"Vamos reformar a Europa, ou esvaziá-la"

"Os próximos meses são essenciais. As próximas eleições [europeias] são decisivas, por elas passa o destino da Europa. Vamos reformar a Europa ou esvaziá-la, não podemos deixar que os extremos ganhem mais força", afirmou o presidente francês Emmanuel Macron no encontro com os cidadãos, na Fundação Calouste Gulbenkian, ao lado do primeiro-ministro António Costa.

As declarações de Macron deram-se na alocução inicial, antes de responder, tal como Costa, às perguntas do público.

Lembrou que a Europa vive uma "fadiga democrática" e que não se dá neste momento valor a este "espaço de paz e liberdade coletiva" que nunca antes existiu, fundada em democracia, na economia social de mercado e tendo como objetivo o progresso dos povos, em especial das classes médias.
No entanto, as crises do capitalismo e a transição para a sociedade digital puseram em causa o sistema e reapareceram os nacionalismos.

"Os pilares em que a Europa foi construída estão fragilizados. Precisamos de mais Europa. Temos de inventar uma sociedade que dê resposta aos desafios e a escala nacional não é suficiente, a europeia é a única que dá respostas credíveis."

Sobre a crise migratória, Macron disse que a resposta "não pode travar a liberdade de circulação". "Há propostas nacionalistas nesse sentido, mas nós somos radicalmente contra. A batalha das ideias vai ter caráter fundamental. Não vamos recuar em caso algum", afirmou.

Questionado sobre o modelo de governação para a Europa, Emmanuel Macron faz uma proposta de refundação, com duas regras fundamentais: " A porta nunca estar fechada e quem não está de acordo não deve impedir os outros. Não podemos bloquear quem não está de acordo. Cada vez que um país diz não fica tudo bloqueado. Assumo uma Europa de círculos concêntricos, temos a zona euro, temos Schengen... Mas o cerne da Europa não pode ser dissolvido."

Europa daqui a 15 anos

"Vejo a Europa daqui a 15 anos com a União Europeia e o Conselho da Europa, com mais acordos de associação com a Rússia e a Turquia, num círculo menos fechado. Depois outro mais fechado, com o mercado único, da defesa, etc. Por fim outro com a verdadeira convergência social, moeda única, o núcleo dos povos integrados. É necessário alargar ainda mais o coração da Europa", afirmou

"Quelle est votre Europe". A pergunta é feita sem ponto de interrogação, com uma estrela amarela ao lado, no ecrã do grande auditório da Fundação Calouste Gulbenkian, durante a iniciativa Encontros Cidadãos.

De bom humor, e a transparecer descontração, Emmanuel Macron e António Costa responderam indiretamente a essa e a outras perguntas feitas no momento e através de uma aplicação no telemóvel ou no tablet. As mais votadas foram as escolhidas.

As mais óbvias, sobre os grandes temas da atualidade, foram respondidas ou afloradas antes, porque os dois líderes fizeram uma preleção.
Outras questões menos esperadas, sobre a prostituição, o socialismo, os baixos salários em Portugal ou a equivalência de diplomas universitários foram postas à consideração, mas não tiveram votos suficientes por parte da restante audiência.

Uma mesa alta de pé, com o diâmetro suficiente para as garrafas de água da ordem e respetivos copos e dois bancos, onde se sentaram Costa e Macron, no centro do palco do grande auditório da Fundação Calouste Gulbenkian. Atrás e dos lados, dezenas de pessoas sentadas, metade portuguesa, metade francesa. A maioria era jovem, escolhida através de associações de estudantes.

Na assistência, um imigrante de origem brasileira lembrou que as pessoas no palco não representavam a diversidade das sociedades atuais e perguntou como se pode melhorar a integração dos imigrantes.

Comparar a integração pelos bleus

Emmanuel Macron aproveitou os parabéns endereçados pelo cidadão brasileiro relativamente à vitória no campeonato do mundo para fazer uma comparação. Lembrou que em 1998, era então estudante, e dizia-se que a equipa então campeã mundial era black-blanc-bleu (preta, branca e azul, em alusão às cores dos jogadores e da bandeira francesa) e muitas pessoas comemoraram a vitória com bandeiras dos países de origem. "Hoje não, os jogadores defenderam as cores francesas e rejeitaram essa associação", tal como as pessoas que festejaram nas ruas.

Isto não significa que o presidente creia que tudo está bem. "Concentrámos as populações que chegaram do Magrebe e de África e não lhes demos muitas oportunidades de êxito", reconhece.

Afirma que a França, no campo da educação, não é modelo de integração e que a sociedade é estagnada. "O meu projeto político defende a mobilidade social. É fundamental, e é uma batalha para os próximos dez anos", ao que a assistência respondeu com um aplauso.

António Costa disse que Portugal tem uma experiência diferente de outros países, do centro e do leste da Europa, com uma história mais fechada. Sobre a política portuguesa de integração destacou a importância do reagrupamento familiar e da escola.

E tal como Macron havia falado dos banlieues, Costa disse que os bairros das periferias são "fatores enormes de exclusão social". Lembrou que a maioria dos atentados terroristas foi realizada por pessoas nascidas na Europa. "A regeneração urbana à escala europeia é um desafio europeu", declarou.

A última pergunta, de um jovem francês, causou um bruaá. Que condições existem para que pessoas como ele, a viver em Lisboa, ou noutros pontos do planeta, para voltar para França. Para Macron as novas reformas aprovadas trouxeram outros níveis de competitividade e de potencial de investimento, pelo que o país é hoje outra vez atraente para os jovens franceses que estão fora. Diplomata, disse que se estão em Lisboa e gostam, "isso é formidável", tal como podem regressar à pátria e terem êxito.

No final foi publicado o resultado do inquérito realizado na aplicação. Os membros do público escolheram a reforma institucional da UE como a prioridade. António Costa disse que essa reforma é "fundamental, mas é um erro" classificá-la de prioritária. "A A reforma da zona euro é o mais urgente. Todos estamos expostos a um risco imenso", recordou.

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