Moçambique: depois da tempestade, as doenças

O ciclone Idai arrasou e inundou. Ainda pode haver mais inundações mas a seguir vem o risco de epidemias, favorecidas pelas águas estagnadas e pela inexistência de condições de salubridade e higiene: malária, cólera, dengue, zika. Cruz Vermelha vai fretar avião para levar um hospital de campanha para o terreno.

"Aquela é uma zona de malária e de risco de cólera. Com o parar das chuvas vai existir um ambiente propício ao desenvolvimento de mosquitos, e os mosquitos são vetores de várias doenças. Desde logo a malária mas também o zika, o dengue. Isto falando só das doenças infetocontagiosas. Há uma massa humana afetada pelas cheias que perdeu tudo, incluindo as condições de higiene básica e de cuidados de saúde básicos. Por exemplo, qualquer ferida nestas condições pode infetar."

Gonçalo Órfão, chefe de missão de coordenação nacional de emergência da Cruz Vermelha Portuguesa que vai partir para a Beira, a quarta cidade do país, na zona mais afetada, "assim que possível" (a organização está a tentar fretar um avião), com uma equipa de 20 pessoas -- 15 da CVP e cinco dos Médicos do Mundo --, tenta mapear a preocupação. "Estamos perante uma calamidade e ainda estamos a tentar perceber situações mais concretas. Estamos a averiguar sobre a situação da água potável, mas partimos do princípio de que vamos encontrar pessoas desnutridas e desidratadas. E depois para além disso tudo existem as doenças normais da população, que se agravam nestas situações."

Outras patologias que se podem verificar incluem, prossegue o médico, a leptospirose (também conhecida por febre dos pântanos), uma doença infecciosa comum quando há enchentes e que é transmitida pela urina de animais, nomeadamente roedores.

Moçambique é apontado nas informações para viajantes do Centro de Controlo de Doenças americano (CDC) como um país em que há zonas de transmissão ativa de cólera -- Nampula e Cabo Delgado, no norte do país.

Mortes diretas podem ultrapassar o milhar

A zona de Sofala, onde se situa a cidade da Beira, que o ciclone Idai terá arrasado, não está identificada como zona de transmissão ativa desta doença. Outras doenças apontada pelo CDC como de alto risco no país são a hepatite A e a febre tifóide, ambas por contaminação fecal da alimentação ou da água.

De acordo com a última contabilidade das autoridades moçambicanas, o Idai terá causado a morte de 217 pessoas. Mas haverá cerca de 15 mil a aguardar resgate e o presidente do país, Filipe Nyusi, já admitiu que o número final de mortos possa ultrapassar o milhar. Até agora, terão sido resgatadas três mil pessoas; há 30 portugueses de cujo paradeiro não se sabe.

O governo moçambicano está a ser acusado de nada ter feito para prevenir a tragédia, apesar de ter informação sobre a situação meteorológica. "Nestas situações, não só se recomenda a ativação dos alertas laranja ou vermelho, mas também a evacuação da população residente nas zonas de risco. Nem uma, nem outra coisa aconteceu", escreve o jornal Carta de Moçambique. O Idai, com chuva intensa e ventos de até 170 quilómetros por hora, atingiu a Beira na quinta-feira à noite, deixando os cerca de 500 mil residentes na quarta maior cidade do país sem energia e linhas de comunicação.

A missão da Cruz Vermelha, que deverá partir assim que assegure transporte, vai levar consigo um hospital de campanha e alojamento, assim como água potável e víveres. "Não sabemos ainda quanto tempo teremos de lá ficar mas supomos que a missão se vai prolongar no tempo", diz Gonçalo Órfão, que crê que a primeira equipa deverá ser rendida ao fim de duas ou três semanas.

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