Dinheiro
04 dezembro 2022 às 00h02

Juros dos depósitos sobem, mas banca paga quase quatro vezes menos que média da Zona Euro

Depois dos avisos do Banco de Portugal, a remuneração média dos depósitos começou a subir. Apesar da tímida valorização, Portugal está na cauda da Zona Euro e os bancos não se comprometem com datas para nova atualização.

Os juros dos depósitos começaram a dar sinais de subida em Portugal, apesar de ainda estarem muito aquém da média europeia. Em outubro, a remuneração média dos depósitos, o instrumento de poupança de eleição das famílias portuguesas, passou de 0,05% para 0,24%. Esta é a taxa mais elevada desde novembro de 2017 e representa a maior subida mensal desde fevereiro de 2012, de acordo com os dados divulgados recentemente pelo Banco de Portugal. Ainda assim, olhando para os valores oferecidos pelos bancos da Zona Euro, os bancos nacionais pagam cerca de quatro vezes menos e a remuneração fica bem aquém da taxa de 1,975% da Euribor a três meses.

O salto 'tímido' registado em outubro acontece depois de o governador do Banco de Portugal ter deixado vários alertas sobre a função social da banca e o dever de remunerar de forma atrativa este instrumento financeiro que tem captado a larga fatia das poupanças dos portugueses como forma de controlar a inflação. "O reflexo das subidas das taxas de juro deve fazer-se sentir nos depósitos, para que a poupança passe a ter outro significado", afirmou o governador, durante uma intervenção na conferência "A banca do futuro", organizada pelo Jornal de Negócios.

Os avisos de Mário Centeno surgem num contexto em que apesar da forte escalada dos juros na Europa, que levou à subida dos empréstimos da casa por exemplo, os bancos portugueses não têm refletido esta tendência nos depósitos sendo mesmo dos que têm os juros mais baixos na Europa (nem 1% oferecem). A subida das taxas de juro já ajudou alguns bancos a melhorar a margem financeira - a diferença entre o que pagam nos depósitos e noutros financiamentos e o que cobram nos empréstimos - o que ajudou os lucros das maiores instituições bancárias a subir xxx% para xxx mil milhões nos primeiros nove meses do ano.

Olhando para os dados compilados pelo Banco Central Europeu (BCE), Portugal é o quarto país com a remuneração mais baixa dos depósitos (0,23%), só superando a Grécia, Chipre e a Eslovénia. E o valor situa-se quase quatro vezes abaixo da média da Zona Euro: 0,83%. Pelo contrário, os Países Baixos, França e Itália ocupam o pódio dos países com as taxas mais altas: 1,88%, 1,46% e 1,37%, respetivamente. Quando é que os bancos portugueses vão oferecer valores semelhantes? Contactadas pelo DN/Dinheiro Vivo, nenhuma das cinco maiores instituições financeiras se quis comprometer com valores ou datas.

A baixa remuneração dos depósitos não tem, contudo, travado a aplicação das poupanças das famílias portuguesas neste instrumento, isto apesar de a taxa dos certificados de aforro ser mais atrativa. Em outubro, o montante de novos depósitos a prazo de particulares foi de 4726 milhões de euros, um aumento de 21% face ao mês anterior e de 38,6% face ao período homólogo. Do valor captado, 4205 milhões de euros foram aplicados em depósitos a prazo até 1 ano. No final de outubro, o stock total de depósitos e equiparados feitos junto dos bancos portugueses era superior a 180 mil milhões de euros, um valor bastante perto de máximos.

Apesar da melhoria dos juros dos depósitos, estes ficam ainda muito aquém da remuneração de outras aplicações mais conservadoras, com destaque especial para os certificados de aforro. Este produto, que segue o valor da Euribor a 3 meses acrescido de um valor de 1%, paga uma taxa de juro bruta de 2,842% para as subscrições que forem feitas em dezembro. E têm captado bastante investimento, com o valor aplicado neste instrumento a aumentar

Aliás, a melhoria da taxa dos depósitos acontece ao mesmo tempo que as subscrições dos certificados de aforro têm registado uma forte subida e a taxa de juro bruto para dezembro foi fixada em 2,842%, à boleia do aumento da Euribor a 3 meses. No mês de outubro, este produto do Estado que pode ser subscrito aos balcões dos CTT ou online, captou 1,4 mil milhões de euros.

Um dos primeiros bancos a aumentar a remuneração das poupanças foi a Caixa Geral de Depósitos (CGD) com o lançamento de um novo instrumento, como foi noticiado pelo Jornal Económico. Este novo produto, denominado Depósito Pequeno Aforrador, é destinado às pequenas poupanças e foi criado "para aqueles que efetivamente devemos ajudar a poupar, especialmente numa altura em que o agravamento do custo de vida exige da parte destes clientes uma gestão do orçamento familiar mais cuidada, sendo a poupança um complemento importante para suprir eventuais situações de emergência", explicou fonte oficial do banco público.

No que toca à previsão de alargar o aumento das taxas de juro de forma generalizada aos restantes produtos, a mesma fonte referiu apenas que "a CGD tem acompanhado de perto o processo de normalização da política monetária do BCE". A entidade liderada por Paulo Macedo defendeu ainda que "durante os anos de juros negativos, a Caixa nunca deixou de remunerar as poupanças confiadas pelos seus clientes" e "continua a fazê-lo, sendo natural que, a prazo, as taxas praticadas nos produtos de poupança possam ser revistas em alta, procurando acompanhar a evolução dos juros de referência". Quando? "Será, contudo, um processo gradual, estando a Caixa a avaliar as condições do mercado que permitam essa revalorização generalizada das taxas das poupanças", acrescentou.

O Novo Banco garante que "está a acompanhar muito de perto a política monetária do BCE e, naturalmente, irá refletir nas taxas de juro passivas o impacto das medidas mais restritivas do Banco Central". No entanto, alerta que "a subida das taxas de juro para combate da inflação poderá vir a ser temperada por medidas que permitam fazer face a uma eventual recessão no espaço europeu, que já se perspetiva".

Instado a comentar se poderá haver novas atualizações nos produtos de poupança já no início do próximo ano, a instituição liderada por Mark Bourke respondeu que "está a monitorizar este tema, sendo que por questões prudenciais de gestão de balanço estas decisões não podem ser tomadas a longo prazo". Por estas razões, explica que não consegue antecipar, "face à já referida recessão, o que irá acontecer no início do próximo ano".

O BPI e o BCP também preferiram não antecipar datas e o Santander não respondeu a nenhuma das perguntas até ao fecho da edição. O banco detido pelo Caixabank não avançou com datas sobre o eventual aumento das taxas de juro nos depósitos, referindo apenas que "qualquer alteração à política atual o será comunicada no momento próprio". Por sua vez, o BCP referiu que "não comenta questões relacionadas com a suas políticas e práticas comerciais"

Ao mesmo tempo que os bancos têm sido cautelosos na melhoria das remunerações nos depósitos, a pressão inflacionista e a subida de juros continuam a refletir-se no aumento das taxas do crédito à habitação, indexadas à Euribor. Em Portugal, como a larga maioria dos empréstimos (cerca de 90%) são feitos com contratos a taxa fixa, o impacto nas mensalidades das famílias tem sido elevado.

Segundo os dados revelados na sexta-feira pelo Banco de Portugal, a taxa de juro média dos novos empréstimos à habitação subiu para 2,86% (2,23% em setembro), o valor mais elevado desde janeiro de 2015. "Trata-se da maior subida mensal desde o início da série estatística, em 2003", sublinha o supervisor.

O atual contexto económico tem esfriado a procura por crédito à habitação, que nos últimos tempos batia máximos atrás de máximos. Em outubro, os bancos concederam 1798 milhões de euros de novos empréstimos aos particulares, menos 211 milhões de euros do que em setembro. Deste total, 1197 milhões de crédito foram direcionados para habitação (-10,7% face ao mês anterior), 412 milhões ao consumo (-11,7%) e 189 milhões de crédito para outros fins (-6%).

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