"Aqui as identificações não valem nada"

Web Summit. Quando milhares de mentes luminosas se juntam no mesmo espaço, só pode fazer faísca

São sete da tarde e, no interior da Meo Arena, o irlandês Paddy Cosgrave - com a experiência de seis web summits, que entretanto passaram dos 400 para os 53 mil participantes - vai aquecendo o ambiente entre a plateia de empreendedores, investidores e simples entusiastas das novas tecnologias, com um misto de elogios (aparentemente sinceros) a Portugal e a exaltação à diversidade de nações que enchem o pavilhão.

Cá fora, a apanhar ar, aparentemente imune à solenidade tecnológica que decorre, um jornalista inglês queixa-se que as costas o estão "a matar". Quando lhe pergunto se o facto de estar de t-shirt numa noite fria e ventosa, à beira do Tejo, não irá piorar a condição, olha-me com uma expressão de espanto. "Eu sou inglês", lembra. Este tempo para mim está ótimo".

A realidade é uma questão de perspetiva. Chegam dois empreendedores de Leste, com ar VIP, ao segurança da entrada de imprensa, exibem as identificações que trazem ao pescoço, e ele manda-os dar meia volta, sem contemplações. "Aqui as identificações não valem nada. Lá dentro ninguém olha para essa porcaria. O que interessa são as pulseiras, que são quase impossíveis de tirar. Um colar com uma identificação qualquer pessoa pode arranjar".

As "pulseiras", aparentemente, não passam de pedaços de tecido, semelhantes às pulseiras de santos que se vendem no Brasil. Têm de facto umas sólidas fivelas de plástico que custam a abrir. Mas nada mais impressiona nelas. Não têm nada a ver, por exemplo, com as pulseiras "shake on", inventadas por empreendedores holandeses, usadas no evento de 2015, que permitem partilhar informação com um simples aperto de mão. Mas o desprezo pelos tradicionais cartões plastificados com a identificação, ao pescoço, indispensáveis em qualquer outra feira, cimeira ou congresso pelo mundo, é interessante. Porque revela a mentalidade diferente daquelas 53 mil pessoas, de 167 países, que reservaram o seu lugar no evento de três dias.

Quem vem à web summit, sobretudo se é um empreendedor, quer mostrar o seu produto e fazer contactos. Mas há qualquer coisa mais. Um ambiente informal, de comunhão, que cria uma atmosfera mais parecida com a de um concerto ao vivo do que de um evento de negócios.

Dane Swindels, fundador e diretor da Gigpic, está como peixe na água. O produto que lançou há 12 meses encaixa na perfeição no espírito de partilha do envento. É uma aplicação que permite a partilha de imagens, em tempo real, de um determinado evento, que permite até a quem está a participar seguir os acontecimentos de outras perspetivas.

"É uma aplicação de fotografia para eventos ao vivo e festivais. Por exemplo aqui, em plena arena, podemos ver imagens que outras pessoas colocaram na rede", conta o inglês, que teve a ideia quando se apercebeu que, por vezes, os músicos partilhavam imagens dos seus concertos ao vivo, tiradas por espetadores. Dezenas de milhares de pessoas já aderiram à ideia. "Lançámos o produto há menos de 12 meses e já temos utilizadores em todo o mundo. Há muita gente a usá-la na América, na Austrália, e provavelmente também houve pessoas a usá-la hoje na arena".

Carlos Vasconcelos persegue o mesmo sucesso. É um dos responsáveis da Collab, uma startup de software da área dos contact centers, ligada à multinacional portuguesa Novabase, com um novo produto para mostrar: "Estamos a lançar um produto chamado nubitalk que permite a qualquer empresa, PME ou enterprise criar um contact center na nuvem em cinco minutos", conta. "Estamos à procura de investidores, de venture capital, para potenciar o crescimento da Collab, e também obviamente para divulgar a nossa tecnologia ao mundo, mas também estamos aqui para aprender com as experiências dos outros".

Lá dentro, a primeira noite acaba em apoteose, quando Paddy Cosgrave faz questão de "criar um problema de segurança", chamando ao palco 150 empreendedores portugueses presentes na plateia. Confirma-se: é sincero. O guru do empreendedorismo irlandês gosta mesmo de Portugal. E o sentimento parece ser recíproco.

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