Política
28 maio 2022 às 05h00

Que partido herda o sucessor de Rio? E que desafios terá de enfrentar?

Os militantes escolhem este sábado entre Luís Montenegro e Jorge Moreira da Silva para conduzir os destinos do partido nos próximos dois anos. Uma maioria absoluta do PS e dois partidos novos à direita, IL e Chega, obrigarão a quem ganhar a uma liderança exigente e criativa.

Quem é Luís Montenegro?

Luís Montenegro, advogado, atualmente a trabalhar no setor privado, foi autarca. Primeiro membro da assembleia municipal e vereador da Câmara de Espinho. Foi eleito deputado nas legislativas de 2002, onde teve mandato até 2019. Entre 2011 e 2017 foi o escolhido para liderar a bancada social-democrata, onde ganhou forte protagonismo. No PSD desenhou um caminho de confronto com Rui Rio, ao ponto de ainda em 2019 ter desafiado a liderança e obrigado o então presidente do partido a apresentar ao Conselho Nacional do PSD uma moção de confiança na direção (que ganhou). No ano seguinte, Montenegro enfrentou mesmo Rio (e Miguel Pinto Luz) em diretas, embora tenha perdido essa batalha. Remeteu-se aos bastidores e esperou pela oportunidade certa para reaparecer.

Quem é Jorge Moreira da Silva?

Jorge Moreira da Silva, engenheiro eletrotécnico, foi líder da JSD entre 1995 e 1998. No ano seguinte, concorreu nas listas do PSD ao Parlamento Europeu, onde foi eurodeputado até 2003 (destacou-se com os relatórios sobre as alterações climáticas), altura em que Durão Barroso o chamou para a secretaria de Estado da Ciência e Ensino Superior. Já nas legislativas de 2005, que deram a maioria absoluta a José Sócrates, foi eleito deputado, mas o então Presidente da República Cavaco Silva convidou-o para ser consultor para a Ciência, Ambiente e Energia. Três anos depois, abandonou esse cargo para assumir outro no Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento. Em 2011 fundou um think-thank - Plataforma para o Crescimento Sustentável e foi escolhido por Passos para a direção do partido. Em 2013 assume a pasta do Ambiente no executivo de coligação PSD/CDS e é reconduzido no governo saído das legislativas de 2015, cujo programa acabou chumbado no Parlamento e caiu. Em 2016 é nomeado diretor-geral de Desenvolvimento e Cooperação da OCDE, o que o leva a abandonar a vice-presidência do PSD. O seu nome foi falado várias vezes como potencial candidato à liderança, mas nunca se imiscuiu nas guerras internas.

Qual a afinidade que os dois candidatos têm no partido?

São literalmente da mesma geração, dizem-se "amigos" e apenas um ano os separa. Ambos cresceram dentro do PSD, em responsabilidade e funções, no consulado de Pedro Passos Coelho, embora a formação e o percurso de ambos seja divergente. Luís Montenegro tem 49 anos e Jorge Moreira da Silva 50 anos.

Com que apoios chegam a esta eleição?

Luís Montenegro chega a esta eleição a fazer quase o pleno das principais estruturas do PSD. Os líderes das distritais, incluindo as das maiores como Braga (Paulo Cunha), Lisboa (Ângelo Pereira) e do Porto (Alberto Machado) estão ao lado do antigo líder parlamentar social-democrata. Montenegro recebeu ainda o importante apoio do líder histórico do PSD/Madeira, Alberto João Jardim e do presidente do governo regional da região autónoma, Miguel Albuquerque. O candidato continua a ter como braço direito Hugo Soares, que lhe sucedeu na liderança parlamentar da bancada laranja.

Jorge Moreira da Silva não tem estas figuras gradas do PSD, mas no terreno conseguiu ter parte da máquina que ajudou Rui Rio na vitória nas últimas eleições diretas contra Paulo Rangel. Entre estas figuras está Salvador Malheiro, presidente da Câmara de Ovar e vice-presidente do partido e ex-líder da distrital de Aveiro, e João Montenegro, secretário-geral adjunto do PSD. O candidato tem ainda a seu lado figuras importantes do partido, como o seu militante número um, Francisco Pinto Balsemão (mandatário nacional da sua candidatura), Manuela Ferreira Leite, Mota Amaral, Miguel Poiares Maduro. Arlindo Cunha, António Capucho, Ângelo Correia, Silva Peneda e Carlos Pimenta.

Que universo de militantes pode votar?

Para as diretas de hoje podem votar apenas cerca de 45 mil militantes, os que pagaram as quotas para o fazer. Um universo eleitoral dos mais baixos desde sempre em eleições internas no partido, que nas últimas entre Rui Rio e Paulo Rangel, em novembro de 2021, também já foi muito baixo, apenas com 47 mil votantes. Os dados disponibilizados pelo site oficial do PSD o pagamento das quotas pela distribuição nacional, foram os militantes do Porto os que mais aderiam ao pagamento das suas quotas, com 17% a fazê-lo, seguido dos de Braga (14,61%), de Lisboa (12,63) e Aveiro (10,27%).

E onde podem votar os militantes?

Os militantes podem votar nas estruturas do partido, nas concelhias e cada mesa de voto terá representantes dos dois candidatos, à semelhança do que acontece com as eleições nacionais.

Quando se realizará o congresso de legitimação do novo presidente social-democrata?

O líder que sair destas diretas só assumirá o mandato em congresso, que legitima a eleição. A 40.ª reunião magna do partido realiza-se 1,2 e 3 de julho, no Coliseu do Porto, onde será a aprovada a moção de estratégia de Luís Montenegro ou Jorge Moreira da Silva.

Que partido encontrará o vencedor das eleições diretas?

O vencedor das eleições encontra um partido que todos assumem estar "bastante desmobilizado", apesar de a vitória de Carlos Moedas na Câmara de Lisboa, nas autárquicas de 2021, ter dado aos sociais-democratas a esperança de um bom resultado nas legislativas de janeiro de 2022. Mas foi um banho de água fria quando os resultados foram divulgados e o PS conquistou a maioria absoluta pedida por António Costa. O PSD ficou-se por uns escassos 27,67% que não deu margem a Rui Rio para se manter ao leme do partido. Ainda assim, Rio decidiu fazer todo o processo de transição de modo lento, pelo que o novo governo começou em funções e aprovou o Orçamento de Estado para este ano sem um novo rosto no principal partido da oposição.

Que poder tem o PSD a nível autárquico e nos governos regionais dos Açores e da Madeira?

Embora tenha perdido as eleições legislativas, o PSD é ainda uma importante força autárquica - a começar pela câmara de Lisboa - com 113 municípios (PS conquistou 148). Tem também a liderança dos dois governos regionais da Madeira e dos Açores, o primeiro presidido por Miguel Albuquerque e o segundo por José Manuel Bolieiro.

O maior desafio do novo líder é unir o partido?

Se não for a maior tarefa, será seguramente uma das mais importantes, depois dos últimos anos de guerras internas. Luís Montenegro envolveu-se nelas contra Rui Rio, mas já prometeu ter condições para a pacificação interna. Jorge Moreira da Silva esteve sempre mais equidistante e quando falou ou criticou algum posicionamento não verteu isso para uma contestação aberta à liderança. Também ele promete unir o partido e dar espaço aos melhores.

Como gerir a oposição perante uma maioria absoluta do PS?

Este é, sem dúvida, o maior desafio com que o novo presidente do PSD ser irá confrontar. Uma maioria absoluta de quatro anos não é pera doce para a oposição. O novo líder terá de encontrar formas criativas para contrariar o governo de António Costa e dar a conhecer uma alternativa de poder aos portugueses. Sendo que daqui a dois anos terá novamente de se confrontar com nova eleição interna e já com o resultado das europeias de 2023 às costas. E ambos candidatos apontam para vitórias já nesse ato eleitoral, em que o PS levou a melhor em 2019, com 33% dos votos, contra 22% do PSD.

Não ter mandato como deputado é um handicap para o líder?

Sem dúvida que a Assembleia da República é um palco privilegiado para os partidos fazerem oposição ao governo e o facto das lideranças terem assento parlamentar faz toda a diferença. Nem Luís Montenegro nem Jorge Moreira da Silva integraram as lista do partido às legislativas e não têm mandato para assumir. Mas não é inédito que um líder social-democrata esteja arredado do Parlamento. Torna é um pouco mais difícil o confronto com o primeiro-ministro.

Gerir uma bancada que foi escolhida por Rui Rio é um problema?

Apesar de a bancada parlamentar ter sido escolhida por Rui Rio e a própria liderança parlamentar, Paulo Mota Pinto, ter sido eleita durante o seu consulado, nada faz prever que o conjunto de deputados venha a ser um problema para a nova liderança. Muitas das figuras com mais peso politico, sobretudo as que tinham feito parte do governo de Pedro Passos Coelho, já não estão na AR e mesmo que estivessem conviveriam bem tanto com Montenegro como com Moreira da Silva.

Como se irá afirmar o PSD perante as duas novas forças de direita, Iniciativa Liberal e Chega?

Uma realidade que irá pesar decisivamente nesta nova era PSD é precisamente o facto de ter dois novos partidos à direita com peso parlamentar - e com os líderes sentados entre os deputados, João Cotrim Figueiredo (IL) e André Ventura (Chega) - e que vão disputar o espaço de oposição ao governo. "Começa o inferno, mas também pode ser uma oportunidade", disse na SIC Marques Mendes, antigo líder do partido. O inferno era esse confronto com a maioria absoluta , mas também com o desafio perante as duas novas forças. A oportunidade é de o PSD conseguir manter a sua identidade e reconquistar o espaço de centro-direita que também lhe deu duas maiorias absolutas na altura do cavaquismo.

paulasa@dn.pt