Explorar o Oceano

E se os mares são só sete,
Há mais terra do que mar

Os mares não são sete porque o oceano é só um, mas é a partir de terra que o mar terá de ser pensado, planeado e gerido.

Tal como a atmosfera, o oceano é o outro bem comum da humanidade, e uma como o outro são de onde tudo vem e para onde tudo vai; os únicos fornecedores, os últimos recetáculos da atividade humana.

No seio das questões ambientais, o oceano aparece a ser discutido com o mesmo grau de importância global do clima e da biodiversidade, mas começou mais tarde, pois esta semana decorre apenas a segunda conferência global sobre o oceano promovida pela ONU, em boa hora, em Portugal. O clima tem o Acordo de Paris, e uma métrica clara; não pode a temperatura aumentar mais de 1,5º. Mais do que um teto necessário, este grau e meio é um número mágico, difícil de obter, mas simples de entender e de medir. É esta métrica que não temos para a biodiversidade e menos ainda para o oceano. Talvez ainda falte consenso científico, mas sobretudo o que falta é uma vontade de compromisso multilateral, que só a diplomacia, apoiada pela ciência, pode conseguir, porque também foi a diplomacia que conseguiu o Acordo de Paris. Será o "grau e meio" do oceano capaz de assegurar que em 5 anos conseguimos garantir que 30% da área deste único oceano é um espaço protegido? Este será um bom compromisso.

Todo o território, terra ou oceano, tem de ser gerido. Somos quase sete mil milhões de habitantes, seremos em 30 anos dez mil milhões, quereremos melhorar - como é comum - as condições de vida para a nossa espécie e, para o conseguirmos, temos de ter claro que não o faremos se não preservarmos a biodiversidade e não cuidarmos da preservação da riqueza presente no oceano de forma perene. Gerir para preservar e valorizar tem de ser a base de uma política para o oceano a cumprir por cada país à escala global. Mesmo a decisão de simplesmente conservar tem de ser uma decisão de gestão ativa.

É inaceitável a pesca ilegal, com navios que aspiram o fundo. É vergonhosa a prática de escravatura a bordo de pesqueiros. É cobarde o ato de cortar barbatanas aos tubarões. É miserável que existam navios que liberem lastro em alto mar.

Venham a inovação, a economia azul, a criação de riqueza, a produção de eletricidade no eólico off-shore ou em fontes perpétuas, como sejam as ondas e as marés. Façam até uma fábrica de unicórnios azuis se não se lembrarem de melhor. Mas sobretudo, cuidemos do nosso oceano como um ato de soberania. E num país, Portugal, onde o tecido institucional em torno do oceano é ainda frágil, esperemos muito das políticas públicas para reforçar esse tecido, e da Marinha Portuguesa para saber exercer as suas funções de soberania.

Muito mais do que discutir a nossa história marítima, à qual falta um Museu das Descobertas, muito mais do que propalar desígnios de futuro - que se não aconteceram é mesmo porque não são desígnios -, importa cuidar, conhecer, usar com parcimónia, combater todos os abusos.

O verbo explorar tem hoje, as mais das vezes, uma conotação negativa. Mas nem sempre foi assim; explorar era a consequência natural da descoberta; explorar foi conhecer e divulgar. Neste sentido, venham de novo os exploradores do mar. Não os que o exploram, usando os seus recursos. Mas os que exploram o oceano para o saber melhor e assim nos ensinar a dar-lhe valor.

Deputado do PS eleito pelo Porto e ex-ministro do Ambiente e da Ação Climática

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