O novo templo é o terceiro local de culto construído no mesmo sítio, em Aiódia. EPA/GABINETE DE IMPRENSA DA ÍNDIA
O novo templo é o terceiro local de culto construído no mesmo sítio, em Aiódia. EPA/GABINETE DE IMPRENSA DA ÍNDIA

“Rei dos deuses” Modi inicia pré-campanha eleitoral

Inauguração de templo no norte da Índia, onde antes existia uma mesquita, é um marco para o nacionalismo hindu.
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O primeiro-ministro indiano cumpriu uma promessa eleitoral de 2014 ao inaugurar um templo em veneração a Rama onde os hindus creem ser o local de nascimento daquela divindade, uma encarnação de Vishnu, na cidade de Aiódia, no norte do país. Ao fazê-lo, Narendra Modi deu o pontapé de saída da pré-campanha eleitoral, onde irá concorrer a um terceiro mandato, e deu uma estocada no secularismo do Estado ao representar um papel algures entre o sacerdote e uma divindade em funções executivas.

“Após séculos de paciência e sacrifício, o nosso senhor Rama chegou. É o início de uma nova era”, declarou Modi durante a cerimónia de inauguração do templo, uma construção orçada em 250 milhões de dólares e ainda não terminada, perante 8 mil convidados de 55 países.

Narendra Modi prestou homenagem a Rama. EPA/GABINETE DE IMPRENSA DA ÍNDIA

A festa religiosa havia começado 11 dias antes quando Modi, comparado há dias pelo líder do seu partido a um “rei dos deuses”, entrou num ritual de purificação que o levou a templos hindus de vários pontos do país. Este rendez-vous com Rama tem um simbolismo especial porque representa uma vitória do nacionalismo hindu cuja ideologia tem como propósito a hegemonia na sociedade indiana (hindutva), em detrimento das outras religiões. 

No épico Ramáiana, o nascimento de Rama - que terá ocorrido há uns 7 mil anos - deu-se em Aiódia e o seu reinado é tido como perfeito. Consta que existiu um templo para marcar o local do seu nascimento, mas que este teria sido demolido por Babur, o primeiro imperador mogol na Índia, e aí mandado construir uma mesquita, Babri Masjid.

Finda a colonização britânica apareceu um ídolo de Rama no interior da mesquita, o que levou ao encerramento da mesma, por motivos de segurança. Foi já nos anos 80 que nasceu a campanha para demolir a mesquita e no seu lugar construir um templo. O crescimento eleitoral do Partido do Povo Indiano (BJP), do primeiro-ministro Modi, deu-se em paralelo com este projeto.

Em dezembro de 1992 milhares de pessoas cercaram a mesquita e destruíram-na. A onda de violência que se seguiu matou cerca de duas mil pessoas. Dez anos mais tarde, no estado de Gujarat, chefiado então por Modi, dezenas de hindus que regressavam de comboio de Aiódia morreram queimados, o que desencadeou nova onda de violência, com mais de mil mortos, de novo muçulmanos na maioria. 

Em 2019, o Supremo Tribunal deu autorização para a construção do templo hindu na condição de os muçulmanos - que são 14% da população do país - receberem um espaço para a construção de uma nova mesquita. Segundo o responsável pelo projeto, ouvido pela Reuters, as obras vão arrancar em maio e deverão demorar entre três e quatro anos.
 
cesar.avo@dn.pt

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