Pacote laboral de Cavaco uniu centrais sindicais desavindas
Carvalho da Silva e Torres Coutos faziam a primeira greve geral lado a lado. "Sucesso esmagador", dizem os sindicatos; "parcialíssima", refuta Cavaco.
Oito meses depois de vencer com maioria absoluta, Cavaco Silva conseguia outro feito inédito: o pacote laboral, apresentado pelo seu Governo, unia as desavindas centrais sindicais, CGTP e UGT, numa greve geral. Foi em 28 de Março de 1988. O País quase parou, mas para o primeiro-ministro a paralisação terá sido "parcialíssima".
Torres Couto, então secretário-geral da UGT, antecipa-se à outra central sindical. Anuncia a greve geral. Na origem do protesto, as leis laborais do Governo de Cavaco que surgiam no sentido de "humilhar, vergar e "amestrar" os trabalhadores".
O dirigente sindical aponta três razões para justificar a paralisação. Primeiro, o trabalhador ilicitamente despedido terá de ser reintegrado; a inaptidão do trabalhador não pode servir como justa causa de despedimento e, por último, as novas leis laborais ameaçam os direitos dos dirigentes sindicais.
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Carvalho da Silva, coordenador da CGTP, vê no pacote laboral um meio de "precarizar em absoluto o emprego". O mundo sindical português apertava as mãos e cerrava fileiras. Só mesmo o TSD, de Arménio Santos, foi a excepção. Os Trabalhadores Sociais-Democratas (TSD) ficavam à margem do protesto histórico. À meia-noite do dia 28, Torres Couto andava na estação da Carris, em Lisboa; Carvalho da Silva dava força, com a presença, aos piquetes na Lisnave.
A guerra de números, como sempre acontece nestas situações, irrompeu no dia seguinte. Cavaco Silva, numa visita a empresa Salvador Caetano, em Gaia (onde 750 dos 1200 trabalhadores estavam em greve), faz o seguinte comentário: "Se há greve, eu não notei. Se é greve geral, muito menos; tão-pouco parcial. Eu diria, quando muito, parcialíssima."
Do outro lado, os sindicatos falam "em sucesso esmagador" na greve geral, e uma adesão de 85%. Os jornais da época referem que a paralisação foi mais significativa nos grandes centros urbanos, no sector dos transportes, na banca, nas grandes empresas industriais.
O protesto fez-se sentir um pouco por toda em parte. Em duas terras, pelo menos, foi mesmo geral. Castanheira de Pêra e Sobral de Monte Agraço, no dia 28 de Março de 1988, estiveram "completamente paralisadas, incluindo serviços públicos e comércio". Na última localidade, apenas o gerente de um banco compareceu no seu posto de trabalho.
Na comunicação social, a greve teve grande expressão. Cinco jornais diários, entre eles o Jornal de Notícias, não saíram no dia 28. O Diário de Notícias apareceu nas bancas, mas, para tal acontecer, o conselho de gerência da Empresa Pública Notícias Capital chamou a polícia.
Para a decisão da administração do DN de imprimir o jornal fora - diz o JN de 29 de Março - "foi necessário chamar a polícia, que ali entrou, bateu em trabalhadores, impediu a entrada de outros que se encontravam fora, incluindo o director, Dinis Abreu, e agrediu o deputado Jorge Lemos (PCP), a inteirar-se, identificado, do que se passava no local".