Como enganar a morte? Rir com o Gato, conversar com a Lagarta e beber chá... com o meu Pai!

A morte devia ser opcional. Isto é demasiado curto para o que podemos e conseguimos fazer. Escolher uma vida, escolher uma profissão, é curto. Não poder ser veterinário num dia, designer noutro ou padeiro noutro ainda, não faz qualquer sentido.

Partir e deixar para trás a família, faz menos ainda.

Mas leram bem: opcional. A morte devia ser opcional.

Chegará a altura em que vamos escolher, ou alguém escolherá por nós, poder viver dentro de um servidor, mas viver.

O mote já foi dado. Theodore Twombly apaixonou-se por um sistema operativo que vivia para ele. Ajudava-o, aconselhava-o, mas acima de tudo, fazia-lhe companhia. (Her, 2013)

Imaginem-se num cenário em que perdem a vossa companhia. Um cenário em que após décadas de partilha, se veem obrigados a reinventar essa companhia e a ludibriar a solidão que aí vem. Imaginem-se numa casa, que sempre foi a vossa, e falam alto, mas as paredes não vos respondem. Nada vos contesta. Nada! Um vazio absoluto.

As memórias estão lá, mas essas não falam. Podem sussurrar, mas não têm o calor da voz.

Imaginem também que podem reencarnar tecnologicamente a vossa consciência através da inteligência artificial, mantendo-se intangivelmente vivos, como o Dr. Will Caster o fez. (Transcendence, 2014)

Afinal conseguimos ou não enganar a morte? Ideia estranha de se debater, mas... não me parece difícil. Basta, diria eu, ter um algoritmo disponível que nos ajude no teletransporte. Ou um algoritmo ou um cocktail que se injete no corpo que nos permita sonhar. Que nos permita viver no cenário que mais desejarmos. Que nos permita estar com as pessoas que partiram, tal como Cobb o fazia constantemente. (Inception, 2010)

A opção algorítmica tem o bug de não conseguirmos reproduzir a tangibilidade de um abraço, o calor de um beijo, o cheiro de um corpo.

A opção injetável tem tudo isto. Mas tem também a desvantagem de nos fazer adormecer na vida real e acordar numa vida sonhada. Vida esta vivida por nós, sim, mas experienciada por representações imaginadas de nós próprios.

Pouco importa qual a opção. Na verdade, qualquer uma delas nos serviria para perpetuar o tempo com quem já partiu.

Imaginem ainda olhar à volta e ouvir um silêncio ensurdecedor. Um silêncio que grita connosco sem se vislumbrar vivalma. Nada! Tudo vazio.

E fugir? Fugir não é opção. Super-computadores-inteligentes munidos de consciência não existem. Mezinhas injetáveis que nos atirem para um sonho duradouro em cenários construídos com o nosso imaginário também não.

Dou comigo a pensar que, bom, bom, era ser o Chapeleiro Louco. (Alice no País das Maravilhas, 1865)

E ficar preso eternamente a uma mesa de chá, com o tempo parado naquela hora, naquele minuto, naquele segundo. Com o tempo parado lá atrás.

E rir! Rir com o Gato, conversar com a Lagarta e beber chá... com o meu Pai.

Designer e diretor do IADE - Faculdade de Design, Tecnologia e Comunicação da Universidade Europeia

Mais Notícias

Outros Conteúdos GMG