"O governo português não tem o poder de sabotar pernil de porco" à Venezuela
Maduro acusou Portugal de ter sabotado o Natal venezuelano. Santos Silva admite ter havido um problema comercial, não político
O Presidente da Venezuela, Nicolás Maduro, acusou ontem Portugal de sabotar a importação de pernil de porco por parte do governo venezuelano, que não cumpriu a promessa de distribuir entre o povo este tradicional alimento de Natal. Uma acusação de que o governo português se demarca.
"O governo português não tem, seguramente, esse poder de sabotar pernil de porco", garantiu o ministro dos Negócios Estrangeiros, Augusto Santos Silva, esta manhã à TSF. "Nós vivemos numa economia de mercado. As exportações competem às empresas", acrescentou, dizendo que iria questionar a embaixada portuguesa na Venezuela acerca deste caso, mas repetindo que "obviamente não há aqui nenhuma interferência política, o governo português não interfere no pernil de porco ".
Horas depois, à margem do 6.º Fórum de Graduados Portugueses no Estrangeiro, em Lisboa, repetiu essa ideia: "O Governo português não exporta pernil de porco, nem para a Venezuela, nem para nenhum país do mundo".
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"Portugal é uma economia de mercado, o governo não participa nas exportações que as empresas portuguesas contratam com empresas estrangeiras e, portanto, não há lugar a nenhuma espécie de interferência política, muito menos a qualquer intento de sabotagem do governo português", insistiu.
Admitiu contudo ter havido "um problema comercial", mas disse dispor já de dados que apontam para que a carne tenha sido de facto exportada tendo falhado possivelmente a sua distribuição na Venezuela.
"No momento, a informação de que disponho é que de facto há contratos de fornecimento de carne de porco portuguesa para a Venezuela. Da parte de empresas portuguesas, esses fornecimentos foram feitos, estão contratualizados, e portanto a questão de saber se a carne de porco foi distribuída ou não na Venezuela diz respeito às autoridades venezuelanas", afirmou.
"No momento, a informação de que disponho é que de facto há contratos de fornecimento de carne de porco portuguesa para a Venezuela. Da parte de empresas portuguesas, esses fornecimentos foram feitos, estão contratualizados, e portanto a questão de saber se a carne de porco foi distribuída ou não na Venezuela diz respeito às autoridades venezuelanas", afirmou.
Santos Silva afastou a possibilidade de chamar o embaixador venezuelano em Lisboa para esclarecimentos, repetindo que a questão não é política.
"Tenho informação bastante para dizer que não há aqui qualquer questão política, qualquer questão político diplomática, muito menos qualquer boicote ou sabotagem da parte das autoridades portuguesas", assegurou.
O pernil de porco é uma tradição no Natal venezuelano. Este ano, perante a falta de alimentos naquele país, o presidente tinha prometido que o pernil não faltaria nas mesas venezuelanas. Só que, incapaz de cumprir a promessa, Nicolás Maduro apontou Portugal como responsável.
"Com a entrega do pernil, fomos sabotados. Um país em particular, Portugal. Porque nós comprámos todo o pernil que havia na Venezuela, mas precisávamos de comprar fora para preencher todas as necessidades e sabotaram-nos a compra do pernil", disse Nicolás Maduro citado pelo jornal venezuelano El Nacional.
"Fiz um plano, que cumprimos, mas sabotaram-nos o pernil. Os barcos que os traziam foram sabotados ", garantiu o Presidente venezuelano, sem nunca concretizar em que consistiriam os alegados atos de sabotagem.
Nicolás Maduro lamentou ainda que alguns países tenham bloqueado as contas bancárias que iriam ser utilizadas para efetuar os pagamentos.
Por outro lado, o vice-presidente do Partido Socialista Unido da Venezuela (PSUV, o partido do Governo), Diosdado Cabello, acusou hoje os portugueses de se terem assustado com os norte-americanos.
"Os portugueses comprometeram-se, os 'gringos' (norte-americanos) assustaram-nos e não mandaram o pernil e estamos em apertos", disse.
Cabello, que é tido como o segundo homem mais forte do chavismo, falava no programa "Com el mazo dando" (a dar com o malho), transmitido pela televisão estatal venezuelana, responsabilizando ainda a "direita" e os EUA pela falta de gasolina no país.
O também membro da Assembleia Constituinte afirmou que a falta de pernil faz parte de uma estratégia da "direita" para que "o povo brigue com o próprio povo".
Diosdado Cabello justificou a falta de gasolina ao bloqueio dos norte-americanos: "Existem componentes que nós (na Venezuela) não produzimos e que quando vamos comprar fora os 'gringos' bloqueiam-nos".
"É um ataque contra o povo da Venezuela", frisou.
Fontes não oficiais dão conta de que pelo menos seis milhões de venezuelanos esperavam ter acesso a pernil a preços subsidiados pelo Estado durante a época festiva do Natal.
Residentes de dois bairros populares de Caracas, La Vega e Antímano, saíram à rua, na noite de quarta-feira, para protestar pela falta de pernil de porco, de alimentos e de gasolina.
* com Lusa
(Atualizada às 11:50 com novas declarações de Augusto Santos Silva)