Internacional
27 setembro 2021 às 01h43

Scholz melhor do que Laschet, mas ambos dizem ter mandatos para suceder a Merkel

Os sociais-democratas venceram com uma curta vantagem e os conservadores tiveram o pior resultado de sempre. Mas isso não impediu que ambos os candidatos a chanceler alegassem ter o mandato para formar governo. Partidos querem coligação até ao Natal.

Os dois principais candidatos a chanceler alemão, o social-democrata Olaf Scholz e o conservador Armin Laschet, reclamaram ter um mandato para formar o próximo governo e suceder a Angela Merkel. Apesar do empate a 25% na sondagem à boca das urnas, o Partido Social Democrata (SPD) surgia ontem à noite ligeiramente à frente da aliança entre a União Democrática Cristã (CDU) e os bávaros da CSU na contagem de votos. Mas ainda é cedo para saber que coligação vai sair das eleições e quem sucede a Merkel, há 16 anos no poder.

"Vai ser uma longa noite eleitoral", admitiu Scholz na primeira reação, congratulando-se com a subida do partido nas urnas - tiveram 20,5% em 2017 e ontem estavam com 25,8%. "O SPD está a fazer melhor do que há muito tempo. É um grande sucesso", referiu o candidato, dizendo acreditar que os alemães mostraram que querem "uma mudança no governo" e "querem que o chanceler seja Olaf Scholz". O atual vice-chanceler e ministro das Finanças disse que é preciso esperar pelos resultados finais das eleições, "mas depois começaremos a trabalhar".

Momentos antes, Laschet tinha falado aos apoiantes da CDU. "É uma situação extraordinária. Ainda não há números certos. Estamos taco a taco", disse o líder dos conservadores, depois de agradecer a Merkel que estava também no palco. "Era claro que sem ela ia ser uma corrida eleitoral apertada", admitiu o também chefe do governo da Renânia do Norte-Vestefália.

A CDU teve o pior resultado de sempre, tinha 24,1% ontem à noite, tendo sido o partido que sofreu a maior queda desde 2017 (quando teve 33%). "Não podemos estar felizes com este resultado", afirmou Laschet, dizendo contudo ter um mandato para formar uma coligação. "Faremos o nosso melhor para formar um governo", concluiu no seu discurso. Os conservadores perderam inclusive para os sociais-democratas no distrito eleitoral que, desde 1990, elegia Merkel para o Bundestag.

Na tradicional mesa-redonda em que os líderes ou candidatos de todos os partidos participam na noite eleitoral, Scholz e Laschet defenderam negociar uma coligação de governo até ao Natal. Contudo, disseram também que o que importa é ter uma coligação que funcione, não apenas que tem os números. "Só nós os dois não será suficiente. Penso que terá de ser de três partidos. Mas vamos esperar que todos os votos sejam contados", disse Scholz sobre as negociações que se avizinham e que devem durar semanas ou meses.

Numa das sondagens à boca das urnas, da empresa Forschungsgruppe Wahlen, 48% dos inquiridos disseram preferir o social-democrata Scholz para chanceler, com apenas 24% a escolherem o conservador Laschet e 14% a optarem pela candidata dos Verdes.

Na hora de fazer coligações, será necessário olhar para os resultados dos restantes partidos. Os Verdes, que pela primeira vez apresentaram um candidato a chanceler, foram terceiros, com 14,6%. Seguiram-se os liberais do FDP, com 11,5%, e a extrema-direita da Alternativa para a Alemanha (AfD, na sigla em alemão), com 10,5%. O Die Linke (esquerda, que inclui ex-comunistas) sofreu para garantir que continuava a ter influência no Bundestag, tendo 4,9%.

Annalena Baerbock, colíder e candidata dos Verdes, congratulou-se com o "melhor resultado na história" do partido. "Concorremos pela primeira vez para moldar este país como uma força de liderança", disse. "Queríamos mais", referiu, admitindo erros da sua parte e do partido. Os Verdes chegaram a estar à frente nas sondagens, após a candidatura de Baerbock ser anunciada, mas a sua inexperiência em cargos de governo (é deputada) contribuiu para o desaire, depois de serem encontrados pequenos erros no seu currículo e casos de plágio no seu último livro.

Ainda assim, os Verdes podem ser essenciais para a formação de uma coligação de governo, com Baerbock a dizer que tem um claro mandato para garantir que a agenda climática será essencial no próximo executivo. Os "fazedores de reis" podem contudo ser os liberais do FDP. O líder do partido, Christian Lindner, congratulou-se com "um dos melhores resultados" eleitorais da história". E mostrou-se aberto a uma coligação que inclua também os Verdes, sugerindo até que os dois partidos deviam falar primeiro e chegar a um acordo antes de decidir quem apoiariam - a CDU/CSU ou o SPD.

"O que une os Verdes e o FDP é que ambos liderámos campanhas eleitorais independentes. Ambos nos opusemos, de perspetivas diferentes, ao statu quo da grande coligação [entre a CDU/CSU e o SPD]", disse Lindner. "Os partidos da grande coligação, por outro lado, não fizeram qualquer ganho em conjunto comparado com as últimas eleições. E é por isso que não pode haver mais do mesmo na Alemanha. É hora de um novo começo", referiu. Lindner disse querer negociar "com todos os partidos democráticos" - fórmula usada normalmente para excluir a extrema-direita, que continua a ser rejeitada por todos os outros partidos.

A extrema-direita da AfD não foi além dos 10,5%, abaixo do registado há quatro anos, mostrando que terá provavelmente atingido o máximo de apoio possível. O candidato a chanceler, Tino Chrupalla, falou num "resultado sólido" e na consolidação da "base de eleitores". A colíder Alice Weidel defendeu que "apesar das profecias de ruína", a AfD "não foi votada para fora do Bundestag".

No outro extremo, a noite não foi fácil para o Die Linke. No complexo sistema eleitoral, os alemães votam duas vezes. Uma para eleger diretamente os representantes dos 299 círculos eleitorais, outra para determinar a proporção de lugares que têm no parlamento (cujo número de deputados não é fixo). Se não chegasse aos 5% ou elegesse um mínimo de três representantes diretos, o partido arriscava ficar sem força e não ter impacto no Bundestag e numa eventual coligação à esquerda com o SPD e os Verdes.

As urnas fecharam às 18h00 na Alemanha (17h00 em Lisboa) e a contagem de votos prosseguia pela noite fora. Seis horas depois, as projeções apontavam para um Bundestag com 730 deputados (durante a campanha falou-se que este número poderá ultrapassar os 900). Destes, 205 deputados seriam do SPD, 194 da aliança entre CDU e CSU, 116 dos Verdes, 91 do FDP, 84 da AfD, 39 do Die Linke e um de um partido regional. Os números devem contudo mudar, pelo que as contas para a formação de coligações ainda não eram ontem totalmente claras.

Às 14h00 a participação estava ligeiramente abaixo da registada em 2017, com 36,5% dos eleitores a votar, comparando com 41,1% há cinco anos. Contudo, esse valor não incluía os números de votos por correio, que se esperava pudessem chegar aos 40% ou até 50% do total, batendo os recordes anteriores. A pandemia de covid-19 terá ajudado a que os alemães optassem por fazer essa escolha. Há cinco anos, 29% dos eleitores votaram por correio e, no final do dia, a participação foi de 76,2%. Ontem, a estimativa era que a participação subisse para os 78%.

susana.f.salvador@dn.pt