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15 FEV 2019
15 fevereiro 2019 às 06h23

Portugal, o nosso campo de batalha

José Kaliengue

Angola é um país grande, mas não o suficiente para a luta de galos, ou talvez tão grande que se espraia por Portugal e por outras nações. Como dizia o outro, para Angola o mundo é pequeno.

Veja-se como a luta angolana sobre o Banco Espírito Santo Angola já criou barricadas e está em fogo aberto em Portugal, com a tentativa de se envolver portugueses também, como se a estes não bastasse já a sua maka do BES, que deixou milhares de lesados que ainda hoje procuram reaver o seu dinheiro.

As falências do BES e do BESA estão a ser pagas por angolanos e portugueses contribuintes, nos dois países, e os culpados pavoneiam-se por aí esgrimindo razões.

Portugal, tal como por altura da guerra civil angolana, continua a ser um palco privilegiado de combate entre angolanos que não se entendem. Os ataques morais sucedem-se. Agora foi Álvaro Sobrinho a lançar uma saraivada de bombas a partir de Lisboa, mas desta vez contra a nação inteira, dizendo que os "angolanos roubaram três mil milhões de dólares aos portugueses". Ofendeu muita gente. O seu verdadeiro alvo, já se sabe, eram os generais Dino e Kopelipa e o governador do banco central angolano. Manuel Vicente também. Estes são todos famosos em Portugal, não há ano em que não surjam em uma ou duas revistas, ocupando entre seis e oito páginas com assuntos já sabidos de cor. Já não adianta ler. José Massano, o governador do banco central, tem o "azar" ter tido a obrigação, em duas vezes, de não reconhecer idoneidade a Álvaro Sobrinho para dirigir o Banco Valor, de que é acionista maioritário. Aqui entre nós, há quem diga que aquilo é dinheiro tirado do BESA.

Mas é engraçado como os angolanos tentam limpar a sua própria imagem e enlamear a dos seus adversários a partir de Portugal. Sempre.

E os momentos políticos em Angola e em Portugal vão cadenciando o baile. No tempo da guerra civil angolana a coisa era mais clara, havia MPLA e UNITA representados em Lisboa e portugueses do MPLA e da UNITA, segundo as suas simpatias. Agora, se as coisas ainda não estão claras, há pelo menos os que, calados, são simpáticos ao governo do presidente José Eduardo dos Santos e aqueles que não lhe perdoam. Tal como em Angola, em Portugal estão a emergir aqueles que, mesmo nos negócios, começam a atirar as culpas de tudo o que lhes correu mal em Angola para Eduardo dos Santos e para a sua equipa. Incluindo os que sempre se mantiveram silenciosos, aproveitando o momento sem turvar a água, e que agora se veem com menos oportunidades ou que as querem renovar com o novo poder e julgam que o devem sinalizar atacando o poder anterior.

Os empresários portugueses que tenham ou queiram ter negócios em Angola podem entender que atirar contra o passado é a senha para a simpatia do novo poder, e isto também poderá abrir guerra contra os fiéis do antigamente, se é que existe esta categoria entre gente de negócios.

Tivemos ativistas como Rafael Marques a ter espaço de comunicação em Lisboa para mandar recados a Luanda, assim como Luaty Beirão, por terem vedados para si os maiores canais de comunicação angolanos, como sempre fizeram questão de dizer, mas tivemos também António Luvualu e outros pró-governo a usar os mesmos púlpitos, não por impedimentos a qualquer canal, mas porque Portugal era, de facto, também um campo da batalha angolana. Continua a ser. Não sei se com audiência popular, mas há uma necessidade qualquer que o determina. Não há luta ou difamação angolana que não passe por Lisboa. Só que no caso de Sobrinho, que em Portugal também não tem boa fama, a reação intelectual angolana não foi com a coceira que outros provocaram, foi de indiferença, ou de indignação, quando houve reação. Vamos ver se atrai os seus adversários a Lisboa, mas não me parece que este seja o seu melhor campo para uma batalha, há o risco de acionar as minas que nele andou a semear.