08 MAI 2021
07 maio 2021 às 22h59

"Estão a fazer-se estudos que testam a eficácia de um esquema misto de vacinas para a covid-19"

Ao fim de cinco meses de Plano de Vacinação contra a infeção por SARS CoV-2, o coordenador da Comissão Técnica da DGS, Válter Fonseca, diz que o balanço é francamente positivo e que Portugal tem razões para estar otimista, apesar de haver ainda muita informação que não se sabe em relação ao vírus. Sobre as vacinas aprovadas, os estudos continuam e os resultados poderão levar a novas recomendações.

Neste momento, há quatro vacinas aprovadas na União Europeia - a da Pfizer e da Moderna, à base de ARNmensageiro (Ácido Ribonucleico Responsável um novo tipo de imunizante através da transferência de informações do ADN), e a da AstraZeneca e a da Johnson & Johnson (J&J) ou Janssen (à base de um vetor viral que é o adenovírus). Todas foram avaliadas pelas autoridades do medicamento europeias.

Todas foram consideradas seguras e eficazes para todas as pessoas acima dos 18 anos, mas umas estão a ter maior visibilidade do que outras pelos efeitos adversos registados. É caso das vacinas ditas produzidas por adenovírus, Astra e J&J. Desde o início do processo de vacinação que na Europa e nos Estados Unidos da América foram registados fenómenos tromboembólicos (formação de coágulos) graves, alguns fatais, o que levou de imediato as mesmas autoridades que as tinham aprovado a suspendê-las, a investigar e a fazer recomendações.

Hoje, tanto uma como outra já voltaram a ser administradas, a da Astra acima dos 60 anos, para a maioria dos países da UE, incluindo Portugal, e a da J&J, acima dos 50 anos, no caso de Portugal. O coordenador da Comissão Técnica de Vacinação explica ao DN todas as dúvidas suscitadas por estas vacinas, o que ainda está a ser estudado e o que aí vem. Aliás, diz mesmo, que o futuro pode ser a combinação de vacinas diferentes.

Há uma semana Portugal impôs o limite dos 50 anos para a vacina da J&J, após ter sido detetada a formação de coágulos em mulheres mais jovens - oito casos nos EUA. Mas permite às pessoas abaixo dessa idade, que queiram a vacina, apanhá-la, desde que assumam a responsabilidade. Isto faz sentido? Porquê esta decisão?
Faz sentido haver uma recomendação que resulta de uma avaliação do benefício e do risco. Foi isso que aconteceu, porque quando Portugal e os outros países começaram a ser confrontados com a existência de fenómenos que, embora muitíssimo raros tinham alguma gravidade, alguns mesmo com um desfecho fatal, a Agência Europeia do Medicamento (EMA) iniciou uma avaliação de segurança muito rigorosa. Isto levou a que fossem ponderadas algumas variáveis como: o risco real da vacina nas várias faixas etárias da população, os fatores de risco mais associados, se havia ou não vacinas alternativas e qual o impacto destas variáveis nas decisões do plano global de vacinação. E o que resultou da avaliação da EMA foi que, de facto, deveria ser tomada uma precaução em relação à idade, que passou a configurar no resumo de características da vacina da Janssen (J&J) e que alerta para a ocorrência destes fenómenos raros, sobretudo em pessoas com menos de 50 anos.

Mas em relação a Portugal? Porquê esta decisão?
Portugal está, felizmente, numa situação de baixa incidência da doença. Tem vacinas alternativas e considerou-se que, até se conhecerem novos dados científicos, era adequado proteger toda a população e assumir uma ação cautelar perante a presença de algumas dúvidas. Não é uma decisão definitiva é uma atitude cautelar. E até serem conhecidos novos dados a DGS considerou ter de fazer uma recomendação com base, obviamente, no parecer técnico da Comissão Técnica de Vacinação contra Covid-19.

E em relação ao dar oportunidade aos mais jovens de escolherem esta vacina desde que assumam o consentimento autorizado?
A EMA reiterou que, no global, os benefícios desta vacina superam os riscos. Isto quer dizer que foram analisados todos os riscos e todos os benefícios, não olhando para o que são as particularidades de cada país, e que a vacina é segura, de qualidade e eficaz. Por isso, mantém-se aprovada para todas as pessoas com mais de 18 anos. Ou seja, isto quer dizer que, embora exista uma recomendação baseada numa análise de benefício e risco, que esta vacina deve ser administrada acima dos 50 anos, esta mantém-se aprovada para todas as idades. Por isso, foi considerado que uma pessoa devidamente informada sobre os seus benefícios e riscos poderia tomá-la, mesmo que tenha uma idade mais baixa.

DestaquedestaqueEm Portugal, a recomendação feita é muito clara: qualquer pessoa abaixo dos 50 anos não deve tomar esta vacina até serem conhecidos novos dados.

Não foi uma decisão tomada por ter de haver vacinas para as faixas etárias mais jovens?
As nossas recomendações são sempre em prol da segurança e da saúde pública. Esta recomendação tem por base uma análise técnica enquadrada na razoabilidade e no respeito pelas normas e conclusões da EMA.

Tendo em conta que os casos detetados relativamente à vacina da J&J foram nos EUA e em mulheres jovens, até aos 48 anos, que estariam a tomar anticoncecionais. O que se recomenda às mulheres?
Em Portugal, a recomendação feita é muito clara: qualquer pessoa abaixo dos 50 anos não deve tomar esta vacina até serem conhecidos novos dados. De facto, existem alguns dados, nomeadamente nos EUA, que mostram que algumas das mulheres estavam a tomar contracetivos, mas não ficou provado, nem nas avaliações feitas pelas autoridades norte-americanas nem nas da EMA que esse era um fator de risco causal com a ocorrência de fenómenos tromboembólicos. Portanto, nesta fase não se pode fazer esse tipo de associação.

Em relação à vacina da AstraZeneca, Portugal aguardou mais dados para saber o que fazer sobre a toma da segunda dose e, na semana passada, decidiu que as pessoas com menos de 60 anos que tomaram a primeira dose também podiam tomar a segunda, mas quem quisesse tomar outra vacina também o poderia fazer. Mais uma vez, faz sentido? É um registo diferente do que foi assumido inicialmente: quem se recusasse a tomar vacina da Astra teria de esperar por outra oportunidade. Como explica esta situação?
Não faço essa leitura. As vacinas da AstraZeneca ou da Jansen estão a ser utilizadas nas faixas etárias acima dos 50 e dos 60 anos em igualdade de circunstâncias com as outras vacinas, (Pfizer e Moderna). Em Portugal, sempre considerámos que todas as vacinas aprovadas previnem a covid-19 e que todas são úteis no combate à pandemia, mas houve uma avaliação da EMA em relação ao benefício e ao risco que aconselha, por prudência, que estas vacinas sejam dadas acima de determinada idade. Embora, como já disse, numa avaliação global mantenha as vacinas aprovadas acima dos 18 anos. Logo, as pessoas com idades fora do que é a recomendação da EMA, devidamente informadas, podem assumir a decisão de as querer tomar.

Mas como explica a segunda dose da AstraZeneca para os mais novos de 60 anos que já tinham apanhado a primeira dose?
Também foi uma questão avaliada pela EMA. A agência considerou todos os cenários possíveis - levar a segunda dose da Astra, esperar um pouco mais, não tomar uma segunda dose ou até fazer a segunda dose com outra vacina - mas atendendo que há poucos dados relativamente a estes cenários, a EMA manteve a recomendação de que a segunda dose fosse feita com a vacina da Astra, completando o esquema vacinal que foi estudado nos ensaios clínicos originais.

Mas Portugal dá hipótese aos menores de 60 de tomar outra vacina...
Por que essa é uma hipótese que está validada pelos estudos. Contudo, há estudos em curso sobre todos os cenários alternativos e cujos resultados conheceremos nos próximos dias ou semanas, ainda em maio. O que sabemos é que há plausibilidade biológica.

Destaquedestaque"Todas as vacinas estão a ser feitas contra a mesma proteína. Portanto, o sistema imunitário vai responder de forma muito semelhante. Isto permite-nos considerar como provável vacinas diferentes na primeira e na segunda dose. É esquema vacinal misto".

E isso quer dizer?
Que de acordo com a experiência com as vacinas no passado e com aquilo que é a forma do nosso organismo funcionar, em termos biológicos e do sistema imunitário, é plausível que haja uma boa resposta de uma vacina de outra marca quando é dada em segunda dose em pessoas que na primeira dose tomaram outra vacina. Mas isto acontece porque todas as vacinas aprovadas contra a covid-19 (Pfizer, Moderna, AstraZeneca e J&J) estão a ser feitas contra a mesma proteína. Portanto, o sistema imunitário vai responder de forma muito semelhante. Isto permite-nos considerar como provável que vacinas diferentes na primeira e na segunda dose tenham o mesmo resultado. É esquema vacinal misto. São estes estudos que estão praticamente a ser concluídos e que pensamos que rapidamente irão dar uma recomendação que defina melhor esta questão.

A recomendação da semana passada ainda pode ser alterada?
Claro. A segunda dose com vacina da AtraZeneca é sempre uma hipótese que está validada com o que diz a EMA. A alternativa é esperar por novos dados., quando estes chegarem clarificaremos a recomendação.

Então, porque foi tomada agora uma decisão?
Foi feita agora uma recomendação por estarmos muito próximos do início das segundas doses da vacina da AstraZeneca e pareceu-nos adequado e seguro seguir esta linha de raciocínio que coloca o cidadão como parte integrante da decisão - obviamente, que há um conjunto de dados para que o cidadão tome a sua decisão informada. Mas se esperássemos algum tempo por dados adicionais também seria seguro porque as pessoas estavam protegidas.

Como?
Portugal segue o intervalo recomendado entre as duas doses de 12 semanas, mas, nos ensaios clínicos originais da vacina da AstraZeneca, houve indivíduos que fizeram a vacina com um intervalo até às 26 semanas e quando levaram a segunda dose esta foi igualmente eficaz. As pessoas estavam protegidas. Esta era também uma atitude que se poderia utilizar se estivéssemos perante um grande nível de incerteza.

Dilatar o prazo entre as duas doses está a ser equacionado?
Para a vacina da AstraZeneca neste momento não há necessidade de o fazer. Estamos a usar o intervalo mais longo recomendado pela EMA, 12 semanas. Para a situação concreta das pessoas com menos de 60 anos, como sabemos que há dados que vão ser conhecidos nos próximos das dias é perfeitamente adequado esperar mais uns dias por uma recomendação mais clara sobre outras alternativas de segunda dose.

Sabe-se o tempo que vai ser necessário as pessoas abaixo dos 60 anos aguardar?
Não sabemos, mas não acreditamos que ultrapasse o que está estudado. Ou seja, a pessoa ter de esperar mais uma ou duas semanas até que os resultados dos estudos surjam. Nessa altura, voltará a ser colocada a possibilidade de apanhar segunda dose da Astra ou uma segunda dose de outra vacina alternativa.

Destaquedestaque"Cidadãos podem confiar nas autoridades e nos profissionais de saúde".

Considera que todas as questões relativas à vacina da AstraZeneca vieram de facto abalar a confiança das populações nos processos de vacinação?
Antes de mais deixe-me dizer-lhe que não há razões para haver desconfiança. Pelo contrário, o facto de terem sido detetados todos os fenómenos demonstra que as autoridades de saúde e do medicamento estão muito atentas e a monitorizar diariamente o que se passa com as vacinas, de forma a não colocar ninguém em risco. O sistema de vigilância permite-nos ter acesso à informação sobre o que está a acontecer com as vacinas muito rapidamente e há de imediato um escrutínio. Isto é um sinal de que os cidadãos podem confiar nas autoridades e nos profissionais de saúde.

O facto de vários países terem optado por soluções diferentes para as vacinas da AstraZeneca e da Janssem não aumentou a desconfiança? A UE não deveria ter imposto regras iguais para todos?
Obviamente que a UE tem sempre benefícios em ter estratégias uniformes nos vários Estados-membros, mas não podemos esquecer que há particularidades em cada um dos países. Como disse há pouco, a análise de benefício e risco de uma vacina depende da incidência da doença, da existência de vacinas alternativas e da fase do plano de vacinação em que cada um está. Nem todos os países estão numa fase uniforme, portanto é expectável que também possa haver adaptações à realidade de cada um.

Falou de estudos que estão a ser feitos e dos quais se espera resultados em breve, o que se prevê que aí vem?
São estudos que estão a ser realizados no Reino Unido sobre intercambialidade vacinal. Ou seja, são estudos que estão a avaliar um grupo de pessoas que está a ser testada para se aferir a eficácia de um esquema vacinal misto. Neste caso, as pessoas apanham a primeira dose da vacina da AstraZeneca e a segunda de outra vacina, nomeadamente de ARNm. O objetivo é apurar se a mudança de um esquema completo, com duas doses da mesma vacina, para um esquema misto, para vacinas diferentes, é igualmente eficaz. São estes os estudos que estão em curso e podem ser o futuro.

Não considera que a polémica à volta das vacinas da AstraZeneca e da Janssen, que são à base de adenovírus, está a levar à procura de mais vacinas à base de ARNmensageiro (Pfizer e Moderna)?
Não se pode dizer isso nesta fase. Todas as vacinas demonstraram ser de qualidade e seguras. Estamos numa fase intermédia, em que aguardamos novos dados, e até estes chegarem não podemos afirmar algo definitivo. Recordo que todas estas vacinas já deram provas na redução do número de infeções, na redução dos internamentos e da mortalidade por covid-19. Portanto, todas as vacinas devem ser utilizadas, são uma arma importante no controlo da pandemia no mundo.

Destaquedestaque"Qualquer medicamento tem efeitos adversos. Isto é algo que as pessoas têm de reconhecer. Não falamos de situações inéditas associadas só a estas vacinas".

Como se explica então que umas tenham efeitos adversos graves, como formação de coágulos, e outras não?
Em primeiro lugar, qualquer medicamento tem efeitos adversos. Isto é algo que as pessoas têm de reconhecer. Não falamos de situações inéditas associadas a estas vacinas. Todas as terapêuticas têm alguns riscos muito baixos. É preciso dizer isto muitas vezes para que as pessoas percebam que falamos de situações extraordinariamente raras. Por isso, não há diferenças em termos de efeitos adversos quando olhamos para umas vacinas e para outras. As vacinas são diferentes na forma como induzem o sistema imunitário a produzir anticorpos, ainda que estes sejam produzidos pela mesma partícula do vírus - daí o ter dito há pouco que a resposta do sistema imunitário é muito semelhante à administração de umas ou de outras. É o que se chama de plausibilidade biológica, poderem dar o mesmo nível de proteção mesmo que seja usado um esquema misto de vacinas. A forma como a vacina faz a indução do sistema imunitário para produzir anticorpos é que é um pouco diferente. Uma funciona através de ARN (caso Pfizer e Moderna) e a outra (AstraZeneca e J&J) através de um vetor viral que é o adenovírus. Mas ainda não está completamente estabelecido de que é esta mudança de plataforma tecnológica que está mais associada a uns fatores de risco do que a outros.

É isso que está a ser estudado ainda pelas empresas e pela EMA?
É. O que podemos dizer nesta fase é que já se percebeu que há um mecanismo cronológico. Isto é, o sistema imunitário desenvolve anticorpos contra plaquetas e outros constituintes do sangue que têm sido associados até ao momento à formação de coágulos, que é o fenómeno que tem sido notificado, mas esta é apenas uma hipótese científica que tal como outras hipóteses também é precoce assumir-se como definitiva na associação à plataforma da vacina.

É expectável que no próximo ano haja uma vacina portuguesa. É uma situação benéfica para os portugueses e para o plano de vacinação?
Todas as vacinas que demonstrem ter altos padrões de rigor científico de qualidade e segurança contra a covid-19 são vacinas válidas no combate à à pandemia.

Quanto ao Plano de Vacinação, qual é o balanço que faz?
Francamente positivo, Temos mais de três milhões de doses de vacinas administradas e os grupos de maior vulnerabilidade já com uma cobertura vacinal muito elevada. Estimamos que parte do controlo hoje da doença já reflete a vacinação. Por isso, há claramente razões para considerarmos que o balanço é positivo.

Destaquedestaque"Plano foi concebido em três fases tendo por base a distribuição de vacinas. E dissemos desde o início que seria dinâmico".

Foi um plano que teve várias alterações. Algumas, como o critério da idade, tinham sido pedidas por outros logo no início. Porque não foram inseridas logo no início?
Desde o início que dizemos que o plano era dinâmico, porque a única forma de planear perante a incerteza, que é o que temos vindo a fazer nesta pandemia, é ter um plano minimamente flexível que acompanhe a evolução do conhecimento científico e a evolução da situação epidemiológica, ao mesmo tempo que tem de lidar com a inevitabilidade do número de doses disponíveis a cada momento. E este plano foi concebido em três fases tendo por base a distribuição de vacinas. A primeira fase num cenário de escassez de vacinas, a segunda de transição, da escassez para a maior abundância, e a terceira de abundância. Para esta terceira fase já estava definido que o critério seria o de faixas etárias decrescentes, na primeira e na segunda isto não poderia acontecer por não haver vacinas para toda a população. Daí que a estratégia perante a escassez de vacinas tivesse levado à definição de grupos mais pequenos e com grande impacto em termos de mortalidade de internamentos. Assim, estabeleceu-se um limite em torno dos 50 anos sobre o qual foram construídas a fase um e dois. Mas em janeiro verificou-se um aumento muito significativo da incidência da doença acima dos 80 anos e foi necessário ajustar o plano de forma a vacinar rapidamente essa população, o que foi alcançado. Na segunda fase, verificámos não haver necessidade de fazer uma transição muito longa, o número de vacinas para Portugal ia aumentar rapidamente, passando-se de uma fase de escassez para a de abundância. Isto fez com que se revisse a estratégia vacinal introduzindo antecipadamente a vacinação prioritária por faixas etárias. Foi ajuste dinâmico do plano.

Isso quer dizer que estamos numa fase em que não temos de nos preocupar com a escassez de vacinas?
Neste momento, o que nos tem sido transmitido e segundo e o que está planeado, porque esta matéria é da competência da task force, é que temos previsão de vacinas em número suficiente para atingir dois objetivos: vacinar a quase totalidade da população portuguesa muito rapidamente

Daí o otimismo em relação à imunidade de grupo? Que pode ser atingida antes de tempo, no início o verão?
Tem-se dito que a imunidade grupo é atingida para a infeção de SARS CoV-2 em torno dos 70% da vacinação, mas é preciso ver o qual é a imunidade grupo nas particularidades desta infeção. O conceito de imunidade de grupo é muito antigo - diz-nos que não precisamos de ter toda a população vacinada para termos todas as pessoas protegidas contra uma doença infeciosa contagiosa. Por exemplo, se tivermos um indivíduo infetado e em torno dele só houver pessoas vacinadas ele não transmite a doença. O mesmo acontece ao contrário: se no meio dos vacinados existirem apenas algumas pessoas que ainda não o estejam, o vírus também não tem portas para entrar. Mas como já se percebeu há um princípio fundamental: a vacina tem de impedir a transmissão e o que sabemos atualmente é que estas previnem a infeção assintomática, que têm um impacto significativo em termos de redução de internamentos e de prevenção da mortalidade. Agora começam a surgir estudos que demonstram também que têm impacto na redução das infeções assintomáticas, embora ainda não seja claro que também têm impacto na transmissão do vírus.

Destaquedestaque"Não conseguimos prever se todas as variantes que vão aparecer terão o mesmo impacto".

Isso obriga a algumas cautelas, mesmo com os 70% de vacinados?
Claro. Esta variável obriga-nos a alguma cautela sobre as estimativas dos 70%, porque é fundamental para atingir a imunidade de grupo e para ajustar ou não esta estimativa. Mas todos os indicadores demonstram haver razões para estar otimista de que se atingirá uma boa cobertura vacinal rapidamente e que isso terá um impacto muito significativo no controlo da pandemia.

Mas todas as vacinas que estão a ser usadas estão preparadas para as novas variantes?
São dados que ainda estão a ser analisados. Não conseguimos prever se todas as variantes que vão aparecer terão o mesmo impacto. Por isso, temos de continuar a acompanhar de perto o surgimento de novas variantes e a eficácia das vacinas em relação a estas. Podemos dizer que já se sabe que há algumas variantes do vírus SARS CoV-2 que são aniquiladas pelas vacinas existentes e outras em que essa realidade não é tão factual. A boa notícia é que as vacinas estão a ser uma arma muito poderosa no controlo de infeções, porque estimulam vários componentes do sistema imunitário.

À luz do conhecimento atual já se pode dizer que o SARS CoV-2 é uma infeção que pode ficar tal como a gripe e termos de nos vacinar todos os anos?
É muito cedo para uma posição definitiva sobre este assunto. Primeiro, porque este vírus tem diferenças relativamente ao vírus da gripe, depois porque não temos ainda informação concreta sobre como é o comportamento do vírus perante uma boa parte da população imunizada. Começamos a ver isso agora. E é muito importante perceber se o vírus permanece entre nós ou se é eliminado. A gripe é um vírus que conhecemos há muito e sabemos que exatamente qual é o impacto que temos ao vacinar só uma parte da população. Relativamente ao SARS CoV-2 ainda há muito que não sabemos, como a evolução das variantes, as reinfeções e como vai ser a sua evolução numa população vacinada. Por isso se no futuro vão ser necessárias doses de reforço para conter o vírus e ao fim de quanto tempo, ainda é muito cedo.