Piratas do ar líbios queriam ir para Roma e acabaram em Malta

Dois homens, que se apresentaram como leais a Kadhafi, levavam duas pistolas e uma granada, aparentemente falsas. Passageiros e tripulação foram libertadas sãs e salvas

Esta é a história de um sequestro aéreo que tinha todas as condições para acabar mal, mas que teve um desfecho sem mortos ou feridos. Os dois piratas do ar, munidos de uma granada e duas pistolas, conseguiram ontem desviar para Malta um A320 da companhia aérea líbia Afriqiyah Airways, que iria fazer uma ligação doméstica. As fracas condições de segurança na base aérea que serve como aeroporto da cidade de partida ajudam a explicar como levaram as armas, sabe-se agora que provavelmente eram falsas, e a falta de combustível impediu os dois líbios, declarados fiéis de Muammar Kadhafi, de chegarem ao destino que desejavam: Roma. Um episódio que não deverá porém manchar a longa e sólida relação de amizade entre Malta e Líbia, até porque não é caso inédito.

A informação foi dada via Twitter pelo primeiro-ministro maltês, Joseph Muscat, cerca das 17.50 (hora de Lisboa), cerca de três horas depois dos dois piratas do ar líbios se terem rendido: "Os primeiros exames forenses mostram que as armas usadas no sequestro da Afriqiyah são réplicas". Uma mensagem que se junta às muitas que o chefe do governo de Malta foi deixando naquela rede social ao longo do dia de ontem, informando sobre o desenrolar da operação.

Eram 14.30 em Lisboa (mais uma hora em Malta) quando foi dado por terminado o sequestro. "Os sequestradores renderam-se, foram revistados e levados sob custódia", escreveu Muscat. Enquanto isso, imagens da televisão mostravam os dois homens a serem retirados do avião algemados. Um canal líbio alega ter falado ao telefone com um dos sequestradores, que se apresentou como sendo o líder de um partido pró- Kadhafi.

O A320 da companhia aérea líbia Afriqiyah Airways iria fazer ontem de manhã a ligação entre Sabha e Tripoli, quando foi desviado para Malta, a cerca de 350 quilómetros a norte da Líbia. A bordo seguiam 111 passageiros - 82 homens, 28 mulheres e uma criança - e 6 tripulantes.

Com tropas posicionadas a centenas de metros da aeronave e autocarros estacionados na zona da pista do Aeroporto Internacional de Malta, em Valeta. Primeiro saíram as mulheres e crianças, depois um grupo de 25 passageiros, depois mais 25, um pouco mais tarde outros 44, alguns tripulantes, sendo que os últimos membros da tripulação ficaram até à detenção dos sequestradores.

Pelo meio, um dos piratas, apareceu no topo das escadas com uma bandeira verde semelhante à da Líbia de Kadhafi. "Tomámos esta medida para promover o nosso novo partido", terá dito um dos sequestradores, segundo um canal líbio.

De acordo com o ministro líbio dos Negócios Estrangeiros do governo de união nacional, os dois sequestradores teriam pedido asilo político às autoridades de Malta. Uma solução de recurso pois, segundo a companhia aérea líbia disse ao final do dia de ontem, os dois piratas do ar queriam ir para Roma, mas acabaram por aterrar em Malta por causa da falta de combustível.

Quando o avião atingiu dos 36 mil pés, o piloto recebeu uma exigência para aterrar em Roma e foi informado por outro membro da tripulação que os sequestradores estavam armados, adiantou a Afriqiyah Airways. O piloto terá proposto aterrar em Tripoli, proposta rejeitada pelos piratas do ar, por isso Malta era a opção viável.

Esta é a terceira vez que a ilha é o destino escolhido em sequestros de aviões de companhias líbias. As duas vezes anteriores, sempre sem mortos ou feridos, ocorreram em 1979 e 1983, sempre com aeronaves da Libyan Arab Airlines.

Incidentes que, tal como agora, não irão colocar em perigo as estreitas relações entre os dois países, iniciadas após a independência de Malta em 1964 e que se prolongam até hoje. Devido à instabilidade política líbia, Malta é cada vez mais vista como uma base para empresas estrangeiras que pretendem fazer negócios na Líbia. Muitas delas são da Alemanha - país que até 2010 tinha 40 empresas presentes no país.

Já este mês, o primeiro-ministro maltês, Joseph Muscat, recebeu o seu congénere líbio e presidente do Conselho Presidencial da Líbia, Fayez al-Sarraj, tendo os dois deixado claro o desejo "de melhorar as nossas excelentes relações bilaterais, mas também para garantir que os nossos colegas europeus avaliam a situação na Líbia", disse Muscat.

Fracos controlos eletrónicos

Com o substancial aumento das medidas de segurança nos aeroportos e dentro dos aviões depois do 11 de Setembro, a facilidade com que os dois piratas do ar conseguiram levar para bordo duas armas e uma granada, apesar de aparentemente serem réplicas, pode ser explicada pelas condições em Sabha.

O ministro líbio dos Transportes, Milad Matouq, defendeu ontem a segurança nos aeroportos do país, alegando que falhas de segurança acontecem em todo o lado e a Líbia não é exceção e sublinhando que este é o primeiro incidente desde a revolução de 2011.

O aeroporto de Sabha foi fechado há dois anos por causa de confrontos tribais e a base aérea da cidade foi transformada num aeroporto civil para voos domésticos. Desde 2014 que a segurança do espaço é feita por uma milícia de Misrata.

Salah Qalma, um deputado, afirmou à AP que "é muito fácil para qualquer um entrar sem passar pelos controlos eletrónicos". O aeroporto tem um controlo eletrónico a ala de chegada, mas o mesmo não acontece nas portas de saída adjacentes, que também não têm guardas. Este parlamentar adiantou que o edifício não tem vedação ou guardas no exterior e os aviões não têm nada a separá-los do parque de estacionamento.

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