O ex-rei dos belgas e o teste de paternidade: tem de pagar 5000 euros/dia até o fazer

Advogado de Alberto II, que abdicou do trono para o filho em 2013, garante que ex-monarca vai entregar esta semana uma amostra de ADN para saber se é o pai de Delphine Boël, de 51 anos.

O caso arrasta-se há anos e chegou aos tribunais em 2013. Um dos últimos episódios teve lugar a 15 de maio, quando o tribunal de recurso de Bruxelas decidiu que se Albert II, que abdicou do trono da Bélgica em 2013, mantiver a recusa em fazer o teste de paternidade exigido por Delphine Boël terá de pagar 5000 euros por dia.

A artista plástica belga, de 51 anos, garante ser filha do ex-monarca, nascida de uma relação de Alberto, então príncipe herdeiro, com a baronesa Sibylle de Sélys Longchamps. O ex-rei, casado até hoje com a italiana Paola Ruffo di Calabria, sempre negou ser o pai de Delphine.

Pressionado pela justiça, Alberto terá entretanto aceitado entregar uma amostra de ADN. "Sua majestade vai aceitar fazer o teste, agora que é obrigado a tal", confirmou à AFP o advogado Guy Hiernaux. Uma mudança de atitude que Hiernaux explica com o facto de "os resultados serem mantidos secretos até o Supremo Tribunal belga a deliberar sobre o recurso contra esta decisão". O que poderá demorar anos.

Há seis meses, um tribunal belga ordenou a realização de testes de ADN, mas Alberto recusou obedecer e, na semana passada, um outro juiz decretou que teria de pagar 5000 euros de multa por dia até entregar as amostras de sangue.

No trono entre 1993 e 2013 (quando abdicou a favor do filho, Filipe), Alberto, hoje com 84 anos, terá se apresentar no gabinete de uma perita judicial que, a partir de uma amostra de saliva, irá proceder à análise comparativa com os ADN de Délphine e da mãe.

O caso Délphine

Aquilo que viria a ser conhecido como o caso Délphine começou em 1999 com a publicação de uma biografia da rainha Paola. Da autoria do então muito jovem jornalista flamengo Mario Danneels, a obra dá conta de uma relação extraconjugal do rei Alberto nos anos 60. E que dessa relação teria nascido uma filha. Estas revelações terão provocado uma grave crise no casal, com Paola a ter ponderado o divórcio. Mas a razão de Estado terá sido mais forte e com a década de 80 chegou a reconciliação.

No discurso de Natal de 1999, Alberto falou sobre os tempos difíceis que o seu casamento atravessou nos anos 60 e 70 e aludiu à existência de uma criança nascida de uma relação extraconjugal. Mas nunca reconheceu oficialmente Délphine como sendo essa criança. "A rainha e eu recordámos os tempos muito felizes, mas também a crise que o nosso casal atravessou há mais de 30 anos", disse Alberto na altura.

De volta ao anonimato depois da publicação da biografia da rainha Paola, em 2013, após Alberto II abdicar do trono e assim perder a imunidade, Délphine Boël decidiu exigir que a sua filiação fosse reconhecida oficialmente e recorreu à justiça para exigir um teste de ADN. Depois de uma tentativa falhada de mediação, o caso voltou aos tribunais em 2017, com a justiça ter agora decidido forçar o ex-rei a pagar uma multa de 5000 euros diários enquanto mantiver a recusa em fazer o teste de paternidade.

Garante da união do povo belga

Nascido a 6 de junho de 1934, o segundo filho de Leopoldo III e da rainha Astrid tornou-se no rei Alberto II a 9 de agosto de 1993, sucedendo ao irmão Balduíno, que não tinha filhos.

Tinha apenas um ano quando a mãe morre num acidente de automóvel. Criança, fica confinado ao palácio após a invasão da Bélgica pela Alemanha nazi durante a II Guerra Mundial, antes de serem todos levados para a Áustria, onde só a chegada dos americanos em 1945 lhes devolverá a liberdade.

Perante a oposição de parte dos belgas, Leopoldo só regressa à Bélgica em 1950, após uma passagem pela Suíça. E acaba por deixar o trono ao filho mais velho, Balduíno, que reinaria 43 anos.

Talvez por isso, para os belgas, que sempre tinham visto Alberto como um "super-embaixador" do comércio externo do país e estavam à espera que fosse o filho dele, Filipe, a suceder ao tio, a subida ao trono do irmão de Balduíno, aos 59 anos, foi uma surpresa.

Apreciador de carros de luxo e de iates, apaixonado pelas letras e pelas coisas boas da vida, a sua biografia escrita por Patrick Roegiers garante que Alberto não tem "vocação para o sacrifício em prol da nação". Mas a verdade é que rapidamente revelou ter sentido do dever.

A sua primeira prova de fogo foi o caso Dutroux em 1996. Ao receber as famílias das vítimas do pedófilo assassino, assumiu o papel de "estabilizador moral", nas palavras do então primeiro-ministro belga (e mais tarde presidente do Conselho Europeu), Herman Van Rompuy.

Alberto II tornou-se ao longo dos anos um símbolo da união da Bélgica, um país que tem de lidar com a divisão entre comunidades linguísticas e culturais. O monarca destacou-se a tentar unir valões e flamengos, manobrando muitas vezes nos bastidores para conseguir acordos que garantissem um governo ao país.

Cansado, em 2013, aos 79 anos, decide abdicar a favor do filho, Filipe.

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