12 junho 2018 às 17h16

Aquarius, o navio que também é uma maternidade

O navio que segue para Valência com migrantes resgatados de pequenas embarcações entrou em fevereiro de 2016 ao serviço das ONG SOS Méditerranée e Médicos Sem Fronteiras (MSF) já salvou centenas de vidas - e seis nasceram ali.

César Avó

A história mais recente de uma nova vida a bordo do Aquarius aconteceu no dia 26 de maio. Miracle (Milagre) foi o nome dado ao bebé nascido em águas internacionais. "Assim que a notícia se espalhou entre os sobreviventes, as mulheres cantaram uma canção de alegria, acompanhada de djembé!", contou a SOS Méditerranée.

A mãe, cuja identidade não foi revelada, contou aos MSF que passou um ano de pesadelo na Líbia. Durante esse tempo foi mantida cativa, sofreu maus-tratos e só obteria a liberdade a troco de dinheiro. Mas no início do ano conseguiu fugir com o companheiro e escondeu-se até conseguir embarcar, com a Europa como destino.

"Ela disse-me que o barco partiu na quarta-feira, mas depois de alguns minutos o motor falhou e voltaram à praia", disse a enfermeira dos MSF Aoife Ni Mhurchu. "Os contrabandistas exigiram que se escondessem na praia, depois desapareceram e não voltaram nas 24 horas seguintes. Ficou aterrorizada, sem comida nem água." Se entrasse em trabalho de parto 48 horas antes, lembra a enfermeira, não teria qualquer assistência.

A história do bebé que nasceu antes no Aquarius inspirou o dueto Emilie Satt e Jean-Karl Lucas, sob o nome Madame Monsieur, que concorreu ao Festival da Canção francês deste ano.

Mercy (Misericórdia) nasceu em março de 2017, durante uma operação de resgate de 945 migrantes. A mãe de Mercy, a nigeriana Taiwo, contou que o pai do bebé tinha ficado preso na Líbia.

Outro parto aconteceu quando o antigo navio da guarda costeira alemã regressava da décima missão, que resultara no salvamento de 388 pessoas. quando nasceu Destiné Alex (o segundo nome em homenagem ao capitão do Aquarius, Alex Moroz), filho de um casal dos Camarões.

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Desde 2014, cerca de 80 mil mulheres chegaram por mar a Itália, sem contar com as menores de idade. A maioria é jovem e quem trabalha junto dos migrantes crê que um número elevado encontra-se em gestação.

"Conheci muitas mulheres que foram violadas na Líbia, e muitas vezes elas precisam vender os seus corpos para poder embarcar", disse à AFP Marina Kojima, uma parteira japonesa que passou vários meses no Aquarius.

O stress, a agitação marítima, as vibrações do motor ou o alívio do resgate podem ajudar a que ocorram partos. A sua frequência é uma questão de probabilidades.