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29 JUL 2019
29 julho 2019 às 00h53

Soldado amputado recebe visita do chefe militar da República Centro-Africana

Chefe do Estado-Maior-General das Forças Armadas centro-africanas, general Zéphirin Mamadou, inicia nesta segunda-feira visita oficial a Portugal.

Manuel Carlos Freire

O soldado comando Aliu Camará, gravemente ferido durante uma operação militar na República Centro-Africana (RCA) e que obrigou à amputação das pernas, recebe na terça-feira a visita do principal chefe militar daquele país africano, soube o DN junto de fontes militares.

O general de brigada Zéphirin Mamadou, chefe do Estado-Maior-General das Forças Armadas (CEMGFA) da RCA, inicia nesta segunda-feira uma visita oficial de dois dias a Portugal a convite do homólogo português, almirante Silva Ribeiro, confirmou ao DN o seu porta-voz, comandante Santos Serafim.

Santos Serafim escusou-se a confirmar a ida do general centro-africano ao Hospital das Forças Armadas (HFAR), mas fontes de outros ramos com conhecimento do programa da visita afirmaram ao DN que o encontro com Aliu Camará consta da agenda e está previsto para terça-feira.

Aliu Camará ficou gravemente ferido a 13 de junho, durante a deslocação da coluna militar onde seguia como apontador numa viatura Humvee que se despistou e capotou. Retirado de helicóptero para o hospital da ONU em Bangui, onde foi necessário amputar-lhe as pernas, o militar do 5.º contingente das Forças Armadas (FA) na RCA foi repatriado horas depois para Lisboa e no dia seguinte estava internado no HFAR.

A visita do CEMGFA da RCA junta-se às que o soldado comando, de origem guineense, tem recebido ao longo das últimas semanas por parte de responsáveis políticos - Presidente da República, ministro da Defesa - e militares ou figuras públicas como o futebolista Pizzi ou a antiga campeã olímpica Rosa Mota.

Estas visitas acabam, no entanto, por estar condicionadas à situação clínica de Aliu Camará, observaram as fontes, uma das quais precisou que o militar já tem uma perna cicatrizada. Contudo, na última semana havia alguma restrição à presença de visitantes no quarto do militar por lhe ter sido detetada uma bactéria multirresistente, acrescentou um oficial.

General foi a Fátima

Esta visita do CEMGFA da RCA, que no fim de semana esteve informalmente em Fátima e Mafra, ocorre menos de um mês após o fim da presidência portuguesa da missão de treino da UE naquele país africano, exercida durante ano e meio através do major-general Hermínio Maio.

Dado esse contacto "próximo e regular" dos militares portugueses com os da RCA, tanto na formação e treino como em operações combinadas de patrulha ao longo daquele país, o convite do almirante Silva Ribeiro ao general de brigada Zéphirin Mamadou visou - além do objetivo diplomático de "fortalecer as relações" entre as Forças Armadas dos dois países - mostrar-lhe "como as FA portuguesas estão organizadas e como são formados e preparados os militares que desempenham atualmente funções" nas missões da ONU e da UE na RCA, indicou o porta-voz do EMGFA,

O programa da visita de Zéphirin Mamadou, um paraquedista que neste domingo cumpriu um ano como CEMGFA da RCA, inclui idas à base aérea de Sintra - onde a Força Aérea está a instalar as esquadras de helicópteros e sede da futura escola europeia dessas aeronaves - e ao quartel do Exército na Carregueira (Cacém), onde está instalado o Regimento de Comandos.

O general "manifestou interesse em visitar" instalações daqueles dois ramos e no âmbito da "edificação das Forças Armadas da RCA", adiantou o comandante Santos Serafim. "Procura-se assim identificar formas de cooperação e apoio", naquele país ou em Portugal, onde os militares portugueses possam contribuir para "o desenvolvimento das FA" centro-africanas.

Porém, frisou Santos Serafim, "não existe nada de concreto" em matéria de treino e formação a dar pelas FA portuguesas aos militares da RCA, que têm nas Forças Armadas francesas o seu "parceiro histórico", segundo o próprio Zéphirin Mamadou.

O porta-voz do EMGFA admitiu, contudo, que nas conversações bilaterais "podem ser identificadas atividades" relacionadas com o "desenvolvimento de competências técnico-tácticas" dos militares da RCA, bem como do seu "treino avançado, formação de formadores ou na área das informações".

Comandos regressam em setembro

Com o atual contingente das FA na RCA, cujos 185 militares partiram em março e regressam em setembro, Portugal já empenhou cerca de um milhar de efetivos naquele país africano, tanto na missão operacional da ONU como na de treino da UE (EUTM/RCA, sigla em inglês).

A Missão Multidimensional Integrada das Nações Unidas para a Estabilização da República Centro-Africana (MINUSCA) iniciou-se em 2014 e Portugal entrou no início de 2017, substituindo um contingente da França e atuando como força de reserva do comandante operacional da ONU em todo o território.

Com cada contingente do Exército a estar seis meses no terreno, nos quais se integram controladores aéreos táticos da Força Aérea, os primeiros dois e o último tiveram por base o Regimento de Comandos. Os dois anteriores eram de paraquedistas - como o próximo, oriundo do Regimento de Infantaria de Tomar (RI15).

O recurso aos paraquedistas tornou-se necessário devido à falta de efetivos no Regimento de Comandos, que é atualmente de 280 militares no conjunto das três categorias: 41 oficiais, 76 sargentos e 163 praças, segundo dados do Exército.

Os Comandos - que há precisamente um mês (29 de junho) celebraram o seu aniversário - são forças especiais do Exército criadas em 1962 e na sequência do rebentar da guerra colonial, em Angola. No total, esse ramo formou um total de 18 356 militares com essa especialidade - cuja recruta foi alvo de forte polémica nas últimas décadas, devido à morte de instruendos numa prova inicial de resistência física e com reduzido consumo de água.

Essa polémica foi uma das principais causas que levaram à extinção do Regimento de Comandos em 1993. Reativado em 2002, regressaram as mortes de instruendos, que em setembro de 2016 levaram a suspender o recém-iniciado curso e a rever de alto a baixo todos os referenciais dessa formação.