Autarcas e PS contra a reforma das águas ameaçam levar Estado a tribunal

Críticos da proposta do Governo para reformar o sector das águas prometem recorrer à justiça. Objetivo é travar os aumentos das tarifas previstos para os próximos cinco anos no litoral do país.

Os presidentes dos municípios do Grande Porto estão contra a reforma do sector das águas que passa, segundo o Governo, por um "um fortíssimo emagrecimento" do grupo Águas de Portugal, resultando na agregação de 19 empresas regionais em cinco entidades. A reforma, diz o executivo, permitirá reduzir os custos em 2700 milhões de euros.

De acordo com o ministro do Ambiente, Jorge Moreira da Silva, a criação de sistemas multimunicipais de abastecimento de água e saneamento do Norte, Centro Litoral e Lisboa e Vale do Tejo irá promover uma "harmonização tarifária" entre o interior e o litoral. Mas ao JN, o presidente da Câmara Municipal do Porto revelou que os autarcas da região estão dispostos a recorrer ao tribunal para travar a reforma das águas imposta pelo Governo. Isto porque a prevista "harmonização" das tarifas entre litoral e interior levará a uma revisão em alta das tarifas no litoral: os aumentos podem chegar aos 40% em cinco anos.

"Em qualquer modelo, a não ser que se faça por decreto-lei contra a opinião de todos os municípios, para se fazer uma fusão é preciso ter uma maioria qualificada de dois terços", aponta o autarca do Porto, que qualifica a reforma do sector das águas como "um ato do mais profundo centralismo", garantindo que "há um princípio de equidade que não foi garantido". No caso do Grande Porto, os autarcas estão apreensivos com a situação da Águas de Douro e Paiva, em que a Águas de Portugal (o Estado, mais precisamente) detém 51% e os 20 municípios repartem os restantes 49%.

Segundo o ministro do Ambiente, Jorge Moreira da Silva, "as tarifas vão convergir no prazo de cinco anos até chegarmos à tarifa única entre interior e litoral, os cidadãos do interior norte verão reduzida a sua tarifa mensal em três euros, de imediato, e os do litoral norte terão um agravamento gradual ao longo destes cinco anos de trinta cêntimos anuais".

Mas a Câmara de Gaia, por exemplo, fez as contas: estimando os aumentos previstos, calculou que gastará nos cinco anos de subida das tarifas da água mais 7,1 milhões de euros. O aumento dos gastos da câmara com a compra de água, refere o município liderado por Eduardo Vítor Rodrigues, terão necessariamente de repercutir-se nas faturas pagas pelos consumidores. O presidente de Gaia acusa mesmo a reforma do Executivo PSD/CDS-PP de servir apenas para "capitalizar uma empresa que foi descapitalizada, ao longo dos anos, por uma gestão muito questionável", afastando qualquer lógica de solidariedade ou de promoção da coesão. Ao JN, disse que a estratégia do Governo vai "prejudicar claramente o Norte do País" e, tal como Rui Moreira, admite que o recurso ao tribunal está em cima da mesa.

Em comunicado, o autarca da Câmara de Gondomar, Marco Martins, também já sublinhou que "os diversos argumentos que têm sido apresentados como vantagens da fusão não correspondem à verdade ou são incorretos". O presidente da Câmara de Castelo Branco, Luís Correia, por sua vez, diz que a reforma do setor da água diminui o peso dos municípios nos processos de decisão no setor e reduz postos de trabalho no interior. "Para conseguir os objetivos que esta reforma aponta, havia o fundo de equilíbrio tarifário que não punha em causa os sistemas multimunicipais", sustenta Luís Correia.

Críticas a Sul

Mais a Sul, os protestos repetem-se: o presidente da Câmara de Loures, Bernardino Soares, afirmou que a reforma no setor das águas "é inaceitável" e vai "agravar" as tarifas pagas pelos munícipes, admitindo avançar com ações judiciais para tentar travar o processo.

Bernardino Soares acusou a tutela de ignorar a posição dos municípios e alertou para os aumentos nas tarifas da água que se irão verificar na sequência desta reforma. "A subida prevista para os próximos cinco anos é de mais de 14% no caso das águas residuais e de 24% na água para consumo. O que o Governo pretende é abrir o caminho para a privatização", acusou.

O argumento da privatização, no entanto, é rejeitado por Moreira da Silva: o Ministro do Ambiente sublinhou que "o Governo sempre disse que não admitia privatização das águas, mas também não admitia que nada se fizesse".

o PS advertiu o Governo que se irá opor usando todos os meios "parlamentares e judiciais" disponíveis ao diploma aprovado em Conselho de Ministros que cria novos sistemas multimunicipais de abastecimento de água e saneamento. Esta posição foi transmitida à agência Lusa pelo presidente da Federação da Área Urbana de Lisboa (FAUL) do PS, Marcos Perestrello. "O PS/FAUL usará os mecanismos parlamentares e judiciais para travar este esbulho às câmaras municipais e mais este rombo nas algibeiras dos portugueses", declarou o dirigente socialista.

Numa nota enviada à agência Lusa, Marcos Perestrello, também vice-presidente da bancada socialista, considera que a reforma das Águas de Portugal terá como consequência "um grave prejuízo para as pessoas e para as câmaras municipais do distrito de Lisboa".

"Com este sistema, o governo esbulha as câmaras municipais que geriram bem os seus sistemas, integrando o seu património na nova empresa, onde são também integrados os sistemas deficitários em milhões de euros. Às câmaras cumpridoras é retirado património avaliado em dezenas de milhões de euros", acusa Marcos Perestrello.

O presidente da Federação de Coimbra do PS, Pedro Coimbra, falou já esta sexta-feira, para referir que a reforma do Governo no setor das águas é lesiva do interesse público e serve apenas para mascarar a má gestão do grupo Águas de Portugal.

No Centro, a nova Águas do Centro Litoral S.A. resultará da agregação de três sistemas multimunicipais e da fusão de três entidades gestoras - Águas do Mondego, Sistema Multimunicipal de Saneamento da Ria de Aveiro (SIMRIA) e Saneamento Integrado dos Municípios do Lis (SIMLIS).

"É uma péssima decisão a fusão das Águas do Mondego com a SIMRIA e a SIMLIS, porque apesar de todas as circunstâncias a Águas do Mondego tem apresentado rácios económicos e financeiros substancialmente melhores do que as outras duas entidades, que estão altamente deficitárias e endividadas", sublinhou.

Segundo Pedro Coimbra, as decisões tomadas vão ter consequências na vida dos cidadãos, nomeadamente em Coimbra, "onde já é público que as tarifas irão aumentar".

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