Comerciantes de Sacavém de novo atingidos por inundações

Na baixa de Sacavém a maioria das lojas está aberta, mas os clientes de hoje são amigos e vizinhos que trocaram o dia de descanso para ajudar a salvar o que não se perdeu nas inundações de sábado à noite.

O corpo franzino de Raquel não dá sinais de cansaço, apesar de estar há mais de cinco horas a empurrar água para fora do estabelecimento comercial na Praça da Alegria. Entre vassouradas enérgicas, conta que "assim que soube da desgraça quis vir ajudar os amigos".

A menina de onze anos saiu de casa com a mãe ainda não era meio dia. Atravessou a estrada, entrou na Pastelaria Café Shady e deparou-se com um cenário de destruição: "estava tudo inundado e estragado", contou à Lusa.

Dentro da pastelaria, a mãe de Raquel também não para: empurra máquinas, empilha cadeiras, dá "uma ajuda onde é preciso". "Hoje era o meu dia de folga, mas tudo há de arranjar-se. Isto foi de partir o coração", desabafa Maria Teixeira.

Paulo Claudino, 48 anos, veio para Portugal há quatro anos e investiu "tudo o que tinha e o que não tinha" na pastelaria Shady. "Deixei o Brasil sem nada e agora parece que aqui também já não tenho nada", desabafa, olhando para o interior da loja.

"Isto foi tudo muito rápido, nem deu para pensar e agora está tudo destruído", relata o brasileiro, que na véspera fechou o estabelecimento por volta das 19:00.

Pouco depois, a força das águas "rebentou uma das portas e ficou tudo inundado". Ainda tentou salvar algumas coisas, mas percebeu que seria uma tarefa inglória. Às cinco da manhã, a família já estava toda na pastelaria a trabalhar.

Quando Paulo Claudino saiu de casa para ir para o estabelecimento, estava José Sardinha a deitar-se: "Estivemos aqui a trabalhar até às três da manhã", contou à Lusa o proprietário do Café Jardim, onde filhos e genros tentam pôr tudo em ordem.

"Em 1983 ia morrendo aqui dentro e em 2008 a água passou o 31", diz José Sardinha, apontando para o número do seu estabelecimento colocado em cima da porta de entrada.

No sábado, apenas Sardinha estava no restaurante. "Foi uma sorte. Em cinco ou dez minutos tivemos de fugir todos daqui senão ficávamos presos cá dentro".

O comerciante diz já estar preparado para estas "tragédias", por isso, no restaurante as máquinas estão todas em cima de estrados, alguns com um metro de altura: "só o fogão é que está um pouco mais baixo, porque senão a minha mulher não conseguia cozinhar".

Mesmo para quem não tem estabelecimentos comerciais na baixa de Sacavém, inundações como a de sábado são sinónimo de prejuízo. Um pouco mais à frente na rua, um jovem tenta salvar o que restou do carro perante o olhar desalentado da namorada. "Eu bem que dou à chave, mas não acontece nada", anuncia a quem passa. O interior do carro -- estofos, tablier, manetes - está todo coberto por uma espécie de pó branco.

Mas há quem veja uma oportunidade nas inundações. Um grupo de jovens olha entusiasmado para um supermercado esventrado. Uma linha nas paredes indica que a água passou um metro de altura. A força das águas destruiu a porta de entrada e o gradeamento de ferro deixando à vista as prateleiras ainda cheias de produtos.

Dois agentes da PSP mantêm-se de guarda em frente ao supermercado para "garantir que não há pilhagens", explica um dos polícias, olhando para os jovens.

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