Moscovo ameaça com guerra mundial depois de condenação internacional
ONU condena anexação, assembleia parlamentar do Conselho da Europa declara o regime russo "terrorista". Chefe da diplomacia europeia adverte: se a Rússia quebrar tabu nuclear as tropas russas serão aniquiladas.
A pretensa anexação de mais quatro regiões da Ucrânia pela Rússia recebeu uma mensagem clara de condenação aos olhos do mundo. Na Assembleia Geral das Nações Unidas, ao lado de Moscovo só votaram quatro países. Já na quinta-feira, a Assembleia Parlamentar do Conselho da Europa, órgão que reúne representantes de 46 países, declarou a Rússia um "estado terrorista". Perante mais estes sinais de isolamento do regime de Vladimir Putin - embora o próprio tenha mantido um dia repleto de encontros com outros líderes no Cazaquistão -, um alto funcionário ameaçou disseminar o conflito para a escala global.
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Para o secretário adjunto do Conselho de Segurança da Federação Russa, Alexander Venediktov, a adesão da Ucrânia na NATO é o caminho para um conflito que arrastará o mundo inteiro. "Kiev está bem ciente de que tal passo significaria uma escalada garantida para uma Terceira Guerra Mundial", disse Venediktov à agência TASS. Venediktov também reiterou a noção russa de que, ao ajudar a Ucrânia, o Ocidente "é uma parte direta no conflito".
À ameaça russa, o Ocidente respondeu com palavras e atos. Na reunião de ministros da Defesa da NATO, ao pedido de ajuda do presidente ucraniano Volodymyr Zelensky para proteger os céus do seu país, foi anunciado que a Espanha irá enviar quatro lançadores de mísseis Hawk e uma bateria de mísseis antiaéreos Aspide e o secretário-geral Jens Stoltenberg prometeu o envio para Kiev de equipamentos antidrone na ordem das centenas. Ao mesmo tempo, 15 países europeus (Portugal excluído) associaram-se a um projeto para a compra conjunta de sistemas de defesa antiaérea. Quanto às palavras, o chefe da diplomacia da UE foi contundente e o presidente francês foi controverso. Josep Borrell advertiu que o uso de armas nucleares por Moscovo levaria em resposta à "aniquilação do exército russo".
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Já Emmanuel Macron respondeu no Twitter à ameaça russa e disse não querer uma guerra mundial. Numa entrevista à France 2, foi mais explícito e disse que o arsenal nuclear francês não será usado devido à guerra na Ucrânia. Vários especialistas criticaram esta admissão, uma vez que faz parte da estratégia de dissuasão uma certa ambiguidade.

Macron disse em entrevista televisiva que um ataque nuclear à Ucrânia não se enquadra nos interesses fundamentais da nação, tal como estabelecido na doutrina nuclear francesa.
© LUDOVIC MARIN / AFP
As declarações do dirigente russo acontecem duas semanas depois de Zelensky ter respondido à cerimónia de anexação das regiões de Kherson, Zaporíjia, Lugansk e Donetsk com o anúncio da candidatura de adesão à aliança atlântica. E dão-se no momento "de mais grave intensificação desde a invasão", como afirmou Stoltenberg. Depois do ataque em larga escala na segunda-feira, os bombardeamentos russos às cidades ucranianas prosseguiram e só na quarta-feira mataram mais 17 civis. Na quinta-feira foram atingidas 40 localidades, com Lviv, Mikolaiv, Nikopol e Kupiansk à cabeça.
Em sentido oposto, as autoridades russas acusaram a Ucrânia de atingir um edifício residencial em Belgorod. Mikhailo Podolyak, conselheiro de Zelensky, disse que o míssil foi disparado pelos russos para atingir Kharkiv, mas que acabou por cair naquela cidade a 40 quilómetros da Ucrânia. No sul, o avanço dos ucranianos em Kherson levou o governador instalado por Moscovo a pedir ao Kremlin para ajudar a retirar civis - presume-se que os colaboracionistas e russos a viver no território ocupado. O vice-primeiro-ministro Marat Khusnullin ofereceu "alojamento gratuito" a todos os que queiram sair de Kherson e instalarem-se na Rússia.
Na quarta-feira a comunidade internacional contornou as limitações do Conselho de Segurança da ONU - órgão onde a Rússia tem assento permanente - e na Assembleia Geral o projeto de resolução que condena a anexação de territórios ucranianos recebeu a aprovação de 143 países, a abstenção de 35 e dez não registaram o voto. Contra a resolução, ao lado de Putin, apenas a Bielorrússia de Lukashenko, a Síria de Assad, a Coreia do Norte de Jong-un e a Nicarágua de Ortega.

A resolução debatida e votada na Assembleia Geral da ONU marcou uma clara derrota para a Rússia, com 143 países a condenarem as anexações de Moscovo. No espaço lusófono apenas Moçambique se absteve.
Noutro foro internacional, a Assembleia Parlamentar do Conselho da Europa, em Estrasburgo, a resolução da autoria da Estónia, na qual se declara a Rússia como um "estado terrorista", foi aprovada por unanimidade. Para evitar a expulsão do Conselho da Europa, Moscovo retirou-se da organização em março. Zelensky, que se dirigiu aos parlamentares do Conselho da Europa, pediu a criação de um tribunal especial para os crimes de guerra russos, enquanto em Haia o procurador do Tribunal Penal Internacional defendeu a legalidade da extradição de prisioneiros russos suspeitos de crimes de guerra para o TPI.
O isolamento russo foi de alguma forma contrariado com a viagem de Putin a Astana, onde participou na Conferência de Interação e Medidas de Confiança na Ásia (CICA), organização fundada pelo Cazaquistão e na qual participam 27 países asiáticos. O líder russo encontrou-se com o emir do Qatar, o líder da Autoridade Palestiniana e o presidente da Turquia.
cesar.avo@dn.pt
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