Dinheiro
25 julho 2021 às 19h57

Portugal regista terceira maior quebra de horas trabalhadas na UE

A quebra prende-se essencialmente com os períodos de encerramento dos setores mais afetados pelas medidas de controlo da pandemia, como o alojamento e restauração.

Portugal registou no ano passado a terceira maior queda de horas trabalhadas na União Europeia (UE). O país viu este indicador cair 19% face a 2019, como sucedeu também em Itália. Só a Grécia e Espanha, com quebras de 19,7% e 19,5%, respetivamente, apresentaram piores performances. A diminuição nestes quatro países do Sul da Europa, onde o setor do turismo tem um peso significativo, foi muito mais acentuada do que na média da UE, que no conjunto contabilizou um decréscimo de 12% nas horas trabalhadas em 2020, revelou o Eurostat.

As soluções implementadas para controlar a pandemia estão no cerne destas fortes quebras. Como diz o gabinete de estatísticas europeu, "esta diminuição pode ser explicada pelas medidas tomadas em resposta à pandemia covid-19, que levou muitas pessoas a alternar entre períodos de trabalho e períodos de ausência do trabalho".

O economista João Cerejeira reconhece que "a queda foi bastante forte", mas "tem fundamentalmente a ver com a tipologia dos setores afetados pela pandemia". Em Portugal, as medidas para controlar a covid-19 com repercussões efetivas no número de horas de trabalho atingiram sobretudo as atividades ligadas ao turismo, como o alojamento e a restauração, e também algum comércio. Como aponta o investigador da Universidade do Minho, Portugal, assim como a Grécia e Espanha, é um especialista em turismo e este setor foi "mais afetado pelas medidas de confinamento, e tem grande peso no emprego".

Ainda assim, sublinha João Cerejeira, "a queda das horas trabalhadas foi muito mais expressiva que a do Produto Interno Bruto (PIB), e isso prende-se com o facto de serem atividades de menor valor acrescentado e com salários baixos". Recorde-se que o PIB português apresentou uma quebra histórica de 7,2% em 2020.

Segundo o Eurostat, 26,9 milhões de pessoas na UE trabalharam menos horas do que o habitual no ano passado, mais 2,5 milhões do que o verificado em 2019. A principal razão prendeu-se com "a dispensa temporária", diz o Eurostat. Os confinamentos e restrições de mobilidade, que obrigaram ao encerramento de muitos negócios, fez disparar as dispensas temporárias em território europeu, de meio milhão registado em 2019, para 3,9 milhões no ano passado, avança o gabinete europeu. Em Portugal, estas suspensões foram apoiadas pelo denominado lay-off simplificado, regime que permitiu suster a queda do emprego, lembra o economista.

Em 2020, contabilizaram-se também 5,8 milhões de pessoas que trabalharam menos horas por razões como licença parental e especial, educação e formação, mais 1,1 milhões do que o verificado em 2019. O número de pessoas que trabalharam horas extras também caiu, de 7,3 milhões para 5,8 milhões, assim como decresceu um milhão para 4,7 milhões os que laboraram mais devido às horas variáveis. Aqueles que trabalharam mais por outros motivos diminuíram meio milhão, para 2,3 milhões.

Mas o primeiro ano da pandemia, no que se refere ao número de horas trabalhadas, quase que passou ao lado da Holanda (registou uma quebra de 3,2%), da Dinamarca e Luxemburgo (ambos com uma diminuição de 4,1%) e da Finlândia (menos 4,4%). Este menor impacto deve-se à especialização das suas economias, mais assentes no conhecimento.

A crise pandémica também teve repercussões na duração média esperada da vida ativa em Portugal e na União Europeia. O número de anos que as pessoas podem esperar estar no ativo (empregadas ou desempregadas) caiu para 37,3 anos no país em 2020, uma diminuição de sete meses face a 2019. É uma inversão da tendência, já que desde 2014, que marca o início da recuperação económica após o resgate da troika, que este indicador vinha sempre a subir. No conjunto dos países da UE, diminuiu dois meses para 35,7 anos, sendo que é o primeiro declínio registado desde 2000, de acordo com o Eurostat.

"Pessoas que teriam estado disponíveis para trabalhar e teriam procurado emprego, podem ter desistido da sua procura devido às baixas expectativas de retorno, e, consequentemente, estão fora da força de trabalho, reduzindo a duração esperada da vida ativa", diz o gabinete europeu.

João Cerejeira admite que este indicador deverá subir logo que a recuperação económica do país seja uma realidade. Para o economista, a quebra na duração média da vida ativa em Portugal ter-se-á devido a rescisões com trabalhadores próximos da idade da reforma, à limitação da entrada dos jovens no mercado de trabalho e à não renovação de contratos a termo, num movimento de resposta à crise e à quebra de atividade derivada da pandemia.

No ano passado, a Suécia, Holanda e Dinamarca foram os países da UE com uma duração esperada de vida ativa mais longa, de 40 anos ou mais. Em oposição, a mais curta foi registada em Itália (31,2 anos).

O Eurostat revela ainda que, em 2020, previa-se uma duração de 38 anos da vida profissional dos homens da UE e de 33,2 das mulheres.

sonia.s.pereira@dinheirovivo.pt