o esófago", refere, pouco tempo depois de ter visitado o filho. "Neste momento está a soro e não pode comer, mas também está a receber analgésicos e medicamentos para evitar febre. Noto-o um pouco mole, até porque é uma criança agitada, mas a mudança para a enfermaria também o vai fazer sentir-se mais à vontade".

Apesar de ainda não ter tido tempo, garante que vai apresentar uma queixa-crime. "Vou contactar um advogado na quarta-feira", garante. Queremos denunciar esta situação para que se evitem estes problemas e que outros passem pelo mesmo".

Também João Henriques tenciona apresentar queixa contra o hospital e contra a médica. Hoje deverá ter nas mãos o relatório médico sobre a ocorrência para avançar com um processo-crime contra a especialista de otorrinolaringologia que administrou o medicamento errado. "A médica está cansada de nos pedir desculpa, mas isso não nos serve. O que passou foi muito grave e a médica vai ter de responder por isso", disse João Henriques.

O pai do Pedro, a criança de Corroios que ficou com queimaduras em 14 centímetros de intestino, garante que vai ter "um mês de constante angústia e desespero". É que, segundo a informação fornecida pelos pediatras aos pais da criança, só ao fim de aproximadamente 30 dias vai ser possível apurar se o bebé irá ficar com sequelas. Recorde-se que um primeiro prognóstico admite que a criança venha a ficar com lesões, "mesmo que mínimas", mas é preciso esperar o fim da cicatrização para os médicos fazerem uma avaliação mais precisa.

"Tão pequenino e já sofreu tanto", afirmou com visível tristeza. O Pedro "passou muito mal" entre quinta-feira e sábado, sendo que só ontem esteve mais calmo. O pai falava ao DN depois ter recebido uma notícia animadora, quando ficou a saber que a saída de Pedro da Unidade de Cuidados Intensivos para a pediatria a estava por horas. "É sinal que está melhor".

Fonte do hospital disse ao DN que será feita hoje uma avaliação da situação clínica das crianças "por uma equipa de médicos de áreas como a gastroenterologia. Vamos avaliar as consequências e de que forma vamos continuar a tratar as crianças". No entanto, diz que os meninos estão a evoluir bem e que apenas foram para os cuidados intensivos por precaução, para estarem mais vigiados".

O inquérito interno deverá decorrer até dentro de duas a três semanas, mas a mesma fonte garante que "os dois remédios semelhantes não deviam estar juntos. São usados em situações distintas, por isso nunca se encontram. O que estamos a tentar perceber é como é que o ácido foi parar ao sítio onde estava o calmante", neste caso um frigorífico. "É isso que estamos a analisar. É natural que a médica apenas tenha olhado para o prazo de validade, porque não era suposto o ácido estar ali".

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