Emprego científico pode ditar nova aliança PSD/esquerdas

Investigadores. Bloco e PCP agendaram para hoje apreciação parlamentar e defendem abertura dos quadros em vez de contratos a termo. PSD diz que decreto-lei do governo "não serve"

O decreto lei sobre o emprego científico (57/2017) ameaça gerar - depois da questão da TSU - uma nova aproximação do PSD aos partidos mais à esquerda para alterar uma medida do Governo. Bloco de Esquerda e PCP agendaram para hoje a apreciação parlamentar da legislação, que visa transformar as antigas bolsas de investigação em contratos a termo, e o PSD, mesmo não revelando a sua posição final, avisa, pela voz da deputada Nilza de Sena, que o diploma "não serve" e que irá "apresentar as próprias propostas" nesta matéria.

"A posição definitiva do PSD não posso adiantar, porque ainda ouviremos pessoas [esta manhã]", explica ao DN a deputada que, no entanto, não poupa críticas à legislação: "revanchista em relação ao Programa Investigador FCT [Fundação para a Ciência e Tecnologia]", desenvolvido pelo anterior governo, que vai "agravar as condições dos investigadores, nomeadamente com perda de rendimentos", e está a deixar "preocupadíssimos" todos os sindicatos do setor.

O diploma visa substituir as bolsas de pós-doutoramento, que se generalizaram nas universidades e politécnicos nos últimos anos, por contratos de três anos, renováveis por mais três. Mas sindicatos e partidos da esquerda defendem a criação de um sistema de real integração nos quadros.

Algo que, em declarações ao DN, o ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, Manuel Heitor, afirma nunca ter sido o objetivo da medida: "O que nós estamos a atacar é a precariedade associada à figura do bolseiro de pós-doutoramento e esse é que é o combate eleito no âmbito da discussão que houve com os partidos que apoiam o governo", diz, numa aparente crítica implícita à iniciativa parlamentar de PCP e Bloco.

Manuel Heitor defende que "não faz sentido a discussão do tempo indeterminado [dos contratos nesta área], que nunca houve no contexto europeu". E que, por comparação, "a maior parte dos países têm contratos de dois ou três anos, alguns quatro, e nós aumentámos para seis". Ainda assim, rejeita a ideia de que a apreciação parlamentar fragilize o diploma e até considera "positivo que estas matérias sejam discutidas".

Luís Monteiro, do Bloco de Esquerda, lembra que "este é um decreto-lei do Governo, não é do Bloco de Esquerda. É verdade que partilhamos um princípio de combater as bolsas precárias", confirma. Mas isso não significa que concordemos com tudo, nomeadamente com as soluções que são apresentadas", explica. Para o deputado, "a proposta é, na verdade, a criação de uma carreira paralela à investigação científica. E não podemos aceitar isso", avisa, defendendo também que "há investigadores que ficarão com menos valor salarial relativamente àquele que recebem como bolseiros".

"A leitura que fazemos do que está em cima da mesa é que se trata de um carrossel de contratos precários", acrescenta Ana Mesquita, do PCP. "Não nos parece lógico começar um debate e deixá-lo a meio. Se estamos a falar de combater a precariedade temos de ver o percurso todo", avisa. "Daqui a seis anos ou até antes o que acontece a esta gente? Não podem voltar atrás para as bolsas. O País tem uma necessidade tremenda dos seus investigadores e estes precisam de estabilidade".

Refira-se que, tanto Bloco como PCP, afastam a ideia de um chumbo puro e duro do diploma do governo, considerando que existem "condições" para que este seja trabalhado.

Atentos a este debate estão professores e responsáveis das instituições do ensino superior.

Gonçalo Velho, do Sindicato Nacional do Ensino Superior, foi ouvido ontem na comissão de Educação e Ciência e não poupou críticas ao diploma, lembrando, entre outras coisas, que foram anunciadas 500 entradas em 2016/17 mas que até agora só terão aberto 100 concursos. "Para um diploma que supostamente iria concretizar bolsas em contratos, numa média de 750 investigadores por ano, para um total de 3000, estes dados ficam consideravelmente aquém do esperado", ironizou.

António Cunha, reitor da Universidade do Minho e presidente do Conselho de Reitores, considera "muito positiva" a intenção de combater a excessiva precariedade, que atribui às restrições às contratações dos últimos anos e também, pela positiva, "ao crescimento significativo da investigação".

Rejeita ainda a ideia de que os investigadores irão ganhar menos. Aliás, assume, o que preocupa as universidades é a necessidade de salvaguardar "aumentos de dotações" que permitam fazer face a mudanças "de 12 para 14 vencimentos" e encargos com o Estado que poderão "elevar os encargos, em alguns casos, em 50%.

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