23 setembro 2018 às 08h15

Moçambique/Autárquicas: Pré-campanha fervilha com batalhas legais e queixas de intimidação

Queixas de intimidação da oposição a par de batalhas legais estão a anteceder a campanha eleitoral para as eleições autárquicas de Moçambique, marcadas para 10 de outubro sob o signo de diversas mudanças.

Lusa

A campanha arranca oficialmente na terça-feira, dia 25, feriado nacional pelo Dia das Forças Armadas de Defesa de Moçambique (FADM).

Duas candidaturas ao município da capital, Maputo, que desafiavam o 'status-quo' da Frente de Libertação de Moçambique (Frelimo), partido no poder no país desde a independência, caíram por terra.

O principal partido da oposição, a Resistência Nacional Moçambicana (Renamo), foi buscar o mediático deputado Venâncio Mondlane ao Movimento Democrático de Moçambique (MDM) para tentar conquistar Maputo, mas a Comissão Nacional de Eleições (CNE) afastou-o, considerando ilegal a candidatura, por Mondlane ter renunciado ao mandato na Assembleia Municipal de Maputo em 2015.

A CNE chumbou também a candidatura à capital de Samora Machel Júnior ('Samito'), filho do primeiro presidente moçambicano, que avançou como independente depois de preterido pelo seu partido, a Frelimo.

Ambos recorreram ao Conselho Constitucional, mas o órgão no topo da justiça moçambicana não lhes deu razão.

'Samito' diz ter sido vítima do seu próprio partido, Frelimo, que escolheu outro candidato - num sinal de fissuras internas que só o tempo dirá quão profundas são.

A Renamo queixa-se também de "perseguição política", mas para contornar a rejeição da candidatura de Venâncio Mondlane, manteve-o em palco, designando-o porta-voz do candidato a Maputo (Hermínio Morais, antigo comandante da guerrilha da Renamo, que era segundo da sua lista).

Está ainda por resolver outro caso, em Quelimane, capital provincial no centro do país, uma das mais importantes do país: o Conselho de Ministros retirou o mandato a Manuel de Araújo, por ter aderido à Renamo durante um mandato para o qual foi eleito pelo MDM.

Manuel Araújo já tinha anunciado ser o candidato da Renamo a Quelimane, mas agora tudo depende de um recurso para o Tribunal Administrativo - ainda pendente, a menos de três semanas da votação.

A Frelimo rejeita todas as acusações, em Maputo e noutros pontos do país, alinhando num discurso oficial de paz e reconciliação.

Mas a última edição do boletim sobre o processo eleitoral, publicado pelo Centro de Integridade Pública (CIP), organização da sociedade civil moçambicana, regista vários casos de intimidação da oposição.

Duas figuras seniores da Frente de Libertação de Moçambique (Frelimo), Teodato Hunguana e Teodoro Waty, queixaram-se à Procuradoria-Geral da República (PGR) depois de ameaçados de morte por um autor de artigos pró-Frelimo nas redes sociais, João Cumbane.

"Há mais relatos de intimidação baseados num estudo realizado em Tete e também em pré-campanha em Manica", nota a organização.

A preparação das quintas eleições autárquicas de Moçambique está a enfrentar várias mudanças e tem passado por atribulações.

A Renamo regressa aos boletins de voto, depois de ter boicotado as últimas autárquicas, a 20 de novembro de 2013, alegando falta de transparência no processo - e deixando a tarefa facilitada para a Frente de Libertação de Moçambique (Frelimo, no poder) ganhar a maioria dos municípios e para o Movimento Democrático de Moçambique (MDM) vencer três capitais provinciais (Beira, Quelimane e Nampula).

Estas são também as primeiras eleições depois da morte de Afonso Dhlakama, presidente da Renamo, a 03 de maio, devido a complicações de saúde.

E a Renamo regressa depois de a Frelimo se ter desgastado com o escândalo das dívidas ocultas do Estado, em 2016, que agravou a crise económica e financeira.

Estas são também as primeiras eleições depois de o parlamento ter alterado a Constituição, para acomodar os acordos de descentralização do poder alcançados no início deste ano entre a Renamo e o Governo da Frelimo.

Espera-se que tais acordos garantam a paz, ao acomodar as aspirações da Renamo de governar províncias a partir das próximas eleições gerais.

As armas na zona de conflito (centro do país) calaram-se em dezembro de 2016 com um cessar-fogo sem limite e que se espera seja substituído por um tratado de paz.

A Constituição foi alterada em maio, as leis ordinárias deviam ter sido adaptadas e aprovadas pelo parlamento em junho, mas o partido no poder (Frelimo) disse que nada faria sem que a Renamo desse passos no sentido de entregar as armas.

O ultimato caiu mal. Houve tensão, o calendário eleitoral (nomeadamente no que toca à definição de listas) teve de ser alterado, mas em julho tudo voltou aos carris.

No que toca às autarquias, a principal mudança é que deixa de haver um boletim para a assembleia municipal e outro para a câmara: os eleitores põe a cruz apenas num boletim, para a assembleia municipal, e o cabeça de lista vencedor é o presidente da Câmara.

A tensão cresce e o contexto é novo para as próximas autárquicas em Moçambique, que vão ser as terceiras deste ano em Nampula, maior centro urbano do país depois do aglomerado da capital Maputo-Matola.

Mahamudo Amurane, presidente da autarquia, eleito pelo MDM, foi assassinado a 04 de outubro de 2017, num crime ainda por esclarecer e sem acusação, o que levou a eleições antecipadas renhidas, disputadas no início do ano a duas voltas e das quais a Renamo saiu vitoriosa.

Daqui a um ano, Moçambique volta a ir às urnas, para fechar o ciclo com as eleições gerais de 15 de outubro.

Tópicos: internacional