Auxiliares prometidos pelo governo chegam a conta-gotas
Persistência da falta de assistentes operacionais é a principal queixa ao fim dos primeiros três meses de aulas
As expectativas não concretizadas em torno do reforço do pessoal não docente das escolas são o aspeto mais negativo que os diretores apontam ao primeiro período deste ano, com a aprovação de uma portaria com um novo rácio de funcionários por aluno a tardar em traduzir-se na contratação dos prometidos 1500 profissionais.
Filinto Lima, da Associação Nacional de Diretores de Agrupamentos e Escolas Públicas (ANDAEP), considera mesmo esta questão um sintoma do que defende ser um tratamento diferenciado da Educação face a outros setores: "O que prometeu [o primeiro-ministro] António Costa em setembro foram 1500 funcionários a chegarem às escolas neste ano - pelos vistos letivo e não civil - e no outro mais 500", lembra. "Acho que querem cumprir a portaria às pinguinhas e a Educação mais uma vez é o parente pobre do governo", lamenta. "O ministro das Finanças, Mário Centeno, não está a tratar a Educação como trata a Saúde, a Justiça e até a Economia. A sensação que temos é que, para nós, é se sobrar."
Manuel António Pereira, da Associação Nacional de Diretores Escolares (ANDE), subscreve as críticas: "Não me parece que tenha havido contratações associadas à nova portaria. As que têm estado a acontecer têm que ver com situação gritantes de falta de pessoal", diz.
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Este diretor lamenta ainda que os argumentos das escolas não tenham sido mais ouvidos durante a preparação do diploma, considerando que mesmo a aplicação da portaria dos rácios "não irá resolver o problema" da falta de pessoal não docente, porque este praticamente não considerou outras variáveis além do número de alunos de cada agrupamento.
"Um centro escolar com 410 alunos tem direito a 10/11 assistentes operacionais. O mesmo número de alunos distribuídos por 7/8 escolas ou centros escolares dá direito a 12 ou 13", ilustra. "Oito edifícios que abrem às oito da manhã e fecham às seis da tarde têm direito a tantos funcionários como se os alunos estivessem no mesmo edifício", critica. "A portaria não prevê as situações de escolas isoladas."
Flexibilização curricular anima
Mais positiva, da perspetiva dos diretores, é a experiência-piloto da flexibilização curricular, que está a ser aplicada em 230 agrupamentos. "De uma forma geral, está a ser uma experiência estimulante", diz Manuel António Pereira. "Vamos ainda ver como corre. Tenho falado com colegas no sentido de perceber se estão mais ou menos otimistas e sinto que as escolas estão recetivas à experiência", conta. "É claro que há situações que se não forem ultrapassadas... um projeto de flexibilização implica estabilidade do corpo docente, que os professores se mantenham num ciclo nas escolas para que os projetos sejam começados e acabados pelo mesmo professor", lembra. "Mas não há forma de garantir isso."
Pela negativa, em termos pedagógicos, o presidente da ANDE destaca a falta de mudanças nos currículos do 1.º ciclo, com as metas definidas pelo anterior ministro, Nuno Crato, ainda a ditar as regras: "Genericamente, os professores estão todos preocupados porque a carga curricular do 1.º ciclo é brutal", diz. "As escolas sentem necessidade de espaço para trabalhar as competências fundamentais: leitura, escrita, interpretação, e não há tempo para aprofundar. É preciso repensar o primeiro ciclo", alerta.
"No que respeita à autonomia e à flexibilidade estamos a dar os primeiros passos, que são positivos", diz Filinto Lima. "Os professores são pessoas empreendedoras. Ainda é cedo para fazer um balanço, mas o caminho que está a ser percorrido é animador."
Mais inquietante, diz o presidente da ANDAEP, é o possível impacto entre os professores das negociações com governo e sindicatos - retomadas nesta sexta-feira (ver texto ao lado) - sobre a questão da contagem do tempo de serviço congelado para efeitos de progressão na carreira. "Os sindicatos querem que seja contado todo o tempo, e acho que têm razão, mas o primeiro-ministro já disse que o cronómetro está a zeros: neste momento, os professores andam desconfiados", diz, temendo que um eventual choque nas negociações tenha reflexos na vida das escolas. "As negociações vão partir com a corda muito esticada e tenho receio de que a corda quebre, passando para as greves", confessa. "Ninguém quer isso, nem professores, nem diretores, nem governo. Mas eu próprio estou na expectativa para saber como isto irá terminar."