Pablo Casado entre a espada do Vox e a parede de Isabel Díaz Ayuso
Resultado das eleições provocadas pelo PP na região de Castela e Leão empurram os conservadores para uma coligação inédita com a extrema-direita. Líder Casado não quer essa solução, mas o presidente regional diz que não há linhas vermelhas. Socialistas esperam lucrar com este cenário.
Há vitórias com sabor a derrota e aquela que o Partido Popular (PP) obteve no domingo, na região de Castela e Leão, enquadra-se nessa sentença. O partido de centro-direita provocou eleições antecipadas com o objetivo de se desembaraçar do parceiro de coligação (Ciudadanos) e de alcançar uma maioria, para depois prosseguir a estratégia na Andaluzia, onde tem uma aliança análoga, e por fim reclamar uma mudança de ciclo para as eleições gerais de 2023.
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Na ressaca dos votos contados, porém, são mais as dúvidas do que as certezas, com o atual presidente da Junta Alfonso Mañueco a abrir a porta à extrema-direita e a direção de Pablo Casado a mandar trancá-la - enquanto a sua grande rival e estrela da campanha Isabel Díaz Ayuso reforça a sua posição.
36,6% de abstenção. Nas primeiras eleições regionais sem coincidirem com as autárquicas na maior região espanhola registou-se a mais baixa participação de sempre: 63,4%.
Para a direção do Partido Popular as contas são simples: ao contrário de 2019, em que perderam as eleições para o Partido Socialista (PSOE) mas conseguiram chegar ao governo de Castela e Leão numa coligação com o Ciudadanos, o vencedor é o PP e o derrotado é o PSOE . "Objetivo alcançado", resumiu um dirigente aos jornalistas na sede do partido. Mas as contas não são tão simples. De facto, o PSOE obteve 30% e elege 28 membros contra 35 em 2019 e o PP regista 31,4% e passa de 29 para 31, em 80 assentos na assembleia sediada em Valladolid. Só que para formar governo precisa da abstenção dos socialistas ou do apoio do Vox. E é aí que tudo se complica.
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Juan García-Gallardo, o candidato do Vox que obteve o terceiro lugar, quer entrar no governo e revogar leis como a da violéncia de género ou a da memória histórica.
Por parte do PSOE só uma voz, a do autarca de Valladolid, defende a abstenção do partido para permitir ao PP que governe em minoria. "Não podemos, por uma questão de coerência, dizer que o Vox é um perigo para a democracia e para a convivência [democrática] e, ao mesmo tempo, não oferecer uma alternativa", disse Óscar Puente. Mas a direção do partido prefere dramatizar e responsabilizar os conservadores: "Este cenário não foi provocado pelo PSOE, foi provocado pelo PP, eles queriam correr esse risco, deixem-nos assumir a responsabilidade. Não cuidaram dos interesses de Castela e Leão, cuidaram dos interesses de Casado", afirmou Felipe Sicilia, porta-voz da comissão executiva do PSOE.
10 assentos. O Partido Popular venceu as eleições, com 31 deputados, mas ficou a dez da maioria, pelo que o partido de centro-direita não conseguirá governar sozinho.
O Vox, com 17,6% dos votos, acaba por roubar protagonismo ao PP e exige fazer parte do executivo - o que aconteceria pela primeira vez. A ambição do partido de extrema-direita foi sublinhada na noite eleitoral pelo líder Santiago Abascal. "[Juan] García-Gallardo está a ficar com cara de vice-presidente", disse sobre o candidato de 31 anos. No dia seguinte, o advogado que se filiou há dois anos no partido saiu a terreiro a defender um governo de coligação PP-Vox. "Se alguém quisesse que déssemos votos ao PP, deveria ter votado no PP (...) Vamos fazer valer os nossos votos, porque um eleitor do Vox não vale menos do que o eleitor de outro partido, seja qual for o seu nome. Se não for formado um governo para mudar o rumo de Castela e Leão, não contem com o Vox", avisou.
13 eleitos. O Vox, de extrema-direita, foi um dos vencedores da noite, ao passar de um representante para 13, em 81 lugares. Em sentido contrário, o Ciudadanos caiu de 12 para um.
O Ciudadanos, que tinha recebido 14% nas eleições de 2019, tinha recebido a vice-presidência, o porta-voz, quatro pastas e a presidência da assembleia. "Temos de obter o mesmo ou mais do que o Ciudadanos", disse García-Gallardo. E que mudança de rumo é aquela que preconiza? Na sua essência, quer "revogar toda a legislação de esquerda", o que passa, por exemplo, por terraplenar a lei de violência de género ou o decreto sobre a memória histórica que regulamenta a localização, exumação e identificação das vítimas da ditadura franquista.
Para o atual presidente da região, nada disto deve ser intransponível para se manter em funções. "Não me foram dadas quaisquer instruções para não falar do Vox no PP de Castela e Leão. Génova [a sede do PP situa-se na na madrilena rua de Génova] não me atribuiu nenhuma linha vermelha" disse Mañueco na segunda-feira.

Alfonso Mañueco cantou vitória, mas precisa de apoios para poder governar.
© EPA
Um discurso que choca com o da direção do PP. "As experiências dos governos de coligação não estão a ser satisfatórias", disse o secretário-geral do partido, Teodoro García Egea. De Madrid olha-se para a Andaluzia, cujas eleições também devem ser antecipadas, e teme-se que uma coligação com a extrema-direita em Castela possa mobilizar as esquerdas e parte do centro, beneficiando o PSOE.
cesar.avo@dn.pt
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