Ruralidade é mito. Existe em 'resorts' e turismo rural

A ruralidade em Portugal é um mito que já só existe em "resorts" de luxo ou casas de turismo rural, afirmou à Lusa o geógrafo e investigador português Álvaro Domingues, que lança em março a obra "Vida no Campo".

O livro "é sobre a desruralização. Não lhe chamo urbanização. Desruralização é o processo de desconstrução do sustentáculo da agricultura enquanto suporte económico, a cultura camponesa que está exposta à cultura mundo e a paisagem que muda", explica Álvaro Domingos, autor de "Vida no Campo", o segundo livro de uma trilogia, que vai ser lançado em março na Casa do Conto, no Porto.

Em entrevista à Lusa no âmbito do lançamento da obra, Álvaro Domingues conta que durante as viagens que fez para escrever a primeira obra da trilogia, "A Rua da Estrada", onde por vezes se afastava das áreas intensamente urbanizadas para entrar no campo, começou a aperceber-se da metamorfose da paisagem agrícola.

"A metamorfose de território é impressionante e a dicotomia entre campo e cidade não existe. As ideias de perda da cidade e do campo extremaram dois imaginários: a boa cidade enquanto centro histórico e o campo enquanto aldeia típica. E estas duas coisas podem dar dois belos postais turísticos, mas não são a realidade, são fição", conclui o geógrafo e professor na Faculdade de Arquitetura da Universidade do Porto.

Na "Vida no Campo", um livro com 360 páginas com texto e fotografias, Álvaro Domingues desconstrói a ideia de uma ruralidade portuguesa mítica, asseverando que viver da agricultura tem pouco de romântico e muito de austeridade.

A ficção da ruralidade em Portugal persiste através do "turismo rural" ou através da "criação de resorts", defende o investigador, recordando que apesar dos sinais da ruralidade estarem patentes na paisagem através de espigueiros, casas abandonadas ou sucalcos, todas essas evidências "parecem destroços como quando a maré vaza e ficam os destroços".

"A persistência da ideia da ruralidade portuguesa é uma mitologia potente, mas é fácil desconstruir o mito, porque a produção agrícola em Portugal não chega a três por cento do Produto Interno Bruto", observa o investigador do Centro de Estudos de Arquitetura e Urbanismo, que ambiciona lançar ainda no final de 2012 ou início de 2013 a terceira obra "Volta a Portugal".

"Vai ter cinco capítulos e dois deles já estão prontos", desvendou o autor, revelando que um dos capítulos se vai chamar "A Arte do Campo" e que a prosa "percorre caminhos e encruzilhadas em busca de um Portugal entalado entre a crise, a Europa e a globalização".

A terceira obra de Álvaro Domingues surgiu quando estava a escrever "Vida no Campo" que é, segundo o próprio, "uma metáfora sobre a perda do Portugal rural e um antídoto contra o mau viver pelo despovoamento e abandono".

Álvaro Campos nasceu em Melgaço, em 1959 e além das suas funções docentes na Universidade do Porto e noutras universidades, publica com regularidade sobre temáticas relacionadas com a geografia urbana, o urbanismo e a paisagem, destacando-se "Políticas Urbanas I e Políticas Urbanas II" (2003 e 2011), e "Cidade e Democracia (2006).

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