01 abril 2018 às 01h07

Bispos fazem na Páscoa campanha contra eutanásia

À medida que se aproxima o momento da discussão e votação parlamentar, a hierarquia da Igreja Católica mobiliza-se - e tenta mobilizar os crentes

João Pedro Henriques

A hierarquia da Igreja Católica portuguesa começa a aquecer os motores para a batalha contra a despenalização da eutanásia. Pelo menos dois prelados - o arcebispo de Braga e um bispo auxiliar do Porto - aproveitaram as homilias da Páscoa para começar a mobilizar os crentes.

A homilia mais direta foi a de D. Jorge Ortiga. O arcebispo de Braga - e ex-presidente da Conferência Episcopal Portuguesa (de 2005 a 2011) - não esteve com meias palavras: começando por dizer que a eutanásia é "aparentemente" um "ato de compaixão", acrescentou logo um "mas". "Se olharmos para os países onde este ato é praticado, descobriremos uma verdade oculta: a eutanásia é também praticada em doentes mentais, assim como em pacientes que sofrem depressão ou ansiedade. Fará sentido? Quais os limites para a eutanásia?"

E prosseguiu, depois de definir a despenalização da eutanásia como a "despenalização do ato de matar um paciente": "A posição da Igreja sobre este assunto é sobejamente conhecida: a vida é, desde o nascimento ao ocaso, algo sagrado e inviolável. Compreendemos o drama de quem se suicida, mas que uma segunda pessoa ajude uma outra a morrer é, simplesmente, matar essa pessoa."

Para o arcebispo de Braga, a "raiz do problema" está no "sofrimento" dos doentes "mas as ferramentas necessárias para curar esta ferida não são um bisturi ou um mero comprimido, mas antes o afeto, a presença, a segurança, a compaixão, a esperança e acompanhamento médico e espiritual". "Pretendemos fazer dos hospitais uma casa da morte ou uma casa da esperança? Pretendemos médicos que garantam o máximo respeito ou o absoluto e incondicional respeito pela vida? Não é mais proveitoso políticas que ajudem os cuidadores, políticas que apoiem as unidades de cuidados continuados e paliativos... políticas educativas que ensinem às crianças o tesouro da vida, da integração e do cuidado dos mais frágeis?"

No mesmo dia, no Porto, D. António Augusto Azevedo, bispo auxiliar, não pronunciava abertamente a expressão eutanásia mas, invocando o exemplo de Cristo, defendia a necessidade de uma morte "sempre digna": "Com inspiração na morte do Redentor, que a morte humana seja sempre digna, entrega amorosa nas mãos do Pai, abertura confiante à vida em plenitude que só Deus pode dar." Ao mesmo tempo alertava: "Então como hoje estão à vista os riscos que constituem para a abertura à verdade quer o autoconvencimento de quem está instalado no seu poder ou o da razão individual como único critério da verdade, quer a irracionalidade das multidões suscetíveis de todas as manipulações."

Em Março de 2016 o Conselho Permanente da Conferência Episcopal Portuguesa emitiu uma nota pastoral onde considerou que um pedido de eutanásia pode muitas decorrer apenas de uma "ideia momentânea" decorrente do sofrimento e da solidão (daí a importância que dá aos cuidadores dos doentes). À ideia de despenalização da morte assistida a hierarquia deu nessa nota uma resposta de categórico "não": "Não pode justificar-se a morte de uma pessoa com o consentimento desta. O homicídio não deixa de ser homicídio por ser consentido pela vítima: a inviolabilidade da vida humana não cessa com o consentimento do seu titular." Até ao final da sessão legislativa (junho/julho) o Parlamento discutirá e votará projetos do PAN, BE e PS que visam a despenalização da eutanásia.