19 ABR 2021
18 abril 2021 às 22h16

"No dia em que Pedro Passos Coelho considere voltar estarei na primeira fila"

A Câmara de Cascais distingue-se pelas medidas de combate à covid-19, mas Carlos Carreiras garante que não é um campeonato. Candidato ao seu último mandato, o social-democrata parte com a certeza de que a maioria dos eleitores tem sobre ele opinião positiva. Positiva é também a avaliação que faz da gestão da pandemia pelo governo até agora.

Hoje começa a terceira fase de desconfinamento. Como acha que tem corrido até agora e como avalia a gestão que o governo tem feito da pandemia?
O desconfinamento tem corrido bem, tem sido um processo de aprendizagem que já ultrapassou um ano. A grande questão que se coloca neste momento é se não entra uma estirpe nova, com outra capacidade de contágio. Mas até agora o desconfinamento está a correr bem. Em relação à gestão do governo, eu assumi, desde o início da pandemia, imaginar o quanto é que não seria grave para quem tem de tomar decisões num plano nacional. E, portanto, não me pareceu que deveria fazer críticas ao governo. Quanto muito dar sugestões. E, nessa perspetiva, com algumas situações pontuais que certamente o próprio governo terá avaliado e corrigido, o processo tem decorrido de uma forma positiva. Utilizei uma perspetiva que costumo utilizar noutras circunstâncias. Peço aos colegas do Arquivo Histórico Municipal para me darem informação do que terão sido decisões de outros que estavam na mesma posição em que eu estou hoje. E aprendi muito. Aconselhei-me com academias, com as universidades, com quem tinha conhecimento. Aconselhei-me também com oficiais das Forças Armadas, porque desde o princípio se falava que isto era uma guerra. O governo tem tomado decisões que eu tenho avaliado positivamente, mesmo que uma ou outra não seja exatamente aquilo que seria o objetivo do governo ao tomá-las.

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A Câmara de Cascais tem-se distinguido pela resposta à covid-19. Uma lista do Tribunal de Contas indicava até que foi a autarquia que mais gastou com a pandemia. Que medidas destaca entre as muitas que tomou neste último ano?
É verdade isso que está a dizer do Tribunal de Contas, embora nós nunca consideremos que isto seja um campeonato. Mas há todo um conjunto de investimento que a Câmara de Cascais fez, e que muitas câmaras do país fizeram - o poder autárquico teve e está a ter um papel absolutamente fundamental no combate à pandemia. Nós tivemos algumas decisões até mal compreendidas numa fase inicial. Porque isto passou por várias fases. Há uma fase em que não havia equipamentos de proteção individual em lado nenhum - eu tive pedidos diretos, nomeadamente de ministros, para abastecer serviços que dependiam desses ministérios. Nós fomos os primeiros a conseguir fazer chegar a Portugal uma grande encomenda de equipamentos de proteção individual, que depois cedemos às outras câmaras da Área Metropolitana de Lisboa que se manifestaram interessadas. Depois foi a questão de perceber que isto ia durar bastante tempo. Ou seja, uma das coisas que se tinha que garantir era que tinha capacidade de perpetuidade, por exemplo, na questão das máscaras. E por isso tomei a decisão de comprar máquinas para fabricar máscaras. Depois temos vindo a evoluir. Desde encontrar logo desde muito cedo um local para isolar aqueles que estavam infetados e que não tinham capacidade de isolamento nas suas casas. Fomos os primeiros a avançar com centros de testagem maciça. Até agora estarmos a fazer também a cedência para os casos positivos de oxímetro e termómetro para melhor serem acompanhados pelos médicos, para não haver tanta sobrecarga sobre os hospitais. E estamos sempre nesta lógica de tentar encontrar soluções para problemas que possam vir a colocar-se a seguir.

O que é que o levou a fazer contactos com Rússia, Israel e China sobre a compra de vacinas? E como está esse processo?
Nós desenvolvemos, com base nas relações que a Câmara de Cascais tem e que são benefício de termos residentes no concelho que poderiam facilitar essas abordagens, vários canais com China, Estados Unidos, Israel e Rússia, a ver se era possível termos vacinas. Porque já todos percebemos que isto só se resolve quando houver uma generalização da vacinação na população, a tal imunidade de grupo. E, de facto, por falha dos próprios fornecedores, no âmbito do acordo da União Europeia, tem havido um adiamento da chegada de vacinas a Portugal. O governo de Moscovo mostrou-se positivo para esta medida. Nessa troca de correspondência, que fui comunicando ao governo, pôs-se a hipótese de nos poderem ser vendidas vacinas - neste caso, a Sputnik V, porque é aquela que estará mais próxima de certificação na EMA. E, ao mesmo tempo, perceber se era possível - porque percebemos que havia uma dificuldade de capacidade de produção - cederem-nos as vacinas e nós, através da patente, definirmos aqui também uma capacidade de produzir essas vacinas. Esses contactos foram-se estabelecendo e houve manifestação por parte do governo de Moscovo de nos dizer "sim, nós temos essa disponibilidade. Estamos mais limitados em vender as vacinas porque não estamos com capacidade de produção para tudo o que é necessário mas temos todo o interesse em poder ceder para vocês fazerem esse enchimento em Portugal". Fui mantendo o governo português, através do gabinete do primeiro-ministro, conhecedor da situação. Também tivemos conhecimento que o senhor ministro da Economia tinha feito uma identificação de 11 empresas em Portugal que poderiam intervir em várias fases da produção da vacina. Depois, o presidente da Câmara do Porto mostrou-se interessado nas vacinas. Outros colegas meus também estavam muito interessados. Mas sempre numa lógica de que isto não é uma questão municipal, por isso tem de ser uma questão colocada ao nível do governo.

O que têm gasto na pandemia vai ter efeitos no investimento no concelho?
Não. Uma das preocupações de início foi perceber que havia um conjunto de recursos que iriam estar em falta. E um dos recursos que iria estar em falta era o recurso financeiro para fazer face a tudo aquilo que vinha. Cascais tinha, e tem, uma capacidade de endividamento muito grande. A maior parte das câmaras tem essa capacidade de endividamento hoje bastante elevada. Mas havia uma chamada lei-travão que só permitia o endividamento, por ano, até 20% da capacidade total do endividamento. No Orçamento Retificativo o governo retirou essa lei-travão dos 20%, o que permitiu também ter uma outra expectativa. Neste momento nenhum investimento foi travado, quanto muito alguns foram adiados.

E que investimentos têm em curso? Esta semana vão anunciar o "Vida Cascais".
Nós temos dois grandes projetos que promovem a coesão territorial e promovem a coesão social. Um é termos transportes públicos rodoviários gratuitos. Agora vamos lançar algo também muito inovador e a que chamei o SL3S, que é um serviço local de saúde e de solidariedade social. Este serviço local de saúde vai permitir ter consultas gratuitas 24 horas por dia, 365 dias por ano, para os cidadãos. O que permitirá desanuviar os centros de saúde da pressão em que estão.

Qual é o balanço que faz dos seus dois mandatos e da experiência autárquica?
Faço obviamente uma avaliação positiva. Confesso que ser presidente de câmara tem sido o trabalho que mais divertimento me tem trazido, embora neste último ano e dois meses tenha estado a passar pelo maior desafio que já alguma vez tinha passado na minha vida. São poucos os que têm o privilégio de ter desafios de tal ordem que marcam as suas comunidades e eu aqui não tenho dúvidas de que enquanto presidente de câmara marquei claramente, e pela positiva, a comunidade de Cascais, não só nestes mandatos, mas especialmente neste tempo tão desafiante que temos passado neste último ano e dois meses.

E quais são as apostas para o terceiro mandato? Acredita que vai ganhar a câmara?
Não acredito que haja alguém que seja candidato a seja o que for que não diga que está convicto de que vai ganhar. Eu acredito que a avaliação, e tenho dados nesse sentido, que a maioria dos cascalenses faz sobre os meus mandatos é uma maioria positiva bastante confortável. Aliás, mais reforçada até em relação a eleições anteriores.

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E quais são os projetos para um terceiro mandato?
Essencialmente completar tudo aquilo que me propus fazer e que ainda não está concluído, de não criar ónus e passivos para aquele que me venha a suceder, seja do meu grupo partidário ou não. E lançar projetos nesta transição de mudança, que é de menos infraestrutura, menos equipamentos, mais e melhor prestação de serviços à população.

Há pouco falou da gestão que o governo tem feito da pandemia. Como avalia na generalidade o governo de António Costa?
Eu acho que este governo antes da pandemia sofreu uma espécie de aprisionamento voluntário. Digo aprisionamento porque, não tendo a maioria que lhe permita decidir sozinho, tem que ir buscar apoios, neste caso, a partidos mais radicais, que envolvem todo um conjunto de peias ideológicas que são negativas para o desenvolvimento. E, nesse sentido, tenho uma avaliação negativa. Ao mesmo tempo, esta fórmula de governo levou a que se extremassem os pontos radicais, quer na extrema-esquerda, quer na extrema-direita. E isso considero que, se já era perigoso antes de uma pandemia, mais perigoso se torna numa pandemia, pois estamos com uma pandemia económica e social, que vai prolongar-se por mais tempo do que a sanitária.

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E Rui Rio?
Não sou hipócrita. Por um lado, não tenho uma avaliação positiva da liderança do doutor Rui Rio. Por outro, sei claramente que, neste momento, qualquer crítica que eu formule vai em desfavor de muitos companheiros meus que estão a dar a cara pelo partido nos seus municípios para as autárquicas. E, portanto, não vou dar armas aos inimigos para derrotarem esses companheiros. Por isso, não farei nenhuma avaliação em geral. O que posso dizer é que, de uma forma geral, o PSD tem apresentado excelentes candidatos.

A questão das autárquicas é algo que conhece bem porque foi coordenador autárquico do PSD em 2017. Acha que o PSD vai conseguir um bom resultado este ano?
Tenho a noção clara das dificuldades que é dirigir um processo autárquico. Eu nas últimas eleições autárquicas tive essa responsabilidade a nível nacional, com a consciência clara de que não correu bem. Agora a pandemia veio criar uma dificuldade adicional, porque os presidentes de câmara que tiveram uma boa reação no combate à pandemia obviamente vão ter isso a seu favor. Portanto, estas autárquicas vão passar-se num momento muito atípico. E em relação às autárquicas, não foi nas últimas eleições que o PSD caiu. Na verdade, nós perdemos poucas câmaras em relação às eleições anteriores. Já tínhamos caído nas anteriores e nas anteriores às anteriores. Era um processo descendente, com a situação nova das candidaturas independentes. Muitas delas de independentes só tinham o nome, porque eram candidaturas de divergentes. Isso passou-se com o PSD, com o PS, passou-se com o Partido Comunista, sendo que no PSD teve um impacto maior.

Em fevereiro disse que Passos Coelho "não é passado, é presente". Ele é o líder de que o PSD precisa? De que o país precisa?
Eu tenho o maior respeito pelo doutor Pedro Passos Coelho e o que eu disse na altura também foi que no dia em que Pedro Passos Coelho considere que deve voltar à política ativa eu estarei na primeira fila a dar-lhe apoio, até como reconhecimento da importância que teve ao pegar num país completamente falido. E conseguir recuperar o país, com muita dor, com decisões muito difíceis, que naturalmente tiveram de afetar muita gente, mas sempre salvaguardando que já não era uma questão de redistribuir a riqueza, era uma questão de atenuar o impacto na pobreza. Isso Passos Coelho fez com grande mestria. O que não implica que não se reconheça que tenha tido uma ou outra decisão que, se fosse hoje, ele tomaria de forma diferente, mas é merecedor de todo o meu respeito.

Outra figura destacada do PSD é o Presidente da República. O que acha que podemos esperar do segundo mandato de Marcelo Rebelo de Sousa? Diz a tradição que, nos segundos mandatos, os presidentes são mais interventivos.
Tenho o privilégio de conhecer o professor Marcelo Rebelo de Sousa muito antes de ser candidato. E o senhor Presidente da República tem exercido os seus mandatos da mesma forma como viveu a sua vida. Não cabe ao Presidente da República ser o líder da oposição. Cabe ao Presidente da República ser o garante do respeito pela Constituição e exercer a sua magistratura de influência. E, nesse sentido, acho que o Presidente da República vai ser igual ao que foi no primeiro mandato. Qual é a variável que pode alterar esta situação? O comportamento do governo, as decisões do governo, as decisões da Assembleia da República.

ana.meireles@vdigital.pt