"Agora vamos ver o que fazem os grilinhos", diz Renzi

Primeiro-ministro desvaloriza derrota nas autárquicas e aposta o futuro no referendo de 2 de outubro sobre o sistema eleitoral

A segunda volta das eleições autárquicas italianas correu mal ao Partido Democrático (PD) de Matteo Renzi. Se perder Roma para Virginia Raggi, a candidata do eurocético e antissistema Movimento 5 Estrelas (M5E), já fazia parte das previsões, a derrota em Turim foi um verdadeiro murro no estômago do primeiro- -ministro italiano.

Com apenas 31 anos, Chiara Appendino, também do M5E, venceu a autarquia do Norte de Itália com 54,6%, batendo Piero Fassino, atual presidente da câmara e candidato do PD, que obteve 45,4%. A vitória é ainda mais surpreendente tendo em conta que na primeira volta, disputada a 5 de junho, Fassino superou Appendino por 11 pontos percentuais.

Além de Roma e Turim, das seis cidades mais importantes em disputa (ver coluna ao lado), o PD venceu apenas em Milão e Bolonha. Em Nápoles nem sequer chegou à segunda volta e em Trieste perdeu para o candidato da direita, Roberto Dipiazza.

Apesar do golpe, Matteo Renzi prefere não interpretar os resultados como uma chicotada na sua política e no seu governo: "Perdemos as eleições porque os subúrbios de Roma estão imundos e cheios de problemas e porque a capital tem vindo a ser mal governada." Para Renzi, as vitórias do Movimento 5 Estrelas - conquistaram 19 das 20 autarquias onde disputaram a segunda volta - "podem ter um efeito boomerang". Aquele que até agora era visto principalmente como um partido de protesto passará a ter uma visibilidade diferente. Nesse sentido, se as coisas correrem mal em Roma e em Turim, a ascensão do Movimento 5 Estrelas poderá sofrer um duro revés. "Agora vamos ver o que fazem os grilinhos", disse o primeiro-ministro, aludindo ao facto de o M5E ter sido fundado, em 2009, pelo humorista Beppe Grillo.

Apesar de Renzi desvalorizar o resultado das eleições, é inegável que o seu estado de graça já terminou. Segundo o correspondente do El País em Itália e no Vaticano, as eleições municipais em Itália ficaram marcadas por dois sons: o barulho dos festejos do M5E e o assobio do afiador de lâminas na sede do PD. "As facas dos inimigos de Renzi, com o ex-ministro Massimo D"Alema à cabeça, já estão preparadas para a vingança", escreve Pablo Ordaz.

Mas Renzi não está disposto a ceder: "Não me vou demitir. Nem do governo nem de secretário-geral do PD. A minoria do partido quer um congresso? Que esperem sentados para estarem confortáveis. Não haverá nenhum antes de 2 de outubro."

Essa é a data-chave para Renzi. Será então que os italianos irão votar em referendo as alterações ao sistema eleitoral propostas pelo primeiro-ministro, que passam por diminuir o poder do senado de forma a aumentar a estabilidade política no país - já lá vão 63 governos nos últimos 70 anos. Renzi já prometeu que sairá pelo seu próprio pé se perder o referendo.

Depois de em fevereiro de 2014, sem recurso a eleições, ter substituído Enrico Letta no cargo de primeiro-ministro, este foi o segundo teste eleitoral de Renzi. O primeiro aconteceu com as eleições europeias de maio de 2014. A vitória foi retumbante, com 40,8% dos votos. Este foi o segundo e a derrota foi amarga. A questão que se coloca é enunciada por Mario Calabresi, diretor do La Repubblica: "Renzi ainda é considerado uma peça para a renovação do país, ou a vontade de rutura é tanta que já é visto como parte do establishment."

A ameaça já não vem apenas da direita. O PD venceu as legislativas de 2013 com 29,5%, o Povo da Liberdade, de Silvio Berlusconi, ficou muito perto, com 29,1%, e o M5E, que obteve 25,5%, foi a terceira força mais votada. A avaliar pelos resultados das eleições municipais, o movimento de Beppe Grillo está cada vez mais forte nas urnas e dificilmente a ambição da jovem advogada Virginia Raggi ficará confinada aos limites de Roma. Em outubro haverá mais luz sobre o futuro político de Renzi, mas, a partir de agora, a capital de um dos países mais importantes da União Europeia passa a estar nas mãos de um partido que não morre de amores pela Europa.

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