Internacional
16 setembro 2021 às 05h00

Nova corrida aos mísseis na península coreana 

Pyongyang testa mísseis e Seul responde na mesma moeda. Chamada de atenção de Kim Jong-un é condenada por Washington, que no entanto diz querer voltar ao diálogo.

As duas Coreias fizeram testes de mísseis com poucas horas de diferença, voltando a pôr a península no centro das atenções geopolíticas. Japão e Estados Unidos condenaram as ações de Pyongyang, enquanto o regime comunista respondeu pela irmã de Kim Jong-un às críticas do presidente sul-coreano.

As chefias militares sul-coreanas disseram que os mísseis balísticos do vizinho foram lançados do centro da Coreia do Norte e percorreram cerca de 800 quilómetros, informação complementada pela guarda costeira do Japão, ao afirmar que os mísseis aterraram nas águas entre o Japão e a península coreana.

Os disparos de quarta-feira à tarde ocorreram dois dias após a Coreia do Norte ter testado um míssil desenvolvido recentemente, e descrito pelo regime como uma "arma estratégica de grande significado". Para os analistas isso quererá dizer que o míssil terá capacidade para transportar ogivas nucleares. Segundo os relatos norte-coreanos, o míssil voou cerca de 1500 quilómetros, o que coloca ao alcance as instalações militares japonesas e norte-americanas.

Horas depois do teste do Norte, a Coreia do Sul anunciou que o seu presidente, Moon Jae-in, tinha acabado de assistir ao teste do primeiro míssil balístico lançado por submarinos (SLBM na sigla inglesa), fazendo da Coreia do Sul o sétimo país do mundo a operar essa tecnologia, junto dos Estados Unidos, Rússia, China, Reino Unido, França e Índia. A Coreia do Norte afirma ter desenvolvido um SLBM, mas os militares do Sul rejeitam essa alegação. Dizem que o Norte lançou mísseis balísticos de uma embarcação, e não de um submarino, segundo a agência sul-coreana Yonhap.

Além disso, Seul tem outras armas em desenvolvimento, caso de um míssil de cruzeiro supersónico, e um míssil de longo alcance a ser utilizado num novo avião a jato (KF-21 Boramae).

Moon Jae-in disse que as novas capacidades militares são um dissuasor contra as "provocações" de Pyongyang, o que levou o Norte a responder à "calúnia". Disse Kim Yo Jong, a irmã do ditador: "Uma atitude ilógica de Seul que descreve o seu comportamento semelhante como uma ação legítima de apoio à paz, e o nosso como uma ameaça à paz."

Com estes testes, Pyongyang retoma, seis meses depois, os testes de armamento. Em março interrompera uma pausa de um ano ao disparar dois mísseis balísticos de curto alcance para o mar, mantendo a tradição de testar os novos presidentes dos Estados Unidos com demonstrações de força.

Na terça-feira o enviado especial dos Estados Unidos à Coreia do Norte, Sung Kim, em visita a Tóquio, exortou os norte-coreanos a retomarem as conversações de desarmamento nuclear, abandonadas em 2019 depois de três encontros entre Donald Trump e Kim Jong-un, e disse que os Estados Unidos não tinham qualquer intenção "hostil" em relação a Pyongyang. Porém, mostrou não haver um milímetro de avanço ou recuo na linha de Washington, ao reiterar que os EUA não vão levantar as sanções previamente.

Na quarta-feira coube a um porta-voz do Departamento do Estado reagir aos mais recentes acontecimentos. À esperada condenação, porque o "lançamento constitui uma violação de múltiplas resoluções do Conselho de Segurança da ONU e representa uma ameaça para os vizinhos", juntou-se uma mensagem positiva: "Continuamos empenhados numa abordagem diplomática à República Popular Democrática da Coreia e apelamos para o seu empenhamento no diálogo."

Para Bong Young-shik, investigador do Instituto de Estudos Norte-Coreanos da Universidade Yonsei, em Seul, ouvido pela Voice of America, "a Coreia do Norte manifesta o seu descontentamento em relação à administração Biden, que se manteve numa política passiva em relação à Coreia do Norte, em nome de uma política cautelosa e colaborativa da Coreia do Norte".

Já o primeiro-ministro japonês Yoshihide Suga qualificou o lançamento de mísseis norte-coreanos de "ultrajante" e uma ameaça à paz. O momento escolhido por Pyongyang para os testes coincidiu ainda com a visita do ministro dos Negócios Estrangeiros da China à Coreia do Sul. Sendo Pequim o seu grande aliado a iniciativa surpreendeu os observadores. Para o perito Lee Byong-chul, do Instituto de Estudos do Extremo Oriente, em Seul, o timing pareceu "expressar descontentamento com Pequim" por não estar a prestar assistência económica suficiente durante a pandemia, comentou ao New York Times.

cesar.avo@dn.pt