Porque são as séries canceladas?

A série "House of Cards" foi cancelada depois de o ator Kevin Spacey ter sido acusado de assédio sexual. Este é um caso inédito em Hollywood que, até agora, sempre tem sabido contornar os escândalos relacionados com os atores. Será este um sinal de que algo está a mudar?

No dia seguinte a terem surgido as primeiras acusações de assédio sexual contra o ator Kevin Spacey, a Netflix e a Media Rights Capital anunciaram a suspensão da sexta temporada da série House of Cards. O ator não só interpreta o protagonista, Frank Underwood, presidente dos Estados Unidos da América, como também divide a produção executiva da série com David Fincher.

As gravações da sexta temporada tinham começado no início de outubro e a Netflix planeava exibi-la em 2018. Porém, perante as acusações, os produtores, "profundamente incomodados", decidiram suspender todos os trabalhos "para analisar a situação atual e resolver quaisquer preocupações" que existam na equipa. Mesmo que decidam avançar para a última temporada, resta saber se a personagem de Frank Underwood continuará a ter o mesmo protagonismo.

House of Cards foi um dos primeiros grandes sucessos da Netflix quando esta plataforma foi lançada em 2013. Ao longo destes anos, a série foi nomeada e ganhou inúmeros prémios, entre os quais dois Globos de Ouro para os atores Kevin Spacey e Robin Wright e vários prémios Emmy. No entanto, segundo fontes que falaram à agência de notícias Associated Press, apesar de anunciada na segunda-feira passada, a decisão de acabar com House of Cards terá sido tomada há vários meses. O site especializado TV Line corroborou essa informação, citando fontes da Netflix que dizem que o cancelamento nada tem que ver com o escândalo em torno do ator Kevin Spacey mas antes com a quebra das audiências verificada na quinta temporada.

Até agora, Hollywood tem conseguido gerir os escândalos pessoais dos atores de modo a que não interfiram nos planos das estações televisivas. Mas com House of Cards isso não está a acontecer: ou pela natureza das acusações (neste momento, já oito pessoas que trabalham ou trabalharam na série contaram à CNN que Kevin Spacey tinha um comportamento "predatório", principalmente para com homens jovens) ou talvez porque os produtores tenham percebido que, além das questões morais, o caso terá implicações tão grandes que a produção se tornará financeiramente inviável.

E se o ator protagonista morre?

Esta é a verdade: são, geralmente, as fracas audiências e não os problemas pessoais dos atores que ditam o fim de uma série. Se for um produto de sucesso, encontra-se sempre uma solução, como aconteceu por exemplo com Spartacus: o ator principal, Andy Whitfield, foi diagnosticado (e viria a morrer) com linfoma, aos 37 anos, quando se preparava para a segunda temporada, mas foi substituído por Liam McIntyre que interpretou Spartacus em duas temporadas.

Outro exemplo muito conhecido: em janeiro de 2011, Charlie Sheen foi internado numa clínica de reabilitação, pondo em causa a continuidade da série Dois Homens e Meio, da CBS (em Portugal passa no AXN White), com a qual o ator já tinha sido nomeado para dois Globos de Ouro. Surgiram também notícias de que Sheen, nesse período conturbado, quando consumia álcool e outras substâncias, tinha proferido várias ofensas ao produtor executivo da série. Porém, a Warner Bros. optou por não cancelar a série, substituindo Sheen por Ashton Kutcher como intérprete do milionário solteirão Walden Schmidt. Dois Homens e Meio continuou no ar nos EUA até fevereiro de 2015.

Da mesma forma, os produtores de Anatomia de Grey não tiveram problemas em demitir o ator Isaiah Washington depois de, em 2007, este ter chamado "maricas" ao seu colega T.R. Knight. E, assim, o doutor Burke deixou o Hospital Seattle Grace sem que isso pusesse em causa a continuação da série.

2009, a atriz Nicolette Sheridan teve um desentendimento com o criador da série Donas de Casa Desesperadas que lhe terá, inclusivamente, batido durante uma discussão acerca do argumento, e rapidamente a sua personagem, a dona de casa Eddie Britt, deixou de frequentar a Wisteria Lane. E, em agosto do ano passado, Thomas Gibson, que interpretou durante onze temporadas o detetive Aaron Hotchner na série Mentes Criminosas, foi despedido pela CBS depois de uma acesa discussão com um dos produtores, tendo-lhe dado um pontapé. Já não era a primeira vez que o ator mostrava não saber controlar a raiva e os argumentistas arranjaram maneira de fazer desaparecer a sua personagem, mandando-a para o Programa de Proteção de Vítimas. A série continua em exibição e em Portugal pode ser vista no canal AXN. A 13.ª temporada está já garantida.

Cancelamento polémico

Já neste ano, a ABC e a 20th Century Fox anunciaram o cancelamento de Um Homem entre Mulheres (Fox Comedy), a sitcom que tem como protagonista Tim Allen no papel de um homem conservador que odiava o presidente Obama. Uma vez que, após seis temporadas, esta era a segunda série mais vista da ABC, várias vozes se levantaram dizendo que Hollywood estava a calar as alas mais conservadoras. Ainda por cima, isto aconteceu depois de Tim Allen ter dito, no programa de Jimmy Kimmel, que ser republicano em Hollywood "é como estar nos anos 1930 na Alemanha. Uma pessoa tem de ter muito cuidado se não acredita no que todos à sua volta acreditam". Mas a ABC justificou o cancelamento com as alterações na grelha do canal e questões financeiras.

Seja como for, algo inédito está a acontecer em Hollywood. Longe vão os tempos em que o facto de um ator ou realizador ser acusado de assédio sexual não interferia na sua carreira e tudo se resolvia com um pedido de desculpas.

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