Política
27 setembro 2021 às 22h11

Derrota de Medina abre mais o caminho para Pedro Nuno Santos

António Costa perdeu em Lisboa um dos seus candidatos favoritos à sua sucessão. Pedro Nuno Santos, por ora em silêncio, fica mais forte para um dia disputar a liderança.

João Pedro Henriques

É certo que o caso das informações prestadas pela Câmara de Lisboa à Embaixada da Rússia sobre ativistas anti-Putin já tinha fragilizado Fernando Medina.

Agora, porém, a sua inesperada derrota face à candidatura de Carlos Moedas (PSD) - vitória essa que nenhuma sondagem anteviu - afasta-o definitivamente de qualquer sonho de um dia se poder candidatar à liderança do PS, nomeadamente no processo de sucessão de António Costa, provavelmente já dentro de dois anos, se o líder socialista decidir que não volta a recandidatar-se, uma hipótese que o próprio alimentou numa entrevista recente ao Expresso.

A derrota de Medina torna assim mais larga a avenida que há muito tempo é percorrida em direção a uma candidatura à liderança pelo atual ministro dos Transportes e da Habitação. Pedro Nuno Santos vai cultivando a sua influência crescente no aparelho do PS e nestas autárquicas fez questão de ir ao terreno apresentar candidaturas de muitos dos seus camaradas. O ministro representa uma visão do PS mais encostada à esquerda - e mais ancorada na ideia de diálogo com o BE e com PCP, de que foi, de resto, o principal pivô operacional na legislatura 2015-2019. Medina, por seu turno, está ideologicamente mais colocado ao centro, numa perspetiva por vezes mesmo meramente tecnocrática e pragmática.

Do ponto de vista de António Costa, esta não parece ser no entanto a solução ideal. O líder socialista e primeiro-ministro não tem apreciado com excessivo entusiasmo a frontalidade com que Pedro Nuno Santos assume as suas ambições de lhe suceder na liderança. No penúltimo congresso do PS, em maio de 2018, sentiu-se mesmo obrigado a enviar um recado claro aos seus delfins, visando travar a emergência, com tanta antecedência, de lutas fratricidas: "Aviso já que não meti os papéis para a reforma!" No domingo passado, ao votar, mostrar-se-ia um pouco mais enigmático dizendo que esta não seria "seguramente" a sua última campanha eleitoral.

Não terá sido aliás por acaso que neste seu segundo governo lhe ofereceu uma das pastas mais difíceis, a dos Transportes, ficando com a tutela de dossiês potencialmente incendiários para a sua carreira, o mais importante dos quais será o da TAP. Além do mais, com este movimento, Costa afastou Pedro Nuno Santos do lugar de dinamizador quotidiano do espírito da geringonça, solução de que foi (e é) grande entusiasta.

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Afastado Medina, cabeça-de-cartaz no PS mais centrista, emerge mais forte, desse lado, a hipótese de uma candidatura da atual líder parlamentar do PS - e antiga secretária-geral adjunta -, Ana Catarina Mendes.

Outra hipótese que tem sido referida - e Costa gosta sempre de dizer que a próxima liderança do PS pode ser no feminino - é a da sua ministra da Presidência, Mariana Vieira da Silva. Terá porém o handicap de não ter muitas ambições nesse sentido nem de alimentar uma relação profunda com o aparelho do PS. Mariana Vieira da Silva sempre esteve muito virada para a governação e muito pouco para o PS, ao contrário tanto de Pedro Nuno Santos como de Ana Catarina Mendes, profissionais da política partidária pura e dura formatados, ambos, na escola da Juventude Socialista. Há semanas, no último congresso do PS, Costa resolveu divertir-se pondo mais uma hipótese em cima da mesa - a de Marta Temido, ministra da Saúde -, mas entre os socialistas ninguém parece levar este cenário muito a sério.

Feitas as contas, o PS venceu pela terceira vez consecutiva as eleições autárquicas - mais votos, mais mandatos, mais presidentes de câmara e mais presidentes de junta - mas estando em perda face a resultados anteriores.

Os socialistas conquistaram no domingo a presidência de 148 câmaras - que são afinal apenas menos 12 do que as 160 conquistadas em 2017 (o melhor resultado autárquico de sempre do partido). A derrota de Medina acabou assim por exponenciar um resultado que nada de dramaticamente grave teria caso os socialistas tivessem conseguido aguentar Lisboa.

Para o próprio Pedro Nuno Santos os resultados, no entanto, também não foram muito brilhantes, se tivermos em conta o seu distrito natal, Aveiro. Os socialistas tinham aí duas câmaras de desvantagem face ao PSD e agora essa desvantagem aumentou para cinco câmaras (nove para os sociais-democratas e quatro para os socialistas). A conquista de Espinho ao PSD não apagou três perdas importantes dos socialistas: Castelo de Paiva, Mealhada e Sever do Vouga.

Pedro Nuno pode no entanto invocar que o seu distrito não foi o único onde o PS perdeu. Em Bragança a relação de forças com o PSD também se inverteu, a favor do PSD. E o mesmo aconteceu também na Guarda e ainda na Madeira.

joao.p.henriques@dn.pt