Política
02 julho 2022 às 20h01

Montenegro chama opositores de Rio para a direção

O novo líder do PSD "surpreendeu" o partido ao escolher Paulo Rangel e Miguel Pinto Luz para a sua direção. Um sinal de que a "unidade e a coesão" que queria está assegurada para construir uma alternativa ao PS, como o partido lhe pediu no segundo dia do 40.º Congresso, no Porto.

Era o momento mais aguardado, o do anúncio dos nomes que vão protagonizar o novo ciclo do PSD. E Luís Montenegro guardou mesmo a "surpresa" para o 40.º congresso do partido, que decorreu ontem pelo segundo dia no Pavilhão Rosa Mota, no Porto. Por volta das 18.30 desfez as especulações e anunciou aos congressistas que Paulo Rangel e Miguel Pinto Luz, ex-candidatos à liderança do partido e opositores de Rui Rio, integram a direção do partido. Nomes que dão o "selo" da "unidade e "coesão" que o novo líder do partido tanto se esforçou por transmitir neste arranque do seu mandato.

Montenegro viu ainda a sua moção de estratégia global ser aprovado, sem votos contra, e apenas com duas abstenções. Mas neste segundo dia de trabalhos, o brilho do palco não foi para ele, mas para os delegados, sobretudo para os que marcam publicamente a vida do partido.

Miguel Pinto Luz, que falou antes de se saber que iria estar no núcleo duro de Montenegro, foi arrasador para Rui Rio - a quem acusou, sem nomear, de ter colocado o PSD refém do "pensamento único" e de, com isso ter desbaratado os crédito do partido junto dos portugueses.

A promessa de "unidade", mas apenas como "militante de base" partiu também de Jorge Moreira da Silva, que apesar da "simpatia dos convites" de Luís Montenegro, não quis integrar nenhum órgão nacional. E explicou porquê: "Colocaria em causa a integridade" das suas propostas e ideias. Que foram "muito diferentes" das do ex-opositor nas eleições internas.

Partiu dele também um forte ataque ao Executivo de Costa: "No meio da maior crise global dos últimos 70 anos temos um Governo que não sabe para onde vai e está refém dos interesses dos seus membros."

As críticas ao PS e ao Governo - ficará na história como o maior destruidor do Estado social - foram partilhadas pelo militante que teve o discurso mais empolgante da tarde. Carlos Moedas subiu ao púlpito sob palmas e de lá galvanizou os congressistas.

O presidente da Câmara de Lisboa indicou que este Governo "não propõe nada, só pensa na tática. O maior desafio do custo de vida vai aumentar tanto nos próximos anos que os que se preparem vão ser os melhores".

E garantiu: "O PSD tem de estar na solução dos mais pobres e mais desfavorecidos. Temos de baixar os impostos e o dinheiro arrecadado a mais com a inflação tem de voltar para as pessoas."

Usou a sua vitória na autarquia lisboeta para censurar os socialistas. "Vejam o meu exemplo na Câmara de Lisboa que ganhei há oito meses e o PS ainda não acredita, pensa que ainda manda, mas não manda!." Tudo para incentivar o líder, a quem reconhece "fibra" a afirmar-se como alternativa. "Estamos prontos, ou não estamos prontos para mudar este país? Estamos prontos!" - o congresso rendeu-se.

A tónica dos discursos foi precisamente marcada pela ideia de que o PSD tem de a necessidade de reconstruir os laços com a sociedade e afirmar um projeto alternativo ao PS. Foi assim que o eurodeputado Álvaro Amaro se dirigiu a Montenegro: "Disseste que alguém fez tremer as pernas de António Costa, há situações em que se treme e não se cai, mas compete-nos a nós, a todos nós, que ele continue a tremer e na altura certa o façamos cair, seja em 2024 ou em 2026."

265 páginas; citações de Sá Carneiro, Adolfo Soarez, John F. Kennedy, Mota Amaral, Pitágoras, Platão e uma constante: é preciso mudança. As radiografias ao estado do país descritas nas quase 20 moções temáticas - a mais extensa tem 41 páginas, a mais breve apenas quatro - percorrem e detalham problemas e necessidades, apresentam soluções e reivindicações, e não esquecem o PSD que precisa de "mudar por dentro".

De todas as leituras, a da JSD é mais crítica e incisiva... a começar pelos congressos: "Aqueles que eram momentos políticos de discussão e mediatismo transformaram-se em soturnos entroncamentos, despidos de qualquer interesse para o grande público, para a generalidade dos militantes e, tantas vezes, até para os próprios congressistas, apenas animados pela eleição de listas ao Conselho Nacional."

Para a juventude social-democrata é urgente "alterar a atual forma como o PSD elege os seus órgãos nacionais (...) alterar a forma de eleição da liderança do PSD" de modo a que não aconteçam "discursos de oradores para salas muitas vezes despidas (...) mesas a perder de vista, frequentemente ocupadas por cadernos e canetas abandonados, mais congressistas à porta do congresso do que sentados nas cadeiras (...) este é o estado a que os congressos do PSD chegaram".

A solução é, dizem, que haja "eleições diretas primárias para presidente do PSD e direção nacional", o "fim da obrigatoriedade do pagamento de quotas para poder votar na escolha do presidente", que seja sufragada "a equipa ao mesmo tempo que o Presidente" e instituído o "voto eletrónico". O congresso para voltar a ser o que era "deve ser em momento prévio a essa eleição".

Outra "mudança" é "que o PSD procure outro espaço para instalar a sua sede nacional, num lugar mais central da cidade de Lisboa" porque o atual é "pouco apelativo e pouco convidativo a quem deseje entrar em contacto físico com o partido".

De Setúbal chega o lamento de que "infelizmente " o partido "não tem sabido capitalizar" o facto de ter sido "sempre com o PSD que o progresso do distrito se deu". Exemplos? "Ponte Vasco da Gama, Metro Sul do Tejo e o IC32 , a travessia de comboio pela Ponte 25 de Abril, a AUTOEUROPA".

Uma constatação: "O PSD nunca teve um Presidente de Câmara no Distrito", mas " sempre que o PSD teve bons resultados no seu círculo eleitoral, o PSD ganhou essas eleições".

Um lamento: "Dá-nos a ideia que o Partido nunca olhou devidamente para a importância da aposta em Setúbal (...) E aqui há que ser muito claro, com quase um milhão de habitantes o PSD terá de apostar "todas as fichas" no distrito de Setúbal se quiser conquistar o País. De outra forma, o PSD não ganhará o País se não ganhar Setúbal (..) É impossível fazer política séria com trinta mil euros anuais".

O objetivo: ganhar o Montijo em 2025. "Nas últimas eleições autárquicas estivemos a 350 votos de conquistar a nossa primeira Câmara (...) Mantemos o nosso candidato, autarca eleito naturalmente, para o qual se exige toda a ajuda, disponibilidade e meios, para fazer ganhar a autarquia".

Os autarcas social-democratas, cerca de 13 500 - "a âncora que nunca falhou ao partido", entre várias reivindicações dirigidas ao governo, solicitam uma nova lei das finanças locais e um novo estatuto do eleito local. E pedem já, "após o verão", que se inicie "o trabalho preparatório das próximas eleições autárquicas" até porque "no plano teórico, é legítimo admitir que, pelo menos onde o presidente da Câmara Municipal se encontra no último mandato, já existam cogitações e movimentações no sentido da sucessão".

De Beja, o apelo é claro: ter um partido "organizado e unido já em 2024 para disputar a vitória nas eleições europeias, em 2025 presidirmos a Associação Nacional de Municípios e culminar em 2026 numa grande noite eleitoral que vai permitir, soltar o País dos tentáculos do polvo socialista".

Mas também há perguntas para a nova liderança e para os congressistas: "Têm conhecimento a título de exemplo, de quantos quilómetros distam alguns Concelhos, como Odemira, do Hospital Distrital de Beja, percorrendo uma estrada em condições 3.º mundistas e sem rede telemóvel em grande parte do trajeto? 130km. O que tem o nosso partido a dizer sobre a alternativa ao aeroporto da Portela? Que soluções apresenta para o aeroporto internacional de Beja? Ou simplesmente abandonamos as suas potencialidades e desistimos da região como os outros?".

A conclusão é simples e encontra-se resumida nesta frase: "Se o País está ferido, nós, Beja, encontramo-nos no serviço de urgência". "O nosso PSD nunca desistiu de quem mais precisava. Espero que não seja agora", avisam.

A lista de urgências - saúde, habitação, ferrovia, transportes, estradas, etc - é extensa e atravessa os textos das várias moções temáticas.

Leiria, por exemplo, pede a "criação de um regime fiscal que permita beneficiar os trabalhadores que se desloquem dos grandes centros para os concelhos do interior, nomeadamente em sede de IMT, IS e IRS"; os Açores pedem um "aprofundamento da autonomia regional dos Açores e da Madeira, como expressão de uma nova ambição política para Portugal, da construção de uma alternativa política e de afirmação de uma nova liderança no PSD"; Lisboa quer que um "Programa Nacional de Erradicação da Pobreza" seja o "grande desígnio nacional para uma década"; Santarém propõe criar no distrito "uma Silicon Valley na área da agricultura e do desenvolvimento agroalimentar, com forte aposta no agro-tech"; o Porto, centra-se na descentralização e no "corporativismo da ANMP". As reivindicações internas são evidentes: "reclamar a suspensão imediata da transferência de competências nas áreas da Saúde e da Ação Social, até que estejam corrigidas todas as falhas e omissões na área da Educação, delegada, por decreto, no passado a 1 de abril" e "realizar uma Convenção Nacional de Autarcas do PSD para discutir exclusivamente uma tomada de posição política do Partido nesta matéria e que também possa servir para reforçar a ação política da Direção dos ASD e mandatar os autarcas do Partido eleitos para os órgãos da ANMP".

Tópicos: PSD, Política