Política
08 maio 2021 às 20h04

Já não será só o défice e a dívida. Bruxelas vai avaliar progresso social

Portugal tenta ainda fechar questão do salário mínimo europeu, mas França já aponta para 2022. Declaração do Porto quer que países passem da proteção para a criação de empregos

Paulo Ribeiro Pinto

A tradicional avaliação que Bruxelas faz das economias europeias terá novos critérios, onde vão estar um conjunto de indicadores sociais, no âmbito da Declaração do Porto que executa o Pilar Europeu dos Direitos Sociais, com metas definidas até 2030.

"O Conselho [Europeu] aceita que o semestre europeu não seja só um semestre de revisão dos critérios macroeconómicos, dos critérios de estabilidade financeira, mas passará a ser também uma avaliação do contexto social da União Europeia", afirmou o primeiro-ministro na conferência de imprensa que encerrou o encontro dos chefes de Estado e de governo dos 27, no Porto.

Ou seja, além das habituais metas do limite do rácio de 3% do produto interno bruto (PIB) e da dívida pública a 69% do PIB, também haverá um painel de indicadores sociais que contarão para a avaliação dos desequilíbrios dos países na apreciação semestral feita pelo executivo comunitário, mas desconhecem-se as métricas ou os efeitos práticos em caso de "chumbo" nestes indicadores.

O plano de ação do Pilar Europeu, apresentado pela Comissão Europeia (CE) em março, prevê três grandes metas até ao final da década: ter pelo menos 78% da população empregada, 60% dos trabalhadores a receberem formação anualmente e retirar 15 milhões de pessoas, cinco milhões das quais crianças, do risco de pobreza e exclusão social. A forma como são atingidas estas metas fica ao critério de cada país, no respeito pela soberania e pelo princípio da subsidiariedade.

É certo que as regras do Pacto de Estabilidade são já contestadas por economistas e alguns líderes europeus reconhecem a necessidade de uma revisão, tendo em conta que foram desenhadas nos anos 90 no século passado. A própria presidente do Banco Central Europeu, Christine Lagarde, já sinalizou a necessidade de alterar os critérios e medidas usadas. Para já, as normas estão suspensas ao abrigo da cláusula geral de salvaguarda até ao final deste ano, mas a CE propôs ao Conselho Europeu que apenas fossem restabelecidas em 2023. Ainda falta a decisão dos líderes dos 27 que deve ser tomada ainda este mês.

A Declaração do Porto, que foi adotada por unanimidade, define as áreas de atuação para empregos com melhores condições salariais, eliminação das desigualdades entre homens e mulheres, educação e qualificação e redução da pobreza e exclusão social.

No imediato, no período pós-pandemia, já há um objetivo claro dos líderes europeus: a criação de empregos, depois das medidas de apoio para travar o aumento do desemprego. "À medida que a Europa recupera gradualmente da pandemia, a prioridade será passar da proteção à criação de emprego e melhorar a qualidade do emprego", refere o documento final aprovado ontem no Palácio de Cristal, no Porto.

Mas, neste quadro, a criação de um salário mínimo europeu (ou salário justo) não ficou ainda fechada. "As presidências portuguesas têm um método de trabalho já muito consolidado: poucas declarações proclamatórias, muito trabalho com descrição, bons resultados", afirmou Costa quando questionado sobre a possibilidade de esta matéria não ser fechada durante a presidência portuguesa que termina no final de junho, acrescentando que em relação à "proposta de diretiva de salário mínimo estamos na fase do trabalho discreto". Uma declaração otimista que contrasta com as palavras do presidente francês Emmanuel Macron que atirou para 2022 a conclusão deste dossiê tal como dos direitos dos trabalhadores das plataformas eletrónicas.

No texto adotado no Porto, os 27 chefes de Estado e de governo deixam clara a necessidade de preservar a soberania dos Estados-membros.

"O nosso compromisso com a unidade e a solidariedade significa também garantir a igualdade de oportunidades para todos e que ninguém fique para trás", reafirmam os líderes europeus, no texto conjunto, mas fazem referência à soberania nacional quanto à forma de chegar às metas traçadas. "Estamos determinados em continuar a aprofundar a implementação do Pilar Europeu dos Direitos Sociais ao nível da União Europeia e a nível nacional, tendo devidamente em conta as respetivas competências e os princípios da subsidiariedade e da proporcionalidade", frisam. Um parágrafo que ganha relevância depois do aviso de 11 países a Bruxelas para que evite intromissão em matérias laborais e de educação.

paulo.pinto@dinheirovivo.pt