Trindade e Tobago. Corrida de cabras e caranguejos em Buccoo

Mala de viagem (180). Um retrato muito pessoal de Trindade e Tobago.

A Santa Trindade e o tabaco deram origem ao nome deste país formado por duas ilhas principais e numerosos ilhéus. Porém, foi uma corrida de cabras que motivou esta minha história. Desde 1925, a atual "Goat Racing" é uma competição que se tornou numa tradição para os residentes repetirem anualmente e para os turistas se surpreenderem, no período da Páscoa. Naquela espécie de estádio, a população era maioritariamente de origem indiana, pois a sua profusão deve-se à imigração gradual de originários da União Indiana. Por isso, Trindade e Tobago também é popularmente designado de "Índia do Ocidente". Na corrida propriamente dita, os treinadores, também chamados jóqueis, correm ao lado dos seus animais. Conta-se que foi um barbadiano, Samuel Callendar, que introduziu a corrida de cabras. O Buccoo Goat Race Festival atrai milhares de espectadores a uma pequena povoação à beira-mar, na costa sudoeste de Tobago, onde as águas são naturalmente cristalinas e a baía tem notáveis ecossistemas de recifes de corais. Historicamente, uma vez que as corridas de cavalos eram reservadas à elite local, as corridas de cabras passaram a ser disputadas por gente mais pobre. Com as corridas de cavalos ocorrendo tradicionalmente na segunda-feira de Páscoa, a terça-feira foi o dia escolhido para receber as cabras de competição. Em Tobago, elas são treinadas para velocidade ou resistência. Para além de se premiar o dono da cabra vencedora, são premiadas as indumentárias dos assistentes à corrida e os chapéus mais extravagantes. Os espectadores também podem apostar nas cabras a concurso. Por meio de um desfile preliminar ao redor da pista e de um guia que descreve cada animal, os espectadores podem avaliar os possíveis vencedores. Os rendimentos das apostas vão para instituições de caridade locais. Além das corridas de cabras, há barracas de acolhimento aos visitantes, de comida e de diversões infantis. Suspeitei que a cabra tenha sido tornada num animal sagrado, já que naqueles dias apenas vi pratos de peixe, frango, arroz e feijão. No final dessa corrida, disseram-me que haveria uma outra, mas com caranguejos. "Oh, diabo!", pensei eu. "Caranguejo que sou, de signo, é preciso ter cautela". Enfim, aqueles eram mesmo reais. Esta é a corrida menos popular, mas não deixa de impressionar. Os grandes caranguejos azuis e os jóqueis estão no centro de um grande círculo desenhado na areia. Os caranguejos são conduzidos em direção ao perímetro do círculo pelos seus jóqueis, por meio de uma vara de bambu e com uma corda presa ao caranguejo. O primeiro caranguejo a romper o círculo é o vencedor. E assim foi naquele dia. E será que, nos outros dias do ano, os caranguejos fazem os 33 quilómetros que separam as duas ihas ou mesmo os 11 quilómetros da costa nordeste da Venezuela? Eu não fiz, limitei-me a contemplar a paisagem e a comer os petiscos disponíveis, com especial destaque para um prato original do país, com pão sírio frito, no qual é servido tubarão. Este é um país em que muitos dos animais têm funções e destinos diferentes.

Jorge Mangorrinha, professor universitário e pós-doutorado em turismo, faz um ensaio de memória através de fragmentos de viagem realizadas por ar, mar e terra e por olhares, leituras e conversas, entre o sonho que se fez realidade e a realidade que se fez sonho. Viagens fascinantes que são descritas pelo único português que até à data colocou em palavras imaginativas o que sente por todos os países do mundo. Uma série para ler aqui, na edição digital do DN.

Mais Notícias

Outros Conteúdos GMG