OE 2018. Só o passado aqueceu um debate sem surpresas
O tempo andou para trás na AR. PSD atirou à cara do ministro Vieira da Silva a sua governação em 2011 e este respondeu com a do PSD-CDS em 2015. Os ânimos exaltaram-se
Foi em torno de um assunto discutido em 2015, uma suposta intenção do governo de então (PSD-CDS, liderado por Passos Coelho) de cortar 600 milhões de euros nas pensões em pagamento, que os ânimos se exaltaram no Parlamento, no segundo e último dia de discussão na generalidade do Orçamento do Estado (OE 2018). Exaltaram-se a ponto de o deputado que conduzia os trabalhos, José Matos Correia, do PSD, ameaçar cortar a palavra ao líder parlamentar do seu partido, Hugo Soares: "Ó senhor deputado, não me obrigue a tirar-lhe a palavra. Comigo acaba aqui."
Tudo começou a seguir à pausa do almoço, quando o deputado do PSD Adão e Silva confrontou o atual ministro da Segurança Social, Vieira da Silva, com o que este fez quando, detendo a mesma pasta, integrava o segundo governo de José Sócrates (2009-2011): "Nós gostamos que haja aumentos de pensões, mas o senhor era ministro quando em 2010 decidiram congelar todas, mesmo as pensões mais baixas."
Vieira da Silva teve a resposta que se previa: ao seu passado, contra argumentou com o passado do governo PSD-CDS, recordando o tal suposto corte de 600 milhões nas despesas da Segurança Social que estava previsto para avançar em 2016, se os dois partidos tivessem conseguido manter-se no poder. E aqui a confusão começou - ou, como se diz no léxico parlamentar, a "vozearia".
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Hugo Soares pede à mesa a parte do Programa de Estabilidade de 2015 em que estaria previsto esse corte. Vieira da Silva responde, sob intensa gritaria das bancadas do PSD e do CDS, que esse corte "foi unânime" nessa altura nos dois partidos de governo, exibindo uma notícia em que Cecília Meireles (então membro do governo, agora deputada do CDS) concordava com o dito corte. Cecília Meireles pede a palavra lê o Programa de Estabilidade de 2015 dizendo que este referia, isso sim, "um impacto positivo na ordem de 600 milhões de euros no sistema de pensões" de medidas que tanto poderiam ser de "redução de despesa ou de acréscimo de receita". Continuam as trocas de palavras e Hugo Soares acusa Vieira da Silva de "desonestidade": "A sua palavra vale zero." José Soeiro, do BE, pede a palavra para denunciar a "degradante excitação do PSD no pós-almoço" e acaba repreendido por Matos Correia ("as suas insinuações não são aceitáveis, senhor deputado"). O CDS distribui aos jornalistas uma notícia de 2010 em que Vieira da Silva elogiava medidas austeritárias do governo que ele próprio integrava (aumento do IVA, cortes salariais na função pública). O ministro encerra a discussão: "Se o PSD pedisse a palavra para dizer que já não defendem o corte das pensões a pagamento, eu retiraria o que disse. Eu já li, e posso voltar a ler, e posso ler quantas citações quiserem, da ex-ministra das Finanças, de dirigentes dos dois partidos, a defender o corte das pensões."
De resto, tudo como previsto. De manhã, o ministro das Finanças, Mário Centeno, fez avisos à esquerda: "As cativações [1156 milhões de euros previstas para 2018] são seguramente um instrumento de gestão orçamental do qual o governo não abdicará." Mas em resposta ao Bloco assegura que "há seguramente um compromisso de crescimento de transparência acrescida" na monitorização dessas cativações. Em resposta ao PSD, Centeno revela que as verbas previstas para a reforma da floresta e do sistema de combate aos fogos é de 90 milhões de euros.
Pelas 19.00 a proposta governamental é votada na generalidade. Aprovada, como se esperava, com os votos do PS, BE, PCP e PEV. PSD e CDS votam contra, PAN abstém-se.
O debate segue na especialidade. Votação final é no dia 27.