Aliados definem rumo da ajuda à Ucrânia e da segurança europeia 

Kiev diz só ter recebido um décimo das armas prometidas pelo Ocidente horas antes de aliados debaterem na sede da NATO a assistência aos ucranianos.

O secretário-geral da NATO, Jens Stoltenberg, recebe os ministros da Defesa dos 30 países aliados, bem como da Ucrânia, Geórgia, Finlândia e Suécia, além do chefe da diplomacia europeia Josep Borrell, numa iniciativa que se prolonga até amanhã. Em paralelo, o secretário da Defesa norte-americano, Lloyd Austin, preside aos trabalhos da terceira reunião do grupo de contacto para a defesa da Ucrânia. A invasão russa e as suas consequências na segurança da Europa serão discutidas na reunião oficial, enquanto o grupo de contacto irá tomar decisões sobre a ajuda militar que Kiev tem pedido de forma reiterada nos últimos dias, numa altura em que as suas tropas tentam resistir nas últimas cidades não ocupadas de Lugansk.

Na véspera, Stoltenberg foi um dos sete comensais do jantar oferecido pelo primeiro-ministro neerlandês, Mark Rutte, em Haia, tal como António Costa ou a dinamarquesa Mette Frederiksen, num encontro informal cujo prato principal foi a guerra na Ucrânia. Mas foi na residência de verão do presidente da Finlândia, em Kultaranta, dois dias antes, que o dirigente norueguês proferiu umas declarações sobre a paz na Ucrânia que passaram despercebidas pela generalidade dos meios de comunicação.

Durante o debate promovido pelo presidente Sauli Niinistö, este disse que os finlandeses "nunca esqueceram" terem perdido parte da região da Carélia para a Rússia, pelo que "compreendem que é muito difícil para a Ucrânia, depois de todas aquelas vítimas, depois de tanta luta, desistir das suas terras, ainda que parcialmente". A esse propósito, Stoltenberg disse: "Que preço está [a Ucrânia] disposta a pagar pela paz? Quanto território? Quanta independência? Quanta soberania? Quanta liberdade? Quanta democracia se está disposto a sacrificar pela paz?". Interrogações que levaram as agências de notícias do Irão a noticiar que a NATO disse que cabe à Ucrânia decidir quanto território vai ceder à Rússia.

Sobre o tema da perda de território, o conselheiro do presidente ucraniano Mikhailo Podolyak afirmou que "enquanto alguns líderes europeus esperam um acordo de cessar-fogo com Moscovo para ajudar a aliviar os males económicos globais causados pela guerra, fazê-lo resultaria numa "guerra permanente", com a Rússia a ganhar concessões territoriais e a utilizá-las para invadir mais o território ucraniano em direção ao Ocidente".

Depois de Podolyak ter listado o número de armas que Kiev julga necessárias para terminar a guerra de forma favorável, a vice-ministra da Defesa Anna Malyar disse que o seu país recebeu apenas cerca de 10 % do que foi prometido. As contas da vice-ministra, não obstante, não batem certo com as disponibilizadas pelo seu governo e analisadas pelo site Oryx e pelo Financial Times. Por exemplo, na artilharia de longo alcance, que Kiev diz ser essencial, o jornal inglês contabiliza a entrega de mais de 250 obuses de calibre 150mm, quando Podolyak pediu mil; ou os mais de 50 lançadores múltiplos de foguetes fornecidos quando os ucranianos aspiram ter 300.

Também o presidente ucraniano, Volodymyr Zelensky, voltou a apelar para o fornecimento de material, em particular "armas de longo alcance e veículos blindados", tendo voltado a criticar o "comportamento contido" de alguns líderes europeus que "retardaram muito o fornecimento de armas". E concluiu: "Se não houver uma aceleração das entregas de armas, haverá estagnação, as pessoas continuarão a morrer. Se nos forem dadas armas, avançaremos." A Alemanha, que até ao momento não enviou armas pesadas, irá disponibilizar "em breve" sete obuses, depois de ter dado formação a militares ucranianos.

No terreno, enquanto a sul os ucranianos dizem ter avançado 20 quilómetros a caminho de Kherson, a única capital regional nas mãos de Moscovo, em Severodonetsk a batalha joga-se nas ruas, mas com as pontes destruídas, os ucranianos arriscam-se a ficar presos perante o avanço russo. O Ministério da Defesa da Rússia anunciou a abertura de um "corredor humanitário" para a retirada de 500 civis no complexo químico Azot.

Costa não quer criar "falsas expectativas"

O primeiro-ministro português mostrou-se favorável a uma "perspetiva europeia" para a Ucrânia bem como à ideia, avançada pelo presidente francês, de uma comunidade política europeia que possa juntar países que não estejam em condições de fazer parte da União Europeia, mas não tanto em conceder o estatuto de candidato a Kiev.

Em entrevista ao Financial Times, António Costa disse que "o melhor apoio que a UE pode oferecer à Ucrânia é manter a unidade", numa alusão a divisões sobre o tema entre os 27. Para o socialista, o estatuto de candidato não resolve qualquer problema no imediato e "poderá criar falsas expectativas que se tornem em amarga desilusão", pelo que advoga "menos discussões legais e mais soluções práticas", entre as quais a obtenção no Conselho Europeu de um "claro compromisso na assistência urgente e na criação de uma plataforma a longo prazo para ajudar à recuperação da Ucrânia". Costa escusou comentar a ameaça do governo britânico de ignorar o protocolo da Irlanda do Norte com a UE, que pode pôr em causa o acordo do Brexit, tendo dito que esse tema é para ser tratado entre Londres e Bruxelas.

cesar.avo@dn.pt

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