Rússia revela objetivo de tomar sul da Ucrânia e ligar a Crimeia à Transnístria
General abre o jogo, embora analistas apontem o facto de o oficial ser responsável pela propaganda. Guterres irá a Moscovo no dia em que aliados se reúnem para avaliar ajuda a Kiev.
A Rússia fez saber através de um comandante militar que pretende tomar o sul da Ucrânia, cortando o acesso do país invadido ao Mar Negro, e com isso ligar a Crimeia à região separatista da Transnístria, um desenvolvimento que fez soar os alarmes na capital moldava. Enquanto Moscovo continua a dar sinais de querer restabelecer à força fronteiras do tempo soviético, a Lituânia e a Alemanha pediram um fortalecimento das defesas da NATO no Báltico.
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Enquanto o presidente do Conselho Europeu pediu ao presidente russo o estabelecimento de corredores humanitários em Mariupol, mas sem sucesso até ao momento, Moscovo confirmou reuniões de António Guterres com Vladimir Putin e Sergei Lavrov na terça-feira, no mesmo dia em que o secretário da Defesa norte-americano discute com aliados a próxima fase de assistência militar à Ucrânia.
"Desde o início da segunda fase da operação especial, um dos objetivos do exército russo é estabelecer o controlo total sobre o Donbass e o sul da Ucrânia. Isto permitiria garantir um corredor terrestre até à Crimeia", revelou o general Rustam Minnekayev. Para este comandante, tal irá ser um golpe nas infraestruturas chaves da economia ucraniana, como os portos do Mar Negro, por onde são feitos os embarques de produtos agrícolas e metalúrgicos, disse o militar citado por agências russas.
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13 414 Segundo o site russo Readovka morreram 13414 militares russos e outros 7000 estão desaparecidos, mas a informação foi mais tarde desmentida, tendo alegado que foi vítima de pirataria.
Minnekayev destacou ainda a importância estratégica de haver uma ligação à Transnístria, território de facto independente da Moldávia na fronteira com o oeste da Ucrânia, e onde há uma base militar russa. "O controlo do sul da Ucrânia também é um corredor para a Transnístria, onde também observamos casos de opressão da população de língua russa", disse o general, repetindo alegações não comprovadas e usadas para justificar ações na Ucrânia.
Por coincidência, o governo de Chisinau entregou ao embaixador da União Europeia a resposta ao formulário de adesão, tal como a Ucrânia fez há dias. O antigo país da União Soviética elegeu no final de 2020 a primeira presidente pró-europeia, Maia Sandu, embora no campo militar queira manter-se neutral.
As declarações do general russo foram vistas com ceticismo por alguns analistas. Para a consultora política Tatyana Stanovaya, Minnekayev limitou-se a fazer tais declarações por "motivos propagandísticos", não sendo a pessoa indicada para tais comentários, mas um oficial hierarquicamente superior ou o próprio Vladimir Putin, deu a entender ao New York Times.
Guterres em Moscovo
Ao 58.º dia da "operação especial" o líder russo respondeu de forma positiva ao pedido do secretário-geral das Nações Unidas, pelo que vão manter conversações na terça-feira. António Guterres também se reunirá com o ministro dos Negócios Estrangeiros russo Sergei Lavrov.

António Guterres desloca-se a Moscovo na terça-feira e espera ir em breve a Kiev.
© Michael M. Santiago / GETTY IMAGES NORTH AMERICA / Getty Images via AFP
Na quarta-feira, Guterres pedira para se encontrar com os presidentes da Rússia e da Ucrânia. Sabe-se que Putin não atendeu os telefonemas do secretário-geral depois de este ter declarado que a campanha militar russa violava a carta das Nações Unidas. O dirigente português instou a Rússia a parar o ataque desde que este começou há dois meses, naquilo a que chamou "o momento mais triste" nos seus cinco anos à frente da ONU. E na terça-feira apelou para uma "pausa humanitária" nos combates de quatro dias, durante a celebração da Páscoa ortodoxa.
Quanto à visita a Kiev, a porta-voz da ONU Eri Kaneko disse que a preparação ainda estava a decorrer. Em Moscovo e em Kiev, Guterres "espera falar sobre o que pode ser feito para trazer a paz à Ucrânia com urgência", disse a porta-voz, acrescentando que o secretário-geral pretende discutir "medidas que podem ser tomadas agora mesmo" para parar os combates.
Entretanto, a vice-primeira-ministra da Ucrânia sugeriu que a retirada de dezenas de milhares de pessoas ainda presas em Mariupol só é possível com a ajuda da ONU. Em declarações à BBC antes de ter sido revelada a viagem de Guterres a Moscovo, Iryna Vereshchuk disse que as Nações Unidas são a "única organização com capacidade e força para evitar a morte" dos sitiados. "A ONU e Guterres precisam de se envolver e organizar corredores. Não temos tempo a esperar. Estes corredores devem ser criados nos próximos dias", afirmou.
2435 Número de vítimas civis confirmadas pelas Nações Unidas, mas a ONU diz que o número será muito superior, estimando em 3000 as mortes só por falta de acesso a cuidados médicos.
No que pode ser mais um argumento para o secretário-geral usar perante o presidente russo, a alta comissária das Nações Unidas para os Direitos Humanos, Michelle Bachelet, afirmou que as ações russas na Ucrânia, que incluíram execuções sumárias de civis e destruição das infraestruturas civis, podem equivaler a crimes de guerra no que a chilena qualificou de "história de horror de violações perpetradas contra civis".
Um dia depois de os Estados Unidos terem anunciado mais 800 milhões de dólares em assistência militar à Ucrânia, foi anunciado que o secretário da Defesa Lloyd Austin irá deslocar-se à base militar de Rammstein, na Alemanha, na terça-feira, para presidir a uma reunião na qual, em conjunto com aliados e parceiros, irá avaliar as necessidades de assistência militar a curto prazo de Kiev e avaliar o que se passa no campo de batalha. Dois dos aliados, a Lituânia e a Alemanha, convergiram ao pedir uma nova estratégia de defesa da NATO para os países bálticos, que passe a presença para uma força de brigada.
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