A autenticidade? Uma melena despenteada num jogo de futebol

Rui Rio preocupa-se tanto com a opinião pública que não se preocupa em perder um jogo de futebol em forma de rentrée. Mário Nogueira finge que não se preocupa, mas deve-lhe muito.

Há um líder de um partido que só está preocupado com a opinião pública - ou, melhor dizendo, que parece estar bastante mais preocupado com a opinião pública em geral do que com a opinião interna do seu próprio partido - e, mesmo assim, tem coragem de marcar um jogo de futebol - amigável, claro, mas um jogo de futebol - como programa de rentrée -, embora rejeite o nome.

Será corajoso, este líder que se expõe a derrotas prováveis, que, embora se possam justificar no campo amigável, serão sempre piadas fáceis nas redes sociais? A títulos perigosos em jornais? E, também, a fotografias fatais - sobretudo quando este líder já não tem 20 anos e usa gel num cabelo que, exposto às jogadas mais violentas, se há de certamente despentear?

Talvez não seja corajoso. Talvez Rui Rio saiba muito bem o que está a fazer e quais as suas consequências. Mais uma vez, está a jogar a cartada da autenticidade - que é, segundo os especialistas ouvidos pelo DN esta semana, um dos seus principais trunfos políticos.

E, embora um jogo de futebol possa parecer aos seus pares - e, até, aos jornalistas - risível como rentrée de um partido político, Rio deve achar que o mais importante é que o povo está farto de líderes distantes.

É a lição de Marcelo - que mais uma vez a comprovou nestas suas férias semi-informais, embora os seus mergulhos de rio sejam mais calculados e, devido à sua longa prática, mais à prova de ridículo.

Qual é o problema da cartada da autenticidade? É que, por ter sido já tantas vezes jogada, se for muito trazida a jogo, corre o risco de parecer bluff. Apenas mais uma cartada de marketing... da autenticidade.

E Rui Rio tem bastante em jogo. Há já algum tempo que um líder do PSD não estava na posição complexa em que este está. Ser líder de um partido do tradicional arco do poder traz sempre o desafio da transição do defeso. Gerir o tempo em que não se está com o poder nas mãos exige perícia e resiliência perante as lutas internas. Ou total confiança dos que o elegeram.

Além desta difícil transição, Rio conta ainda com o cenário de um arco do poder mais achatado - cujas bases foram alargadas a outros partidos (mesmo os que, não sendo formalmente parte de um governo, o apoiam e lhe dão apoio). O poder mais longe, a travessia é ainda mais difícil.

Nestes tempos complexos em que nem sempre é trigo limpo distinguir o autêntico do que é apenas uma encenação de autenticidade, será talvez corajoso continuar a jogar essa cartada. Nas próximas eleições teremos a resposta.

Nesta edição há outro líder que joga como ninguém com a opinião pública. É Mário Nogueira, o secretário-geral da Fenprof. Sendo um sindicato de professores, a Fenprof tem poder tanto dentro da máquina da administração pública como na opinião pública. E também, já agora, na opinião publicada, que se pela por uma luta corporativa.

Já fez, por isso mesmo, derrubar e fragilizar governos que se achavam sólidos. Ora, este líder sindical que sempre viveu do poder que a opinião pública lhe outorga, e de várias maneiras - em parte por respeito pelo papel que os professores têm, em parte pela persuasão e presença mediática -, vem dizer, na entrevista que dá ao DN, que não se importa nada com o que a opinião pública julga das greves prolongadas dos professores.

Ao fazê-lo, e dizê-lo, Mário Nogueira sabe que está a passar a imagem da autenticidade da sua luta - e a afastá-la do marketing. Mas, mais uma vez, esta é uma cartada perigosa. Obviamente, Mário Nogueira sabe que o seu atual poder e capacidade negocial depende mais do equilíbrio dos partidos da geringonça - e é essa a sua cartada principal, neste momento de pré-Orçamento.

A seu favor na jogada tem o facto de a educação raramente ser discutida em Portugal. A educação propriamente dita, o que se passa nas salas de aula e quanto se aprende, de facto.

Se assim não fosse, os pais portugueses estariam certamente a perguntar ao líder da Fenprof como se distingue um professor bom de um mau, no atual cenário. E porque é que todos, por igual, terão de ter nove anos, quatro meses e dois dias de recuperação de tempo de serviço. Os bons e os maus. Ou será que não há maus?

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