Política
22 janeiro 2023 às 09h00

Maioria absoluta do PS esfumou-se, PSD também perde, Chega ganha força

Um ano depois das legislativas, o Bloco Central apresenta sinais de desgaste, a Direita deixa a Esquerda a sete pontos de distância, e os liberais multiplicam-se por dois.

Rafael Barbosa

Um ano depois das últimas legislativas, o PS de António Costa voltaria a vencer umas eleições, mas longe da maioria absoluta (27,1%). Não conseguiria sequer liderar uma maioria parlamentar à Esquerda, porque ela desaparece. De acordo com a sondagem da Aximage para o DN, JN e TSF, o PSD de Luís Montenegro não consegue afirmar-se como alternativa (25,1%). A Direita teria primazia, mas à custa do crescimento de Chega (12,9%) e Iniciativa Liberal (9,5%). O BE também recupera, mas pouco (6,6%), enquanto a CDU parece estagnada (4,8%). Livre (3,4%) e PAN (3,1%) deixariam de ser partidos de deputado único. E o CDS ficaria fora do Parlamento.

O exercício é virtual. Uma sondagem é um retrato do momento, sempre com imperfeiçoes. Ainda assim, parece confirmar muitas das leituras que se têm ouvido a comentadores e politólogos, e até ao presidente da República: primeiro, o desgaste do PS, minado pelos escândalos; segundo, a debilidade do PSD como alternativa; terceiro, a polarização que desfaz o centro, premiando os radicais de Direita. Mas vamos por partes.

Quando se compara o que aconteceu há um ano com o que se projeta para este, a primeira conclusão é que os socialistas desbarataram a sua maioria absoluta. Seja pela conjuntura externa (aumento do custo de vida), seja pela sua autofagia (sucessão de escândalos e demissões no governo), a avaliação positiva de António Costa é coisa do passado. E o PS pagaria a fatura, se os portugueses fossem chamados às urnas (Marcelo já deixou claro que não serão): perde 14 pontos relativamente às últimas legislativas.

O "povo de Esquerda" poderia ser levado a pensar que é uma coisa boa. O PS seria de novo obrigado a governar à Esquerda. O problema é que a sondagem também mostra que a geringonça seria insuficiente. Um ano depois das legislativas, PS, BE, CDU e Livre teriam em conjunto menos dez pontos percentuais e ficariam longe de conseguir controlar o Parlamento (41,9%).

As perdas socialistas não revertem para os três potenciais parceiros. Quando se analisa o mapa de transferência de voto, o BE ganha alguma coisa com o descalabro do PS, mas cresce apenas dois pontos face a 2022. Tanto quanto o Livre de Rui Tavares, ainda que neste caso dois pontos tenham outro peso (triplicaria o seu valor no mercado eleitoral). Quanto aos comunistas, a troca de Jerónimo de Sousa por Paulo Raimundo não teve efeitos: mais meio ponto do que há um ano continua a ser um resultado difícil de engolir.

Marcelo Rebelo de Sousa já foi um presidente mais popular. Mas a sua capacidade de analisar a vida política em termos que toda a gente compreende não se perdeu. Tendo em conta os resultados desta sondagem, é impossível não a associar às reflexões do presidente, quando, confrontado com a avalanche de escândalos, recusou demitir o governo e forçar eleições antecipadas. Como disse, no tom de analista que lhe deu fama na televisão, não era provável que "surgisse uma alternativa evidente, forte e imediata". Traduzindo: o PSD não chega lá.

A prova dos nove fica feita. O PSD de Luís Montenegro não só não consegue aproveitar o trambolhão socialista, como troca o passo: se hoje houvesse eleições, perderia quatro pontos relativamente às legislativas. Um resultado em linha com outros indicadores do barómetro: não só perde a liderança da Oposição e da Direita para André Ventura, como, na avaliação aos vários líderes partidários, Montenegro é o segundo que mais perde (depois de Costa), registando um saldo negativo de 18 pontos.

Recorde-se uma outra frase de Marcelo, no mesmo contexto: "Imagine que o presidente usa a arma atómica e que o povo português confirma o partido no governo, com maioria absoluta ou sem maioria absoluta. Já viu a posição em que deixava o presidente da República?". Já não é preciso imaginar. Mesmo que esta seja, como já se disse, uma escolha virtual.

É um fenómeno comum a várias democracias europeias e ocidentais. Com a vida política polarizada, os partidos tradicionais de centro-esquerda e centro-direita perdem preponderância, em favor de propostas mais populistas, radicais ou de rutura. E, em vários casos, em benefício da extrema-direita. É isso que mostra esta sondagem.

Quando se somam os resultados do PS e do PSD - partidos que lideraram todos os governos, desde que a democracia portuguesa estabilizou -, a degradação é evidente. Nas legislativas do ano passado, os dois partidos somaram 69% dos votos (e mais de dois terços dos deputados, a maioria necessária para fazer alterações constitucionais). Nesta altura, segundo a sondagem, somariam apenas 52%.

Os grandes beneficiários são dois partidos recém-chegados. A Iniciativa Liberal, que valeria agora o dobro do que conseguiu nas legislativas, em boa parte à custa do eleitorado do PSD (o que torna ainda mais surpreendente que João Cotrim de Figueiredo, único chefe partidário com avaliação positiva dos portugueses, tenha decidido abandonar a liderança).

Mas, acima de todos estão os ganhos dos radicais de Direita, que subiriam cerca de seis pontos relativamente a janeiro de 2022. André Ventura é sempre o primeiro (e muitas vezes o único) a pedir a demissão de secretários de Estado e de ministros, haja ou não razão para tal, e a tática está a dar frutos.

António Costa desceu do céu ao inferno em nove meses. E essa deveria ser uma boa notícia para o seu principal rival, Luís Montenegro. Sucede que o líder social-democrata caiu, por sua vez, no purgatório: afunda-se na avaliação dos portugueses (saldo negativo de 18 pontos); é atropelado por André Ventura na liderança da Oposição e da Direita; e o PSD desce nas intenções de voto.

Quando o que está em causa é indicar quem é a principal figura da Oposição, Ventura deixa Montenegro para trás: depois de um empate a 30 pontos em outubro passado, o líder do Chega tem agora uma vantagem de 11 pontos. Quando se acrescenta uma nova pergunta, sobre quem se destaca na liderança da Direita parlamentar, a diferença é ainda maior: 16 pontos de vantagem sobre Montenegro (que não é deputado).

Há apenas um indicador em que Ventura ainda está pior do que Montenegro. Na avaliação qualitativa, e apesar do trambolhão do social-democrata (saldo negativo de 18 pontos), o líder da Direita radical tem um registo negativo de 26 pontos. Pior, só António Costa, que durante meses foi o único líder partidário com saldo positivo e tem agora 32 pontos negativos.

O único líder que consegue avaliação positiva é aquele que deixa o cargo neste fim de semana: João Cotrim de Figueiredo sai da liderança da Iniciativa Liberal com um saldo de cinco pontos positivos. E com o partido num patamar que nenhuma sondagem anterior projetou. O próximo líder liberal terá um problema espinhoso. Sobretudo se tivermos em conta que são três vezes mais os que pensam que a saída de Cotrim terá efeitos negativos (32%) dos que os que vislumbram efeitos positivos (11%).

rafael@jn.pt

FICHA TÉCNICA DA SONDAGEM

A sondagem foi realizada pela Aximage para o DN, TSF e JN, com o objetivo de avaliar a opinião dos portugueses sobre temas relacionados com a atualidade política. O trabalho de campo decorreu entre os dias 10 e 14 de janeiro de 2023 e foram recolhidas 805 entrevistas entre maiores de 18 anos residentes em Portugal.

Foi feita uma amostragem por quotas, obtida através de uma matriz cruzando sexo, idade e região (NUTSII), a partir do universo conhecido, reequilibrada por género, grupo etário e escolaridade. Para uma amostra probabilística com 805 entrevistas, o desvio padrão máximo de uma proporção é de 0,017 (ou seja, uma "margem de erro" - a 95% - de 3,45%). Responsabilidade do estudo: Aximage Comunicação e Imagem, Lda., sob a direção técnica de Ana Carla Basílio.