Tribunal devolve 3,3 milhões de euros a ex-diretor do BES Madeira
João Alexandre Silva, o homem de confiança do BES para os negócios com a Venezuela, foi constituído arguido seis dias depois de lhe terem sido arrestados bens. Agora o arresto foi considerado nulo.
O arresto no valor de 3,345 milhões de euros promovido pelo Ministério Público ao ex-diretor do BES Madeira foi declarado nulo pelo Tribunal da Relação de Lisboa, pelo que os bens serão devolvidos ao arguido do processo Universo Espírito Santo. Considerado um homem de grande confiança de Ricardo Salgado, João Alexandre Silva é suspeito de corrupção ativa no comércio internacional e branqueamento de capitais, envolvendo a intermediação de negócios com responsáveis de empresas públicas venezuelanas. Foi detido em junho do ano passado e chegou a estar em prisão domiciliária, com pulseira eletrónica, mas atualmente tem apenas como medida de coação a proibição de se ausentar para o estrangeiro.
A decisão da Relação de Lisboa, datada de 20 de novembro, surge após um recurso do arguido, em que argumentou a nulidade do arresto executado no dia 22 de junho de 2017 devido ao facto de apenas ter sido constituído arguido no dia 28 do mesmo mês, mais de 72 horas depois. As juízas desembargadoras que analisaram o recurso acabam por dar provimento e declaram a nulidade do arresto e, consequentemente, o seu levantamento. "O facto de o recorrente ter sido constituído arguido, e submetido a interrogatório judicial e não judicial, em momento anterior à invocação da nulidade do arresto, não sana a nulidade", referem. Contrariando assim o Ministério Público que defendia que "a nulidade invocada pelo recorrente, consubstanciada na não constituição como arguido previamente ou no prazo de 72 horas a seguir ao decretamento do arresto, sempre se há-de considerar sanada, pela circunstância de, no dia 28 de junho de 2017, ter sido constituído arguido nos autos de inquérito."
A decisão foi confirmada ao DN pelo advogado Artur Marques. "Corresponde ao que pretendíamos com o recurso", disse o defensor de João Alexandre Silva, que no entanto considera "gravosa" a medida de coação ainda imposta ao arguido que o impede de sair do país. "Acaba por ser privativa de liberdade", aponta.
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João Alexandre Silva dirigia o BES na Madeira
Este é, pelo menos, o segundo caso no âmbito do processo do Universo Espírito Santo em que é declarada a nulidade de um arresto. Em 2015, aconteceu o mesmo com o arguido Amílcar Morais Pires, pelo mesmo motivo: só foi constituído arguido dias depois de executado o arresto, tal como se verifica neste caso agora decidido.
Em causa neste arresto de João Alexandre Silva estão bens como imóveis e automóveis, contas bancárias, entre outros, no valor total de 3.346.764,90 euros. Apesar de o ex-diretor do BES já se ter divorciado da mulher (só o fez em dezembro de 2014, numa altura em que a investigação já decorria), o Ministério Público, representado pelo Departamento Central de Investigação e Ação Penal (DCIAP), considerou que continuavam a residir em economia comum. E o mesmo entendeu a Relação de Lisboa ao negar provimento, em maio, a um recurso da mulher que reclamou por os seus bens serem também objeto do arresto.
Acusação só em 2019
O decretamento do arresto, no Tribunal Central de Instrução Criminal, teve por base a existência de indícios de que os valores recebidos pelo antigo responsável do BES na Madeira, designadamente entre os anos de 2010 e 2014, eram provenientes de contas tituladas por entidades do universo Espírito Santo e constituíram recompensa pela atuação do arguido na atividade criminosa de que está indiciado.
João Alexandre Silva tem 58 anos e recebeu uma indemnização para deixar o BES no ano passado, semanas antes de ser detido, o que aconteceu em junho de 2017, em simultâneo com buscas domiciliárias. Tem residência fiscal no Dubai, o que levou o MP a pedir a sua prisão. De resto nos Emiratos Árabes Unidos será proprietário de um imóvel avaliado em dois milhões de euros.
Era o homem que, entre 2008 e 2014, fazia a ligação aos dirigentes de cerca de dez empresas públicas da Venezuela, como a petrolífera PVDSA ou a Eletricidad de Caracas, acredita o DCIAP. João Alexandre Silva está indiciado por pagamentos corruptos a responsáveis venezuelanos e é suspeito de ter recebido também dinheiro do BES para compensar os serviços prestados.
Os procuradores responsáveis pelo caso, liderados por José Ranito, deram conta recentemente ao diretor do DCIAP de dificuldades na concretização rápida da acusação, apontado março de 2019 como prazo para ficar concluída. Iniciado em 2014, o inquérito tem, segundo as últimos dados revelados pela revista Sábado, 35 arguidos - entre os quais Ricardo Salgado e elementos da antiga administração do BES -, e houve já 178 testemunhas que foram ouvidas.