'Assegas Amegaz', magrebinos/as!
No próximo dia 13, a comunidade amazigh do norte de África celebrará a entrada do novo ano do seu calendário. Nesse mesmo dia, iniciará o ano 2971.
Importante referir que os amazighs, os "homens livres" autóctones, são aqueles/as a quem vulgarmente chamamos de berberes, "bárbaros", porque não falavam árabe aquando do período da islamização/arabização (século VII d.C.), pelo colonizador árabe, esse, sim, vindo lá "das arábias". Logo, erro comum na nossa comunicação social, bem como na Academia, referirem-se a países como Marrocos, Argélia, Tunísia e Líbia enquanto "países árabes" ou mesmo pertencendo ao "mundo árabe".
Em Marrocos, a contestação islamista, já na rua, perante a normalização de relações diplomáticas entre Marrocos e Israel, poderá trazer ganhos adicionais aos amazighs. Prevê-se que o Palácio privilegie aqueles que apoiaram esta decisão desde o início, por via dos cerca de cem mil judeus-berberes de origem marroquina que vivem em Israel.
O Palácio vê o território de Tânger a Lagouira como um enorme tabuleiro de xadrez e os amazighs sabem que são um peão importante e, após verem a consagração da língua tamazight como língua oficial do reino durante o que se vulgarizou de Primavera Árabe, jogam agora na exigência da consagração o "1.º de Janeiro Amazigh", o Yennayer, de janeiro, como festa nacional, o que equivalerá a dia feriado. O interesse é, aliás, mútuo, já que, favorecendo os "muçulmanos não praticantes amazighs", o Palácio enfraquece um governo islamista que não lhe agrada e consegue concentrar de forma constitucional mais poderes na pessoa do rei.
A Argélia, nesta luta pelos direitos dos povos autóctones, vai mais à frente, já que a "Primavera Negra" na Kabilya, de 2001, viu como resultado uma língua tamazight como língua nacional na Constituição de 2002 e depois confirmada como língua oficial em 2016. Na senda do apaziguamento social, Abdelaziz Bouteflika também aceitou a festa do Yennayer como feriado nacional em 2018.
A Tunísia, também profundamente amazigh, tem a particularidade de ter um território e população muito menores comparativamente a Marrocos e Argélia e em muito beneficiou de um primeiro presidente assimilado, Habib Bourguiba, que ao longo dos seus 30 anos no cargo foi conseguindo distrair as ambições dos amazighs no processo de construção nacional pós-colonial. Da mesma forma, os tunisinos têm estado mais entretidos e fascinados com o desmontar do "sistema Ben Ali", nos últimos dez anos, pelo que esta questão terá o seu momento político no futuro, nem que seja por pressões vizinhas, sobretudo caso a Líbia conquiste a paz e a normalidade.
A mesma Líbia que viveu durante 41 anos em criptoberberismo, já que o ditador proibiu língua, música, literatura, folclore e demais manifestações culturais desta chamada "minoria maioritária"! O processo de libertação líbio durante a Primavera Árabe é aliás bastante simbólico desse ponto de vista, já que, à medida que o país ia sendo libertado de leste para oeste, as rádios locais passavam a emitir em tamazight e a celebrar com música e folclore locais.
Assegas Amegaz a todos/as, tamazight para Feliz Ano Novo.
Politólogo/arabista
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